Capitulo 33

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Rafael miller

Quando entrei na sala de Joaquim, o que me chamou a atenção primeiro foi o som do gelo tilintando no copo de uísque que ele segurava. Joaquim estava encostado na janela, olhando para fora, mas seu olhar parecia perdido, distante, como se estivesse em outro lugar. A cena era incomum. Meu irmão, sempre tão controlado e focado, agora parecia alguém que carregava o peso do mundo nas costas.

- Você parece que viu um fantasma,- eu disse, tentando quebrar o gelo, mas minha voz saiu mais séria do que eu pretendia.

Ele não respondeu imediatamente, apenas deu um gole no uísque, ainda olhando para o horizonte. Aquela atitude me deixou mais inquieto. Joaquim não era de se esconder em copos de uísque ou se deixar abalar facilmente. Algo sério tinha acontecido.

- Joaquim, o que está pegando?- insisti, tentando entender o que estava passando pela cabeça dele. E, claro, lembrar de como Melinda estava mais cedo só aumentava minha preocupação. Ela estava uma fera. E quando Melinda ficava assim, normalmente havia perdido o controle.
Ele finalmente desviou o olhar da janela, me encarando com uma expressão que eu não via há muito tempo: incerteza.

- Eu... eu fui longe demais, Rafa,- ele disse, sua voz baixa, quase inaudível.

-Foi longe demais com o quê? Isso tem a ver com a Melinda? Porque, vou te dizer, ela estava furiosa quando a vi mais cedo. - continuei, tentando juntar as peças.

- Eu a provoquei. Queria testar os limites dela, ver até onde eu poderia ir... - Ele suspirou, esfregando a mão no rosto como se tentasse afastar os pensamentos. - mas acho que acabei cruzando uma linha.

- Joaquim, você sabe que a Melinda não é de recuar sem lutar. -Me aproximei, sentando na cadeira em frente a ele. - Se ela está com raiva, é porque você realmente fez algo que a atingiu fundo.

-Eu a pressionei sobre a viagem para Napa Valley, sobre nós dois. Ela ficou furiosa, me acusou de usar o trabalho como desculpa para manipular a situação. E talvez ela tenha razão."-Ele assentiu, mas o olhar de dor em seus olhos me fez perceber que isso era mais do que uma simples discussão.

Fiquei em silêncio por um momento, absorvendo o que ele disse. Meu irmão, sempre tão calculista, tão no controle, parecia que estava se dando conta de que tinha cometido um erro maior do que imaginava.

-E agora? O que você vai fazer?

-Eu não sei, Rafa. Pela primeira vez em muito tempo, eu não sei o que fazer. -deu de ombros, o copo de uísque balançando levemente em sua mão.

Ver Joaquim assim, perdido e incerto, me deixou com um nó no estômago. Sempre achei que ele fosse indestrutível, mas agora via que até ele tinha seus limites. E talvez, só talvez, ele realmente entende o que significava perder algo que ama.

Joaquim deixou o copo de uísque sobre a mesa, o som do vidro contra a madeira ecoando pela sala. Ele não me olhava nos olhos, fixando o olhar em algum ponto distante na parede, como se estivesse perdido em seus próprios pensamentos.

-Você realmente acha que essa viagem vai resolver alguma coisa? - perguntei, sentindo o peso da preocupação em minha voz.

-Não sei, Rafael. - Ele suspirou, finalmente encontrando meu olhar. - Não sei mais o que vai resolver as coisas entre nós. Mas eu preciso tentar. Não posso simplesmente deixar as coisas como estão.

- E se ela não quiser ir? Você sabe que Melinda é teimosa. Ainda mais agora que as coisas estão tão complicadas entre vocês -Balancei a cabeça, tentando entender a lógica de Joaquim. .

-Ela vai! - afirmou com uma determinação que me surpreendeu. - Mel pode estar com raiva, pode estar magoada, mas eu a conheço. Ela não vai resistir a essa oportunidade. Não quando se trata de trabalho.

-Você está usando isso contra ela?- A pergunta saiu antes que eu pudesse pensar, e Joaquim piscou, como se tivesse sido atingido por um balde de água fria.

-Não é isso. - disse, a voz mais baixa. - Eu... Eu só quero uma chance. Uma última chance de mostrar que ainda podemos fazer isso funcionar. De que não estamos condenados a seguir caminhos diferentes.

Eu queria dizer algo reconfortante, mas a verdade era que eu não sabia se isso era possível. As coisas entre Joaquim e Melinda sempre foram complicadas, e agora, com Noah na equação, parecia ainda mais difícil.

-Você ainda a ama, não é? - perguntei, mesmo já sabendo a resposta. Era a pergunta que sempre pairava no ar entre nós. Meu irmão não respondeu de imediato, mas o olhar em seus olhos disse tudo.

- Sempre! -murmurou, quase para si mesmo. -Mas talvez seja tarde demais.

- Joaquim, se você realmente quer reconquistar a Melinda, precisa ser honesto. -Dei um passo à frente, colocando uma mão em seu ombro. - Não dá para planejar tudo como se fosse um jogo. Ela vai perceber. Ela sempre percebe.

- Eu sei. E é por isso que preciso tentar, Rafael.- assentiu, o peso da minha mão no ombro dele parecendo trazê-lo de volta à realidade.  - Preciso fazer isso do jeito certo, dessa vez.

Eu não tinha certeza se o jeito certo existia, mas, naquele momento, só pude torcer para que meu irmão encontrasse a resposta que procurava. Porque, apesar de tudo, ele merecia ser feliz. E, talvez, só talvez, essa viagem fosse o início de algo novo – ou o fim que ele tanto temia.

Saí da sala de Joaquim com a cabeça cheia. Precisava de algo que tirasse aquela nuvem pesada de cima de mim, e sabia exatamente onde encontrar isso. Quando cheguei na recepção, lá estava a Victoria, a bruxinha ruiva, organizando uns papéis. Mas o que realmente chamou minha atenção foi a garrafinha de café gelado que ela segurava.

-Rafa, você tá com uma cara...,- ela começou, olhando para mim com aquele sorriso meio travesso. -Vai me dizer que o Joaquim tá aprontando de novo?

-Vick, você não tem ideia, - respondi, soltando um suspiro e pegando um café para mim. - Esse cara tá me deixando maluco com os planos dele. Acho que ele quer transformar a vida da Melinda numa dessas séries cheias de plot twist.

- Só pode ser o Joaquim, né? - Ela riu e deu um gole no café. - Aposto que é alguma coisa bem dramática?

Tá falando sério? - Eu engasguei com meu café e olhei para ela, incrédulo. - Como é que você sempre adivinha essas coisas?

- tenho uma bola de cristal, lembra? - ela disse, piscando e levantando a garrafinha como se brindasse a isso. -Então, o que ele tá tramando dessa vez?

- Exatamente isso. Napa Valley. Ele tá achando que vai reconquistar a Melinda com vinho e vinhedos,"l- eu disse, ainda rindo. - E pra piorar, acho que ele tá levando isso mais a sério do que qualquer caso que já pegou no escritório.

Esses dois... - Victoria balançou a cabeça, dando risada. -Eu vou te falar, Rafa, se a Melinda não cair nessa, vou perder a fé no poder do drama.

-Vick, você acha que isso tem chance? - Eu me recostei no balcão, ainda segurando meu café. - Porque, sinceramente, Noah também tá no páreo, e o cara é firmeza.

-Sebastian diz que o Noah é um cara bacana, mas a Melinda... -Ela deu de ombros, ainda com aquele sorriso no rosto. -Bom, ela tem um fraco pelo Joaquim, por mais que negue. Quer apostar?

-Você quer mesmo perder pra mim, bruxinha? -Eu sorri, encarando-a. -Fechado! Se o Joaquim ganhar, você me deve um jantar. Se for o Noah... eu pago.

-Feito, Rafa. -Ela riu e estendeu a mão, selando nossa aposta. -Que vença o melhor drama!

Saí dali sentindo o peso dos ombros diminuir, grato por ter alguém como Victoria, que sempre sabe como transformar qualquer situação numa boa conversa e, claro, num pretexto para uma aposta.

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