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Estava sentada no chão do meu quarto, cercada por réguas, lápis, folhas de papel vegetal e maquetes inacabadas. A mesa de desenho improvisada estava uma bagunça organizada que apenas eu parecia entender. O trabalho de hoje era sobre um projeto residencial simples, um exercício básico de planejamento de espaços, algo que meus professores insistiam em dizer ser essencial para um arquiteto iniciante. Porém, enquanto meus dedos passavam pela planta, ajustando os cômodos, minha cabeça estava longe.

Na tela do notebook à minha frente, Joshua estava concentrado, rabiscando algo em seus próprios papéis. Nós dois tínhamos concordado em fazer nossos trabalhos juntos- cada um com um trabalho diferente, já que ele estava no 2º ano e eu no 1º - em chamada, mesmo que a conversa fosse mínima. Era bom apenas tê-lo por perto, mesmo que virtualmente. De vez em quando, ele levantava os olhos e lançava um sorriso cansado, mas carinhoso. Eu fazia o mesmo, dividida entre a atenção ao meu projeto e a presença dele.

O som da batida na porta me trouxe de volta ao presente. O toque firme e inesperado fez meu coração saltar no peito.

- Entra! - respondi automaticamente, sem pensar em quem poderia ser. Joshua levantou os olhos, curioso, e eu me ajeitei, esperando ver talvez Nicholas ou talvez o meu.pai.

Mas não era nenhum deles.

Minha respiração falhou no momento em que vi quem estava ali. Hudson. Ele estava parado na porta, olhando para mim como se estivesse vendo um fantasma. Parecia uma versão distorcida do garoto que eu conheci. Mais magro, o rosto marcado por olheiras profundas que destacavam seus olhos cansados e perdidos. O cabelo dele estava mais comprido, bagunçado de uma forma que sugeria que ele não se importava mais em cuidar de si mesmo. O que aconteceu com ele?

Eu senti o pânico tomar conta do meu corpo, minha mente correndo em mil direções ao mesmo tempo. O que ele estava fazendo aqui? Quem o deixou entrar? Antes que eu pudesse reagir, ele deu um passo hesitante para dentro, e nós dois ficamos ali, nos encarando. Eu nem conseguia processar direito a presença dele.

- Rose, quem é esse cara? - A voz de Joshua veio abafada pela tela do computador, me puxando de volta para a realidade.

Eu tinha me esquecido completamente que ele estava ali, nos observando. Hudson lançou um olhar para o notebook, e em seguida voltou a me encarar, como se esperasse que eu tomasse a decisão sobre como lidar com a situação.

- Hudson, o que você está fazendo aqui? - perguntei, minha voz mais fraca do que eu gostaria.

Ele respirou fundo, mas parecia nervoso, agitado.

- Você está... confortável para conversar com ele do outro lado? - disse, referindo-se a Joshua.

A pergunta me fez despertar, como se fosse um sinal de que eu precisava lidar com aquilo de uma vez. Voltei minha atenção para a tela e me forcei a parecer calma.

- Joshua, eu preciso ir. Falo com você mais tarde, tudo bem? - tentei sorrir para suavizar a situação, mas o desconforto era palpável.

Joshua, ainda que confuso, assentiu devagar, relutante. Assim que desliguei, virei para Hudson.

- Agora me diz... O que você está fazendo aqui? - minha voz saiu um pouco mais firme, mas por dentro eu estava despedaçada.

Vê-lo daquele jeito, tão... destruído, mexia comigo mais do que eu queria admitir.

Hudson desviou o olhar, passando a mão pelo cabelo de um jeito agitado, como se estivesse tentando se controlar. Seus dedos tremiam levemente, como se ele estivesse lidando com algo além de nervosismo. Era como se... estivesse em abstinência.

- Eu... Eu precisava ver você, Rose. Eu sei que isso parece uma loucura, mas... - ele parou, tentando encontrar as palavras - Ficar com você... não foi um jogo. Eu te amei, e ainda te amo. Eu nunca quis te magoar.

Meu coração se apertou. Ele falava aquilo com tanto sentimento, tanta sinceridade, mas não era mais sobre amor, era sobre tudo que tinha acontecido, tudo que eu tinha tentado superar. Eu balancei a cabeça, interrompendo-o antes que ele pudesse continuar.

-Hudson, eu já te perdoei - disse, mas ele fez que não com a cabeça, frustrado.

- Não, Rose. Não é sobre perdão. A gente... A gente tinha algo real. Não foi justo acabar assim. Não foi justo eu ter perdido você por causa das minhas mentiras. - ele parecia cada vez mais angustiado, suas palavras saíam rápidas, e seu corpo todo demonstrava nervosismo -Eu preciso de você. Preciso da gente.

Eu queria manter o controle, queria ser firme, mas as palavras dele atingiram um ponto fraco em mim. Uma parte de mim, enterrada sob camadas de razão, ainda sentia falta de quem nós éramos, da intensidade que compartilhávamos. Meu peito começou a doer com a memória, e meus olhos começaram a arder.

Respirei fundo, tentando me manter firme.

- Hudson, o que tivemos foi especial. Fez muito bem pra mim, me ajudou a crescer, a sair da bolha onde eu estava. Mas não podemos voltar atrás. - minha voz tremia enquanto as lágrimas finalmente desciam pelo meu rosto - Eu sou grata pelas cartas, por tudo o que você me fez sentir. Mas não... Não podemos, não mais.

Hudson me olhava com tanta dor que parecia que ele estava se segurando para não desabar. Ele se aproximou de mim, e mesmo sabendo que eu deveria recuar, eu não consegui. Meus pés estavam presos ao chão, minha mente dividida entre o passado e o presente. Ele parou a poucos centímetros de mim, seu rosto perturbado, mas os olhos ainda cheios de algo que eu não podia ignorar.

- Por favor, Rose... Não faz isso com a gente - ele sussurrou, sua mão subindo lentamente até tocar meu rosto molhado pelas lágrimas.

Eu fechei os olhos por um segundo, sentindo o toque dele, e algo dentro de mim se partiu. A lembrança dos beijos, das risadas, das conversas interessantemente profundas.

E então ele fez o impensável. Hudson me beijou.

No começo, eu fiquei paralisada, minha mente gritando o nome de Joshua, lembrando de como ele era bom, do quanto eu o amava. Mas ao mesmo tempo, senti algo familiar me puxando de volta para Hudson. O gosto do beijo, o cheiro dele, mesmo com o resquício de cannabis, mexeu comigo de um jeito que eu não queria admitir. Minha mente estava em conflito, e eu lutei com tudo que tinha para me afastar.

Com um esforço físico e mental gigantesco, coloquei as mãos no peito dele e o empurrei, minha respiração pesada.

- Isso não devia ter acontecido - consegui dizer, minha voz falhando -Eu... Eu estou namorando.

O olhar de Hudson mudou de imediato. De dor para desespero, e depois, para algo quebrado, quase cínico.

- É claro. - ele murmurou, dando um passo para trás - Eu... Isso foi um erro, não devia ter vindo.

Ele se virou para sair, mas antes de abrir a porta, parou e lançou um último olhar para mim, carregado de dor e arrependimento.

- Espero que seu novo namorado não seja um babaca hipócrita como eu fui - a raiva dele parecia mais direcionada a si mesmo do que a mim, mas isso não tornava a situação mais fácil.

Então ele saiu, fechando a porta suavemente atrás de si.

Eu fiquei ali, olhando para a porta, sentindo as lágrimas ainda quentes no meu rosto, o coração batendo descompassado e a mente em um turbilhão de emoções. O que eu havia feito? Hudson estava arrasado, e eu também não estava melhor. Aquela não era a resolução que eu esperava. E, de alguma forma, sentia que isso ainda não tinha terminado.

Desabei no chão, abraçando meus joelhos, as lágrimas finalmente caindo livremente. Esse não era o desfecho que minha mãe falava quando me dizia que eu precisava de encerramento. Isso era outra coisa, algo que ainda ia me assombrar por muito tempo.

Dear (B)romanceOnde histórias criam vida. Descubra agora