50. Confronto

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A minha respiração estava acelerada. Depois de alguns anos finalmente eu ia estar novamente no meu lar, corrijo a casa onde eu cresci; aquilo nunca foi o meu lar. A noite aproximava-se a cada segundo, o frio instalava-se dentro do carro e eu embrulhava-me com mais força no meu casaco. O outono estava finalmente a chegar.

"Hope!" Michael chamou e eu olhei-o ainda nervosa. "Já suspiraste mais de mil vezes, podes-me dizer o que se passa?" Acalmou o seu tom olhando-me rapidamente.

"Estou com medo.." Respondi rapidamente encarando as minhas mãos.

"Medo de que anjo?"

"Que algo corra mal, que o meu pai me abandone agora de vez." Suspirei sentindo-me quase ficar sem ar com as minhas palavras.

"Hope.. Vai correr tudo bem." Michael disse sorrindo mas eu continuei com a mesma cara. "Se não correr eu vou estar aqui, ninguém te vai fazer mal.."

[...]

Não me sentia em casa, o mais estranho é que agora eu parecia uma estranha aqui. Não era o meu lar e lamento pela minha mãe, mas a verdade é que não me sentia em casa aqui. Não com ele. Não com o meu pai aqui. Michael admirava as atentamente a decoração do quarto, apesar de já ter estado aqui, e soltava pequenas gargalhadas aqui e ali com algumas fotos espalhadas pelo quarto. Lia sossegadamente o meu livro antes de o jantar ficar pronto, e pelas paredes finas conseguia ouvir a conversa dos meus pais. Sempre cresci com fases no que toca ao ambiente familiar. Fases boas e más. Momentos bons e maus. Dias em que chorava e gritava por socorro e dias em que me sentia amada. Eles viam-no, e achavam que era assim em todos os momentos da minha vida. Que eramos uma família feliz, mas eu desejava que nunca ninguém levantasse a cortina para ver o que se passava dentro daquelas paredes. O homem que ele era, nunca ninguém o conheceu como eu, e talvez só talvez eu sinta muito por ter nascido e ter de conhecer o meu pai desta maneira triste.

A noite em que lhe pedi para ficar ainda me atormentava. Era tarde nesse dia precisamente dez da noite, vi-o com um saco de desperto no ombro e posso jurar que nesse dia o meu coração quebrou pela primeira vez. Corri até ele e pedi-lhe que ficasse agarrando-o pelas suas calças. Ele pegou-me ao colo e beijou as minhas faces limpando as minhas lágrimas, acho que ele viu que se me deixasse me iria perder e arrependeu-se.

O mundo fora cruel com ele, dizia que ele era um homem cansado e que havia uma sombra cinzento para todos os toques de azul na sua vida. Era desta forma que viam a vida dele, porque se nada estivesse errado nada estaria certo. E para aquele homem trabalhador eles gritavam que ele mal se segurava em pé, mas tinha de ver um lugar melhor para ele aterrar. Algum antidoto para o mundo que nunca o deixou ser ele mesmo. Este era o homem que eu chamo de pai, ouviram o suficiente?

"Hope.." Michael rapidamente correu até mim retirando o livro das minhas mãos abraçando-me. "O que se passa meu amor?" Ele questionou só quando o fez eu tive a precessão de que estava a chorar mais do que devia.

"Ele está aqui Michael.. Ele está aqui..." Gaguejei fracamente tentando conter a minha respiração para mais ninguém a ouvir.

"Isso é bom Hope, ele está aqui por ti." Michael disse, e bem lá no fundo eu senti a frieza no seu tom.

"O que se passou entre vocês?" Perguntei finalmente e Michael afastou-me dele olhando-me confuso.

"Hope tu sabes como é, é teu pai e nós estamos juntos é normal ele ser assim comigo. Mais rude, eu apenas me irritei um pouco mas já passou. Agora vamos aproveitar isto por ti está bem anjo?" Michael explicou entregando-me um lenço. Limpei a minha cara e assim que a porta foi aberta pela minha mãe eu sorri levantando-me rapidamente pois nem eu nem Michael estávamos numa posição muito boa de explicar o que se sucedia. E a minha progenitora não iria acreditar se eu lhe dissesse "Não estávamos a fazer nada de mal" mesmo que não o estivéssemos mesmo a fazer.

[...]

MICHAEL

Tina acolheu-me gentilmente na sua casa, pois ela via a felicidade de Hope quando eu lá estava. Mas o seu pai continuava a olhar-me como se eu lhe devesse dinheiro, como se eu fosse um criminoso. E o meu temperamento já não aguentava muito mais. Dois alcoólicos a confrontarem-se com o olhar. No fim Hope ofereceu ajuda a sua mãe para levantar a mesa. Deixou-me sozinha com o pai dela. Respirei fundo e encarei as minhas mãos.

"Eu sei o que tu queres dela." Ele disse rouco. Tinha a voz extremamente rouca devido ao tabaco e a bebida. "Mas tu também não deves passar de um inútil falhado verme da sociedade.." Olhei-o, e por momentos senti que fosse perder a cabeça mas lembrei-me de Hope e tentei acalmar-me. Foda-se ela não merece esta cruz.

"O senhor não me conhece." Disse baixo rindo rouco. "A Hope está feliz comigo, já olhou para a sua filha? Já viu o quanto ela cresceu? A mulher que ela se está a tornar? O quão bela está a ficar, caso não tenha reparado eu amo-a. Talvez devesse começar a respeitar-me." Hope e a sua mãe voltaram para a mesa e eu fiz questão de agora entrelaçar os meus dedos nos dela, em cima da mesa. Ela olhou-me corando e deixou-se ficar enquanto conversava alegremente com a mãe e de vez em quando dirigia a palavra ao pai.

"Hope.." O pai dela pousou o copo de Whisky na mesa com força olhando para ela. "Diz-me o que viste neste triste?" Ela olhou para o seu progenitor e para mim, a minha perna estava colada a dela e mal ela ouviu a voz dele, tremeu. Olhava os dois repetidamente e Tina estava ainda mais chocada que eu e Hope.

"O pai está mesmo interessado em saber o que eu realmente vi no Michael? Então tudo bem eu ligo-lhe, eu vi nele tudo o que nunca vi em ninguém e pode parecer-lhe um pouco cliché mas ele fez-me sentir amada, coisa que nunca antes senti. Eu vi amor, vi um lar no abraço dele, desejo, paz e vi nele tudo o que não consegui encontrar em mais ninguém e o pai devia ficar feliz por me vez contente." Hope falava seriamente sentia que ela estava prestes a explodir Mas realmente o que o pai pensa dele não muda nada para mim"


A sua gargalhada fria fez-se ouvir pela imensa sala de jantar, fazendo com eu olha-se ainda com mais desprezo aquele homem.

[...]

Acordei com Hope a remexer-se na cama. Ela não se mexia enquanto dormia, e para me acordar enquanto eu dormia era sinal que algo estava muito mal. Virei-me para ela para a ver a revirar-se vezes e vezes sem conta, a sua cara estava molhada com lágrimas e ela gemia baixo aflita. Toquei-lhe tentando acorda-la.

"Não.. Por favor.. Pai... Não.." Ela falava com dificuldade e eu já não sabia o que fazer mais, puxei-a para os meus braços. "Não me deixes pai.." Ela chorou alto acordando, o seu reflexo foi levantar-se rapidamente mas como estava nos meus braços apenas levantou um pouco o seu peito.

"Hope.." Sussurrei beijando a sua têmpora, ainda era visível a cicatriz daquele dia.

"Ele ainda não chegou pois não?" Ela perguntou e eu assenti tristemente.

Hope olhou-me e abraçou-me afundando a sua cara no meu ombro. Sentia as lágrimas dela molharam a minha camisola mas não queria saber. Afaguei-lhe as costas tentando remediar a dor dela mas não funcionava. Afastei-a e agarrei o seu rosto nas minhas mãos fortemente. O olhar dela estava cansado.

"Hope acalma-te. Vai ficar tudo bem.. Sabes se quiseres ir embora eu não te vou dizer que não."

"Desculpa por ele." Ela choramingou.

"Não me peças desculpa.. Tu és a pessoa que menos tem culpa nesta história. Eu é que devo pedir-te desculpa. E mesmo assim não chega."


HOPE » Michael CliffordOnde histórias criam vida. Descubra agora