JAMES
Eu conheci Stella numa quinta-feira chuvosa. Lembro-me como se fosse ontem, quando a vi pela primeira vez no restaurante do hotel em que eu trabalhava. Ela vestia um vestido preto justo o suficiente para mostrar suas belas curvas. Seu cabelo parecia tão sedoso que eu me senti tentado a enroscar meus dedos naquele emaranhado de cabelos loiros, e quando seus olhos encontraram os meus, vi ali uma tristeza profunda. Ela estava acompanhada de seu marido, e eu me senti incomodado pelo modo como ele a tratava. Ali estava um homem de negócios, era possível adivinhar isso pelo seu terno caro e seu relógio de ouro. Quem usa relógio de pulso a não ser um homem de negócios? Ao seu redor, estavam vários outros homens como ele, a diferença é que ele era bonitão, verdade seja dita. Enquanto eles bebiam um uísque caro, fiquei hipnotizado com aquela pobre moça, que parecida estar tão perdida na vida quanto eu. Após o jantar deles, onde ela permaneceu praticamente invisível, vi ela sendo arrastada para o andar superior onde ficam os quartos, pelo seu marido aparentemente muito bêbado, e quando ela me olhou uma última vez parecia pedir socorro. Conforme a madrugada ia adentrando, e eu ficava sem ocupação alguma, fui ajudar o pessoal da limpeza, como sempre faço, a carregar os sacos de lixo para os fundos do hotel. Sempre achei injusto, aquelas senhoras tão magrinhas carregando esses sacos pesados. E para minha surpresa, quando jogo os sacos na caçamba, escuto um barulho. Mais precisamente um soluço, tão baixinho que só foi possível eu escutar pelo silencio que estava no local. Fui andando a passos curtos, tentando identificar de onde vinha o barulho, quando me deparo com a bela moça que vi no restaurante, sentada, abraçando os joelhos, com uma fina garoa caindo sobre ela, ensopando seus cabelos e sua roupa. Não pude fazer nada, a não ser seguir meus instintos e abraça-la, tentando de alguma forma lhe passar algum tipo de conforto, enquanto ela se sacudia em seu pranto em meus braços. Naquela hora eu soube, que algo estava acontecendo entre nós. E depois que ela se acalmou, me disse seu nome, me contou como seu marido se transformou após o casamento, sempre pensando em trabalho e mais trabalho, como a bebida tomou conta do pouco tempo livre que ele tinha, e como a maioria das vezes, sua noite acabava dessa maneira, ela chorando em algum lugar estranho, com algum hematoma no corpo, eu tomei minha decisão. Eu ia cuidar dela, eu ia tirar ela dessa vida de horror na qual ela se meteu, tendo apenas 24 anos. De alguma forma, acabamos nos beijando aquela noite, em meio a fina garoa e aos sacos de lixo fedidos. Na manhã seguinte ela partiu, prometendo me ligar assim que possível. Eu esperei dias e dias até receber seu telefonema, onde ela me deu seu endereço, e disse que seu marido estava viajando. Passei três maravilhosos dias em sua bela casa, sem me importar com trabalho, sem me importar com nada. Eu estava apaixonado, e ela parecia estar também. Me disse que nunca se sentiu tão feliz em sua vida, e eu adorava fazê-la sorrir, adorava vê-la acordar. E assim eu me tornei seu amante. Toda vez que seu marido viajava, eu ia para sua casa. Mas como nada pode ser tão perfeito, aos poucos fui descobrindo sua real personalidade. Sua falta de opinião, sua futilidade escondida por debaixo de seu belo rosto, e quando a questionei sobre seus sentimentos, se não estava na hora de ela largar seu marido estúpido, sua falta de resposta deixou bem claro que ela não largaria aquele homem, não para ficar comigo, que mal tinha dinheiro para me sustentar. Mesmo assim, eu continuei indo em sua casa, continuei me afogando cada vez mais nessa paixão que eu sabia que não ia me levar a lugar algum, até que eu conheci minha salvação. Até que eu conheci Eve.
Eu não sei dizer o que me chamou a atenção nela. Diferente de Stella, ela não tinha um corpo escultural, nem cabelos maravilhosos loiros, que chamavam a atenção de qualquer um. Ela poderia ser considerada uma garota normal. Mas havia algo nela, que me chamou a atenção. Algo que me fez querer conhece-la, que fez meu coração acelerar como nunca tinha acontecido. Talvez tenha sido uma conexão, ou o destino colocando alguém em minha vida de maneira inesperada. Eu realmente achei que Eve sequer tinha me notado, pois minhas tentativas de chamar sua atenção foram falhas. Mas para minha surpresa, mais uma em meio a muitas que iam acontecer em minha vida, Eve se interessou por mim, tanto, que foi ela quem tomou a iniciativa de me procurar. E depois que a conheci, que senti seus lábios nos meus, que passei horas conversando com ela, vendo como ela era inteligente, perspicaz, cômica, eu me vi, querendo passar o resto da minha vida ao lado dela. Eu precisava me libertar de Stella, e do mal que ela estava me fazendo. Eu queria apenas ficar com Eve, me meter nas mais diversas confusões com ela, rir de suas histórias não tão engraçadas assim, só para ela ficar feliz, me perder em seus olhos castanhos e profundos, mostrar a ela coisas novas, dividir minha vida com ela. Mas me livrar do encanto de Stella não foi tão fácil como imaginei. Eu simplesmente não conseguia dizer não quando ela me chamava, e mesmo preso na infantilidade dela, e em sua infelicidade, eu continuava indo em sua casa, e depois voltava para a doce Eve, com uma culpa incabível em meu peito. Então, eu decidi recomeçar. Abandonar emprego, número de celular, ou qualquer outra coisa que pudesse me ligar a Stella de alguma forma. Eu tinha que ficar com Eve, que me fazia realmente feliz. Mas também não podia abandonar Stella desse jeito. Portanto, quando ela me avisou que seu marido ia passar uma semana fora, fui até a sua casa decidido a acabar com aquilo. Mas Stella tinha algo a me falar também, e eu nunca me senti tão feliz e triste ao mesmo tempo. Eu ia ser pai. E Stella havia pedido o divórcio, para ficar comigo. Seu belo rosto, exibia um hematoma na bochecha, provavelmente algum tapa, da reação do seu explosivo marido, acerca desta notícia. Imagina se ela tivesse contado sobre a gravidez... Ele provavelmente teria a matado. Eu passei alguns dias em sua casa, tentando assimilar essa notícia, eu não podia deixar Stella sozinha, grávida de um filho meu, sem nem ter onde morar, já que ela era órfão, e sua tia que a criou morava num estado muito distante. Tudo que eu mais queria, era voltar para Eve o mais rápido possível, mas me senti incapaz de fazer isso. Eu tinha que tomar minha decisão. Eu tinha duas opções, ficar com Stella, como parecia o certo, agora que ela estava gravida de mim, ou ficar com Eve, que me fazia sentir vivo, como nunca me senti antes. E eu não fazia a menor ideia do que fazer. Quando voltei para dizer a verdade a Eve, não consegui. E fui surpreendido por um convite bem inusitado da parte dela, para finalmente transarmos. Como pode, alguém passar meses na companhia de uma pessoa, e se sentir imensamente realizado, sem nem ao menos ter transado com ela? Eve conseguiu fazer isso comigo. Eu devia ter recusado esse convite, mas não pude. Eu precisava senti-la, mais do que eu precisava de oxigênio, e quando aconteceu, foi intenso, foi mágico, foi único. E eu ainda descobri que eu tinha sido o primeiro em sua vida, só constatando o fato de que o que ela sentia por mim, era tão forte quanto o que eu sentia por ela. E após quase ser preso, por motivos futuramente engraçados, eu tive que contar a Eve. Tudo. Eu precisava que ela me entendesse, me perdoasse, mas acima de tudo, ficasse comigo. Eu me vi, necessitado dela, para esquecer toda essa história com Stella, para adiar o máximo possível, o momento em que eu teria que abandoná-la. E acima de tudo, para quem sabe, achar uma solução, onde todos pudessem ficar felizes, onde eu poderia ficar com ela. Mas antes mesmo de eu terminar de falar, eu via a descrença em seu olhar. Eu vi, antes mesmo que ela dissesse, que eu a havia perdido. E quando ela correu para longe de mim, sem ao menos deixar eu levar ela para casa, eu senti um pedaço de mim, um pedaço da minha alma, do meu coração, indo embora com ela. Eu me senti vazio. E a cada dia que passava, sem ela me procurar, sem retornar minhas mensagens, ligações, fingindo que eu era um estranho, enquanto eu a perseguia na rua, na saída do trabalho, na saída da escola, eu ia me sentindo cada vez mais vazio, cada vez mais triste. E senti que a decisão havia sido tomada sem eu sequer ter a chance de escolher. Eu ia ter que ficar com Stella, assumir meu filho ou filha, e montar uma família precoce, ao lado de uma mulher que eu achei um dia amar, enquanto passava cada minuto dos meus dias, pensando em Eve. Esse pensamento era tão desconsolador, que eu tinha que me segurar para não cair em lágrimas.
Em algum lugar do meu bagunçado quarto, meu celular começa a tocar. Enquanto reviro em minha memória pela milésima vez, os acontecimentos dessa história tão infeliz que é a minha, nem sinto coragem de levantar para procura-lo. Mas algo dentro de mim, me impulsiona a levantar, e eu começo a revirar as roupas espalhadas por todo o canto, até que acho o celular. Quando vejo o nome no visor, pisco para afastar as lágrimas, em vão.- Eve – praticamente grito, ao atender.
- Não querido – uma mulher sussurra, parecendo estar com pressa. – É uma amiga dela, que não aguenta mais vê-la em depressão. Me escute, você precisa estar na rua Fergusson, número 17, hoje, ás 19:00 horas...
- Mas... – começo, confuso.
- Mas nada – a mulher me interrompe. - Esteja lá, se você quiser conversar com Eve, e consertar as coisas.
O telefone fica mudo. Eu sento no chão, e levo as mãos à cabeça. Tudo o que eu mais quero, é ficar com Eve, e consertar as coisas. Mas primeiro tenho que resolver o que fazer com Stella. Pois eu também quero ver meu filho crescer, quero fazer parte da vida dele. Olho no relógio, são 17:40.... Levanto rapidamente e vou para o chuveiro. Não importa o que aconteça, ou o que eu tenha que fazer.... Eu irei ficar com Eve, pelo menos uma última vez.
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Esta não é uma história de amor
Storie d'amoreEve é uma adolescente comum. Sem grandes perspectivas acerca do futuro, ela leva uma vida monótona, e secretamente se pergunta se um dia alguém irá se interessar por ela. Até que um dia, de uma maneira nada convencional ela se vê estranhamente atraí...