Megan&Dixie

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Megan ganhou Dixie aos nove anos.

E agora ela tinha vinte e seis.

Antes da cadela chegar em sua casa, costumava se divertir criando suas próprias histórias em quadrinho e brincando de boneca. Todas, é lógico, super poderosas. Suas Barbies voavam, tinham rajadas ópticas e superforça. Costumava também colecionar figurinhas e ler as histórias para os pais, muitas vezes fazendo teatrinhos. Tudo isso sozinha.

Quando Dixie chegou com um lacinho no pescoço, não se conteve em abraçá-la, mantendo-a por perto desde então. E a cadela levava isso a sério. Tanto, que demorou dezessete anos para morrer. Mais do que qualquer animal conhecido na família, Dixie manteve seu posto de rainha da casa por longos anos, criando um mal hábito:

De que nunca partiria.

Megan não estava preparada. Na realidade, sempre quis deixar esse assunto de lado. Fora a cadela responsável por todos os bons momentos de companheirismo até os doze anos, quando Beatrice finalmente surgiu, mostrando que os humanos também podiam ser confiáveis. Dixie muitas vezes obrigava Megan a sair da cama de manhã cedo para buscá-la no quintal do vizinho, onde destruía as plantas atrás de um esquilo qualquer. Também era costumeiro que Megan percorresse toda a vizinhança atrás da cadela, que fugia e voltava só no final da tarde. E em certas manhãs, acordava com a respiração quente da Cocker Spaniel em seu rosto. Esses eram sem dúvida os melhores.

Megan pensava em tudo isso enquanto chorava na sala, acompanhada por um pote de sorvete e Marley&Eu na TV. Três meses se passaram desde o falecimento da cadela, mas Megan se sentia quebrada. Como se algo dentro de si não estivesse correto. O vazio em seu peito parecia aumentar a cada dia e não conseguia expressar nem um porcento do que sentia. Não era a melhor nesses assuntos. Só na empresa. Afinal, não precisava se expor no trabalho, muito pelo contrário. Tentou ligar para os pais e até mesmo jantou com eles algumas vezes, mas não conseguia ser frágil, por mais que se sentisse assim por dentro. Encontrou Beatrice também, pensou em dizer algo, mas a alegria de sua amiga era tão visível que não teve coragem. Nem mesmo sobre Edwin haviam conversado direito, por mais que Beatrice tivesse insistido.

Edwin e John foram colegas na faculdade. Enquanto o noivo de Beatrice tornou-se um publicitário de sucesso, o ex namorado de Megan preferiu ser jornalista. Era um cara legal, sem dúvidas. Gostava de animais, tinha bom humor e fazia a garota rir mesmo que quisesse socá-lo. Trabalhava como colunista na sessão de casamentos, algo que o deixava infeliz e decidiu arriscar tudo abrindo um café com livraria. O lugar era pequeno, mas tornou-se um point, principalmente dos dois casais, que saíam sempre juntos.

Megan sabia a preocupação de Beatrice. Afinal, fora John que apresentara Edwin a ela. Beatrice e o noivo bolavam, dia após dia, uma forma de vê-los juntos. A amiga de Megan acreditava que Edwin era o cara certo. Até Megan acreditava nisso. Por mais que sua mãe rezasse todos os dias para que um oficial do exército a carregasse nos braços e a levasse para o altar, Megan sabia que Edwin era o tipo de homem que gostaria de ter ao lado.

Então porque não aceitar a proposta?

Porque certamente não estava pronta.

Talvez nunca estivesse.

Naquele assunto, era insegura. Por mais que colocasse os rapazes para correr desde o jardim de infância, estava cansada deles. Como do namoradinho do Ensino Médio que a traiu no Baile de Fim de Ano, do cara da faculdade, que tirou fotos escondidas e depois tentou chantageá-la e do último, que fingia ter um AVC quando chegava a conta. Bateu nos três e não se arrepende. Pro último, enviou as despesas dos pratos que quebrou. Com todas as experiências, percebeu duas coisas: A primeira era de que tinha o dedo podre e a segunda era que seus nervos ainda a colocariam na cadeia.

O que quase aconteceu da última vez.

Por mais que amasse Edwin, não sabia como poderia conviver com ele por tanto tempo. Dormir e acordar juntos, discutir sobre contas e outras responsabilidades, vê-lo todo instante ao ponto de cansar... não queria que isso acontecesse. Na realidade, queria permanecer da forma que estava. Gostava daquele jeito. Só que Edwin não aceitava ser um namorado eterno. Ele, mais feminino do que Megan, queria fazer planos. A queria no vestido branco. Algo que ela não podia fazer. Por isso, deixou-o seguir seu rumo, imaginando que teria sempre a respiração quente de Dixie para confortá-la.

E ela também se foi.

E Megan voltou a se sentir sozinha, como na infância. Antes, tinha os pais para fazer teatrinhos, mas agora se encontrava sozinha num apartamento silencioso e melancólico. Olhou o retrato de Dixie na parede por algum tempo. Sabia que a cadela detestaria vê-la daquela forma deplorável. Sempre que Megan se sentia infeliz, era Dixie que lambia todas as lágrimas e pulava em seu colo, como se quisesse confortá-la. Só de tê-la por perto, sentia-se melhor. Acolhida. Encarou a TV enquanto Marley destruía o dia da treinadora e focou em alguns papéis em cima da mesinha. Os inúmeros folhetos e contas do último correio. Não costumava perder tempo lendo as falsas promoções que enviavam todo Domingo, mas decidiu naquele dia especial pensar em algo diferente de dor e sofrimento. Verificou os folhetos até que encontrou um que lhe chamou a atenção.

A quanto tempo não tirava férias?


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