Capítulo 26 - O Convite

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   Quando todos da Ordem Secreta tinham saído, cada um para sua devida casa, Mitchell se viu novamente sozinho em meio ao porão, como se toda a Terra tivesse sido devastada e ele fosse o único sobrevivente. Mas até que isso foi bom.

   Ele encontrou um espelho velho e empoeirado, encostado em um canto. Apesar de pesado, ele o trouxe sem dificuldades até o sofá, o depositando ali de forma que o móvel atrás servisse de apoio.

   O espelho devia ser do século passado. Havia uma enorme rachadura em forma de teia de aranha no centro, distribuindo rachadura por todo o vidro, de forma que o reflexo de Mitchell estava quase que imperceptível, levando em conta o enorme "todo".

   Ele posicionou o objeto de forma que a iluminação das velas propagassem o brilho para que ele pudesse ver a si mesmo no espelho.

   Com a superfície do vidro rachada, o reflexo de Mitchell saiu inteiramente desfocado. Seu rosto era mostrado em cada fragmento do espelho, como uma imagem desfocada. De dois, ele passou a ter vários olhos. De um, ele passou a dezenas de outros narizes - ou parte deles -.

   O Elementar andou de um lado para o outro, com a agitação crescente percorrendo junto com seu sangue com tanta potência que era quase que impossível ficar parado por um tempo prolongado acima de quatro segundos.

   Quando enfim parou quieto, encarou todos os seus reflexos. Respirou fundo, e esfregou as mãos uma da outra, como se tivesse fazendo aquilo para se aquecer.

   -Oi, Melanie... - disse ele, olhando para si mesmo. Treinar na frente do espelho, para não ter dificuldades na hora de conversar com alguém, era o que muitas pessoas faziam. Ele só esperava que isso funcionasse com si mesmo. - Não... Acho que não devo começar assim.

   Ele respirou fundo, esfregou as palmas das mãos na calça, e tentou de novo:

   -Melanie... Você gostaria de sair... - "Não...!", ele pensou. Estaria sendo muito direto se falasse exatamente dessa maneira. Não. Não queria que Melanie achasse que ele estava em estado de desespero - algo que nem ele próprio podia dizer com clareza -.

   O que falar? Como falar? Era uma dúvida que estava tirando-lhe a concentração. Por que parecia tão difícil ir até Melanie e convidá-la para jantar? Ou a ir para o cinema? Ou até mesmo para um passeio no parque? Parecia que estava se tratando de um bicho de sete cabeças.

   Ele passa a mão pelos cabelos loiros, os bagunçando, fazendo alguns fios ficarem de pé. Ele tira os óculos escuros da frente do rosto e aperta o alto do nariz com os dedos da mão livre.

   Depois de manter os olhos, por alguns segundos, fechados, ele os abre e encara a si próprio no espelho. Suas íris incandescentes e excessivamente vermelhas eram mostradas em cerca de dez partes do espelho. Desse jeito... Tendo essa imagem como um suporte, ou até mesmo como base... Ele parecia um... Um...

   Um monstro.

   "É isso...", pensou Mitchell, deixando o braço esquerdo "mole", fazendo-o despencar inerte ao lado do corpo. Os dedos, frouxos e sem usar muita força, fazem os óculos caírem no chão.

   "É isso...", pensou de novo. Agora entendia por quê estava tão preocupado em convidar Melanie para um encontro.

   "Quem quereria sair comigo, um monstro com fogos nos olhos e possíveis mortes nas mãos?".

   Com raiva de ser daquele jeito - de poder causar desprezo na garota que ele estava começando a amar -, Mitchell fecha os dedos da mão direita em forma de punho e, concentrando toda a sua força ali - toda a sua fúria -, investe um golpe contra o espelho.

A Ordem Secreta - O Despertar do FogoOnde histórias criam vida. Descubra agora