Falso guardião

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O relógio marcava quase 5h da manhã, mas o sono continuava me evitando. A luz fraca do amanhecer começava a infiltrar-se pelas cortinas do hotel, lançando sombras compridas no chão. Estava sentada na beira da cama, ainda usando a camisa que havia jogado sobre os ombros na madrugada, quando ouvi a porta do quarto se abrir suavemente.

- Lauren?- A voz de Saulo cortou o silêncio, carregada de preocupação e algo mais - uma desconfiança que ele não conseguia esconder.

- Estou aqui - respondi, olhando para ele sem me levantar. Ele entrou no quarto, fechando a porta atrás de si com um movimento lento, quase hesitante.

Saulo ficou ali, parado por um momento, os olhos escuros me examinando com intensidade

- Eu sei que é cedo, mas não consegui esperar. Preciso saber... o que Camila fazia aqui ontem à noite?

Eu franzi a testa, estranhando o tom inquisitivo na voz dele. Algo na postura de Saulo estava fora do lugar, e isso me deixou alerta.

- Ela veio me alertar sobre algo importante, Saulo. Coisas que eu precisava ouvir.

Ele cruzou os braços, aproximando-se mais, como se estivesse se preparando para uma discussão.

- E você confiou nela? Uma pessoa que mal conhece? Acha mesmo que ela não tem segundas intenções?

Sua atitude começou a me irritar. Eu me levantei devagar, mantendo os olhos fixos nele.

- Saulo, você parece esquecer sua posição aqui. Você é meu assessor, não meu guardião. Eu decido com quem falo ou deixo de falar. Essa decisão é minha, e só minha. O fato de você ser meu parceiro por muitos anos, não lhe permite tal liberdade.

Ele pareceu surpreso com a minha firmeza, mas não recuou.

- Estou apenas tentando protegê-la, Lauren. Há muito em jogo e...

- Eu sei exatamente o que está em jogo, não sou uma aprendiz neste mundo - interrompi, a voz gelada. - E sei das minhas responsabilidades. Mas não cabe a você me dizer com quem devo ou não devo me envolver. O que Camila disse pode ter mudado tudo, e eu não vou ignorar isso só porque você está desconfiado.

Saulo ficou em silêncio, o rosto se fechando em uma expressão difícil de ler. Finalmente, ele suspirou, os ombros relaxando um pouco.

- Só quero que tenha cuidado.

- Eu sempre tenho, Saulo,- respondi, mantendo meu tom firme. - Agora, se não tiver mais nada, eu preciso me preparar para o que vem a seguir.

Ele assentiu, ainda relutante, antes de se virar e sair do quarto. Fiquei ali, sozinha novamente, mas determinada a não deixar que nada e nem mesmo a preocupação de Saulo-me desviasse do que precisava ser feito.

Enquanto a porta do quarto se fechava atrás de Saulo, uma onda de pensamentos se agitou na minha mente. O comportamento dele naquela manhã me incomodava mais do que eu queria admitir. Saulo sempre havia sido leal, um apoio inquestionável na minha campanha, mas hoje algo estava diferente. A maneira como ele me confrontou, quase como se estivesse ultrapassando a linha entre o profissional e o pessoal, não era algo que eu esperava dele.

Por que ele estava tão preocupado? Será que ele sabia algo que eu não sabia? Ou estava apenas sendo superprotetor? A verdade é que essa preocupação excessiva parecia mascarar algo mais profundo. Não era apenas o tom de voz, mas o olhar em seus olhos-um olhar que eu não reconhecia.

De certa forma, eu entendi de onde vinha essa atitude. Saulo havia estado comigo desde o início, lidando com os altos e baixos da campanha, protegendo-me dos ataques externos e, em alguns momentos, até mesmo de mim mesma. Mas hoje, essa proteção parecia ter se transformado em uma tentativa de controle, e isso era inaceitável. Eu não poderia permitir que alguém, nem mesmo Saulo, começasse a ditar como eu deveria conduzir minha vida ou minha campanha.

Aos olhos da naçãoOnde histórias criam vida. Descubra agora