CHLOË
Eu estava me sentindo realmente estranha.
Estava com fome, mas aquele frenesi que sempre me tomava quando estava faminta não apareceu. Estranho.
Ryan havia atrasado um pouco o reabastecimento da nossa comida. Imaginei que devia estar se tornando impossível achar pessoas mortas lá fora. Talvez a coisa ficasse tão ruim que Ryan teria que trazer presas vivas.
"Não!", exclamou meu cérebro deteriorado. "Você está se curando. Não pode deixar que a fome faça você voltar ao que era antes. Ryan confia em você!"
Era verdade. Eu me sentia cava vez mais humana, embora ainda estivesse morta e comendo cadáveres.
Eu estava disposta até a comer menos. Afinal, eu preferia que papai pudesse se alimentar melhor e, quem sabe, começar a se curar também.
Infelizmente, doía meu coração degradado vê-lo sem melhoras aparentes.
Se ao menos ele se lembrasse de mim...
Enquanto pensava nisso, um barulho irritante e escandaloso chegou aos meus ouvidos. Gail havia trazido um pacotinho de doces e parecia estar tentando inutilmente abri-lo. O som era enlouquecedor.
– Casseta, Gail! - gritei, finalmente aborrecida.
Vi Ryan e Gail saltarem de susto, e virei o rosto para esconder uma risada. Eles não se refrearam e começaram a gargalhar.
– Nossa... alguém voltou a ter TPM? - disse Gail.
Joguei uma das almofadas que estavam ao meu redor em Gail. Ela se jogou fingindo estar estrebuchando. Quase deixei um sorriso morto escapar em meu rosto.
Fui até ela para pegar a almofada de volta. Porém, uma súbita inspiração me dominou quando olhei para o saquinho de balas. Será que eu conseguiria..?
Não pensei muito para testar. Peguei uma das balas, tirei a embalagem e a pus na boca.
Ryan e Gail me olhavam espantados. Comecei a mastigar.
– Então? Você... sente o gosto? - Gail parecia curiosa.
Franzi a testa enquanto tentava saborear. Um sabor que há anos eu não sentia... meio adocicado, meio azedo... era uma fruta, provavelmente.
Olhei para o corante que havia ficado em minhas mãos e deduzi o óbvio.
– Uva - murmurei, surpresa.
Gail verificou a embalagem e confirmou, pasma.
– Exatamente.
Engoli a bala, ficando maravilhada com seu sabor e textura.
Eu estava me alimentando normalmente outra vez.
– Caramba... o corpo dela está tolerando comida - Gail se virou para Ryan, com os olhos arrgalados - Você sabe o que isso significa?
Eu sabia... eu poderia voltar a me alimentar de verdade. Sem machucar mais ninguém.
Fiquei tão feliz que as lágrimas apareceram em meus olhos sem aviso.
– Ah, não... você vai chorar por que comeu uma bala?
Ryan parecia estar achando graça. E, ao mesmo tempo, parecia muito satisfeito.
Tentei ficar zangada com ele, mas não conseguia. Aquilo era demais para mim.
– É - tentei sorrir. Deveria estar parecendo uma idiota, chorando por ter comido um doce.
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Voltando à Viver
Aktuelle LiteraturSinopse: Qual é o limite entre a bestialidade e a humanidade? "Eu podia ter me livrado dela. Podia ter dado um tiro na testa dela e meus problemas nem teriam começado. Se eu não fosse tão burro...(...) Se eu não tivesse me apaixonado... (...)" Num m...