Beatrice

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Um pacote de viagem. Promoção única, pelo que dizia o folheto.

França, Espanha e Itália. Uma volta completa por vários pontos turísticos e liberdade para conhecer o que quisesse. Parecia, no fim das contas, uma boa ideia. Utilizar os dias de férias para relaxar e se manter distante da humilhação do casamento cancelado. Tinha muito o que resolver antes, sem dúvida. Não conseguiria se machucar menos, ainda mais com tantos telefonemas complicados para dar. E também, o rombo no orçamento. Como conseguiria passear depois de pagar todas as despesas? O que mais a irritava era não ter mais forças para discar o número de John e mandá-lo pagar tudo. Era o que merecia, depois de ter destruído planos para uma vida.

Beatrice sempre gostou de resolver suas pendências de forma amistosa. O que é o ideal, na maioria das vezes. Só que em muitas das ocasiões, acabava saindo com prejuízos incontáveis, tudo por ser gentil demais. Megan era diferente. Por mais que tenha aprendido a controlar boa parte de seus impulsos, não tem a mínima vergonha de puxar o colarinho de quem quer que seja quando está irritada. Beatrice não conseguiria fazer isso, mas após aquela decepção, sentiu-se exausta. Farta de ser sempre a que precisa de ajuda. Largou-se na cama novamente, suspirando. Que confusão John tinha causado na sua vida.

Custava ser de fato o homem que ela pensava que fosse? Gentil, honesto, leal e companheiro? Que a fizesse se sentir bem na maior parte do tempo só por estar por perto? Onde estaria aquele bom ouvinte, que se preocupava com seu dia a dia e sempre a fitava como se estivesse interessado no que tinha a dizer? Bagunçou os cabelos e sacudiu as pernas, quase deixando a bandeja cair e se conteve. A tirou de cima de si, levantando da cama. Precisava reagir. Precisava esquecer o homem bom que John fora com ela. Só assim poderia seguir em frente. Não podia se deixar levar por todo aquele teatro, pois era isso o que ele queria. Uma garota bonita e gentil em casa, que fizesse par ao seu eu publicitário amado pelo pai. Aos finais de semana, seria o Johnny de uma musicista qualquer, que gostava de pular de bar em bar e ser aclamado. Enquanto ela permaneceria em casa, esperando que retornasse. E torcendo para que fosse sozinho.

Isso não era vida. Não para ela.

Beatrice só queria uma família feliz. Sem anúncios de manteiga ou dinheiro sobrando. Só pessoas que se amavam muito dividindo a vida. Um homem que a tratasse bem e quem sabe frutos de todo esse amor. Um cachorro, uma casa ou apartamento por aí. Domingos tranquilos, na praia ou parque. Momentos em que pudesse também chamar Megan e aumentar ainda mais a diversão. Sabia que em toda relação os problemas existiam, queria até mesmo enfrentá-los, como fizera toda a vida com a melhor amiga.

Mas uma relação a três era demais para aguentar.

Observou a chuva bater na janela por algum tempo. O dia estava tão ferrado quanto ela naquele momento. Viu no céu o Sol tentar, sem sucesso, ultrapassar alguns feixes de luz em direção ao solo, mas travava uma batalha difícil. Eram muitas nuvens. Beatrice suspirou e olhou para o telefone. Tinha que fazer o papel de Sol em sua vida ou nunca sairia de trás das nuvens. Ou até poderiam sumir, com o tempo, mas a que custo? Precisava enfrentar o problema de cabeça erguida e atribuir os deveres corretos a cada um. Ela queria casar, estava feliz e satisfeita com isso. John não. Queria uma cena. Então ele que se responsabilizasse pela falta de honestidade.

Pegou o celular e digitou em letras garrafais uma mensagem para o ex noivo. Depois disso, ligou para a mãe. A conversa não foi fácil, mas precisava dizer aos seus parentes mais queridos que não precisariam mais dos vestidos alugados e horários no salão. Depois, ligou para cancelar a igreja.

- C-como o noivo não permite? Senhor, eu sou a noiva, se digo que não vou casar, ele não pode me obrigar! - reclamava ao telefone, inconformada. Só com a resposta do padre começou a encaixar as peças. Desligou o telefone. Não sabia que John conseguiria chocá-la mais do que já havia feito, mas ele se superara. Não conseguia nem mesmo chorar, tamanha perplexidade. Só conseguiu sentar no chão, atordoada.

Percebeu a saída de Megan do próprio quarto. Estava furiosa e ficaria ainda mais. Não podia colocar a amiga numa situação de repleta fúria mais uma vez. - Meg...- começou, sem olhar para a amiga por um tempo, até encará-la. - Adivinha quem vai casar? - perguntou com ironia na voz, observando o surto de raiva da amiga no corredor.

Com o corpo praticamente morto, levantou-se do chão e seguiu em direção a cozinha, pegando um copo d'água. Conseguia ouvir os palavrões da amiga à distância e continuou a observando arremessar almofadas e quase rasgá-las com as mãos. - Pra quando você disse que é a viagem mesmo? - Beatrice perguntou e Meg parou o que estava fazendo para encará-la. Se comunicaram com o olhar.


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