Capitulo 34

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Joaquim Miller

Eu estava exausto. As luzes do escritório brilhavam de forma incômoda, e o silêncio noturno me cercava como um manto pesado. As horas se arrastavam, e todos os meus planos cuidadosamente traçados pareciam desmoronar diante de mim. Mas eu não podia deixar que isso me detivesse. Eu precisava falar com ela, tentar de novo.

Caminhei pelos corredores vazios, o som dos meus passos ecoando pelas paredes. A porta do escritório de Melinda estava entreaberta, e uma luz suave escapava pela fresta. Quando cheguei mais perto, a vi sentada à mesa, o rosto levemente iluminado pela tela do computador. Ela estava tão concentrada, como sempre, perdida em seu trabalho. Era uma visão que deveria me trazer conforto, mas ao invés disso, apenas aumentava a distância que eu sentia entre nós.

Entrei sem bater, tentando manter a compostura. Ela levantou os olhos quando ouviu meus passos, e por um breve momento, nossos olhares se encontraram. O que eu vi ali foi como uma faca cravada no peito: frieza, distância. Não a Melinda que eu conhecia tão bem, mas alguém que eu havia ajudado a moldar com cada erro e omissão ao longo dos anos.

-Você ainda está aqui,- disse, mais para quebrar o silêncio do que qualquer outra coisa.

-  Precisava terminar alguns documentos para a reunião de amanhã.- Ela apenas assentiu, os olhos voltando para a tela

- Mel... Nós precisamos conversar.-Eu me aproximei, tomando coragem para o que eu realmente queria dizer.

-Joaquim, já discutimos isso. Não adianta continuar revirando o passado. -Ela suspirou, como se já soubesse o que viria a seguir.

"Não estou aqui para falar do passado. Estou aqui para falar do que eu sinto agora, -retruquei, minha voz saindo mais firme do que eu esperava. - Eu sei que estraguei tudo, mas isso não significa que eu não possa tentar consertar.

E como você pretende fazer isso? Forçando situações? - A Dama de gelo ergueu o olhar, seus olhos frios como gelo. Tentando me prender em uma viagem a trabalho que, claramente, tem outros motivos?

Engoli seco. Ela havia percebido, claro. Sempre foi boa em ler as entrelinhas, especialmente quando se tratava de mim.Antes que eu pudesse responder, ouvi passos no corredor, seguidos por uma voz familiar.

-Melinda, está pronta para irmos?- Noah surgiu na porta, sua presença imponente como uma sombra. Seu olhar passou por mim, se detendo por um segundo mais do que o necessário.

- Eu estava quase terminando,- ela respondeu, sua voz agora mais suave, mais confortável.

A forma como ela olhou para ele, como se ele fosse um porto seguro, fez algo dentro de mim se contorcer. Noah deu um passo para dentro da sala, parando ao meu lado. A tensão era palpável, cada respiração carregada de um significado não dito.

- Joaquim.- ele disse, com um leve aceno de cabeça. Não havia hostilidade em sua voz, mas a mensagem era clara. Ele estava aqui, ao lado dela, onde eu deveria estar. Eu soube naquele momento que havia chegado o ponto de ruptura.

-Noah-espondi, tentando manter a calma.

-Sei que você tem seus motivos, mas não acha que já é hora de deixar Melinda viver a vida dela, do jeito que ela quer?- Noah disse, sua voz baixa, mas carregada de intenção.

A dor que senti ao ouvir aquilo foi como um golpe direto no estômago. Eu sabia que ele estava certo, em parte. Mas ceder significava perder Melinda para sempre. E eu não estava pronto para isso.

- Isso é entre mim e Melinda,- rebati, meus olhos fixos nela, buscando algum sinal de que ainda havia algo a ser salvo.

Ela ficou em silêncio, os olhos cheios de algo que eu não conseguia decifrar completamente. Então, finalmente, ela falou.

-Joaquim, eu já tomei minha decisão. Eu... preciso seguir em frente. E você deveria fazer o mesmo.

Essas palavras foram piores do que qualquer golpe físico. Eu queria lutar, argumentar, mas algo dentro de mim quebrou.

-Se é isso que você quer...- minha voz falhou, o gosto amargo da derrota se espalhando pela boca.

Noah a observou, e eu vi a forma como ele a olhava, com uma ternura que me queimava por dentro. Mas também vi que, talvez, ele fosse o que ela precisava agora.

- Vou respeitar sua decisão, Mel. - falei finalmente, tentando manter o pouco de dignidade que me restava.

E então, antes que eu pudesse mudar de ideia, virei-me e saí. Cada passo que eu dava parecia um adeus, não apenas a Melinda, mas a tudo que havíamos sido.

Eu saí do escritório sem olhar para trás, as palavras de Melinda ecoando na minha mente como um mantra. Cada passo que eu dava era mais pesado que o anterior, como se o chão estivesse tentando me puxar para baixo, me ancorar naquela dor insuportável. Eu precisava respirar, precisava de espaço. Precisava de algo familiar, onde eu pudesse tentar recuperar o controle sobre meus pensamentos.

Sem pensar muito, me encontrei dirigindo na direção do clube de tiro ao alvo. Era meu refúgio, o lugar onde eu sempre conseguia encontrar um pouco de paz em meio ao caos. O som dos disparos, a concentração necessária para acertar o alvo, tudo isso tinha um efeito quase terapêutico em mim. Hoje, mais do que nunca, eu precisava disso.

O clube estava quase vazio àquela hora da noite, o que era um alívio. Peguei minha pistola e me dirigi a uma das baias, sentindo o peso familiar da arma nas mãos. Ajustei os protetores de ouvido e me preparei para disparar, tentando afastar as imagens de Melinda e Noah da minha mente.

Os primeiros tiros foram erráticos, cada disparo carregando a frustração, a raiva e o desespero que estavam me consumindo por dentro. O som dos tiros reverberava pelo ambiente, e, aos poucos, minha mente começou a clarear, cada disparo funcionando como uma válvula de escape para a pressão acumulada.

Enquanto eu atirava, me dei conta de algo que talvez estivesse tentando evitar: eu estava perdendo Melinda, e não sabia se conseguiria reconquistá-la. A imagem dela nos braços de Noah me atormentava, e a ideia de que talvez eu tivesse que deixá-la ir para ele era insuportável.

Mas eu não podia deixar o desespero me dominar. Eu precisava pensar com clareza, traçar um novo plano. A viagem ao vinhedo era minha última cartada, minha última chance de fazer Melinda ver que ainda havia algo entre nós que valia a pena lutar. Eu só precisava de um pouco mais de tempo, um pouco mais de espaço para descobrir como reverter essa situação.

Depois de uma hora no clube, finalmente comecei a sentir o peso em meus ombros aliviar um pouco. Meu foco estava voltando. Eu não podia desistir agora. Havia muito em jogo.

Saí do clube de tiro com a cabeça um pouco mais leve, mas com o coração ainda carregado. Eu sabia que os próximos dias seriam cruciais. A viagem ao vinhedo estava se aproximando, e eu precisava estar preparado para tudo.



Boa noite, minhas queridas leitoras!
Como vocês estão?

Espero que estejam curtindo essa nova fase tanto quanto eu. Cada comentário e voto de vocês é um incentivo enorme para continuar, mesmo com a correria do dia a dia.

Me contem o que estão achando! Vocês são a razão de tudo isso, e é o carinho de vocês que me motiva a seguir em frente.

Com todo o meu amor e gratidão,

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