capítulo 20.

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Marilia Mendonça

Eu era mestre na arte de contar histórias.
Eu sabia como um ótimo romance ganhava vida.
Escrever não consistia apenas em reunir palavras sem qualquer relação entre si. Em um bom romance, cada frase era importante, cada palavra tinha um significado para o desenvolvimento da história. Havia sempre uma indicacão sobre as reviravoltas do enredo e os diferentes rumos que a história tomaria. Se uma pessoa lesse com atenção, perceberia os sinais. Seria capaz de saborear a essência de cada palavra e, no final, seu paladar ficaria satisfeito. Uma boa história sempre tinha uma estrutura. Mas a vida não era uma boa história. A vida era uma confusão de palavras que às vezes davam certo juntas, outras vezes, não. Era uma mistura de emoções que dificilmente fazia sentido. O primeiro manuscrito de um romance, cheio de rabiscos e frases riscadas, todas escritas com giz de cera. Não era uma história bonita. Não havia qualquer aviso. Não era fácil. E quando a novela da vida real queria acabar com você, ela simplesmente arrancava o ar dos seus pulmões e deixava o seu coração sangrando para os lobos.

˚.

A mensagem era da Karla. Ela tentou me ligar, mas deixei a ligação cair na caixa postal. Eu estava olhando para Sophia. Ela deixou uma mensagem de voz, mas eu a ignorei. Estava fitando os olhos de Maraisa. Então ela me mandou uma mensagem de texto que fez uma parte de mim morrer.

Meu pai está no hospital.
Teve outro ataque cardíaco.
Por favor, volte para casa.

Peguei o primeiro voo de volta para casa, retorcendo as mãos o tempo todo, nervosa demais para conseguir respirar direito. Quando o avião pousou, peguei o primeiro táxi que encontrei e corri para o hospital. Entrei apressada; meu peito parecia queimar por dentro. A sensação me fez estremecer, e tentei afugentar a agitação que tomava conta de mim.

Ele deve estar bem. Ele tem que estar bem...
Se o professor Oliver não superasse essa, eu não sabia se conseguiria sobreviver. Não sabia se conseguiria viver se ele não estivesse sempre ao meu lado. Quando cheguei à sala de espera, meus olhos recaíram primeiro sobre Mary e Karla. Então notei Maraisa, sentada, com Sophia dormindo em seu colo. Há quanto tempo ela estava ali? Como soube? Eu não havia falado que estava voltando. Todas as vezes em que tentava digitar as palavras, eu as deletava no mesmo instante. Se eu enviasse uma mensagem dizendo que o professor Oliver tinha sofrido um infarto, o fato se tornaria real. E se pensasse que era real, certamente eu teria morrido no voo de volta para casa.

Não podia ser real.
Ele não podia morrer.
Sophia nem se lembraria dele.
Ela precisava se lembrar do melhor homem do mundo. Precisava conhecer o meu pai.

— Como soube? — perguntei a Maraisa, indo até ela e beijando suavemente a testa da minha filha. Maraisa indicou Karla com a cabeça.

— Ela me ligou. Vim imediatamente.

— Você está bem? - perguntei.

— Estou. — Maraisa deu um sorriso torto, segurou a minha mão e a apertou de leve. — E você, está bem?

Semicerrei os olhos e engoli em seco, falando tão baixo que não tive certeza se a palavra realmente havia saído dos meus lábios.

— Não. — Meus olhos se voltaram para Mary. - Volto logo.

— Claro, fique com ela o tempo que for necessário. — Eu me sentia grata por isso, por ela estar cuidando de Sophia, por estar ao meu lado e ao lado da minha filha quando eu precisava dar força para outras pessoas.

A Força que Nos Atrai - Malila.Onde histórias criam vida. Descubra agora