Esse instinto maternal

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CHLOË


Eu mal acreditava no que estava acontecendo; Mais um humano havia acabado de concordar em cuidar de nós.

De início, achei o doutor Shawn quase suspeito e inconfiável. mas quando vi um sorriso surgir quando olhou para Pim, senti que realmente tínhamos convencido mais uma pessoa a nos ajudar.

Os dias seguintes transcorreram com muito mais calma. Com Shawn encobrindo a Clínica, todo o esquema de tratamento de zumbis continuou com muito mais serenidade e sossego.

Eu não tinha inteligência humana o suficiente para perceber as melhoras nos zumbis ao meu redor, mas eu me sentia mudar cada vez mais - ao menos por dentro.

Meu coração, pobre órgão, estava começando a se acostumar a bater outra vez. Eu me sentia com um vigor físico que nenhuma vez senti quando ainda era uma zumbi comum. E tinha aquele sentimento irritantemente maravilhoso que saltava em meu peito morto toda vez que via Ryan.

Eu estava começando a achar que ele realmente nunca me abandonaria... eu voltando a ser humana ou não. Ryan era um garoto maravilhoso com o coração do tamanho do mundo, fazendo algo que a maior parte das pessoas sequer cogitaria se arriscar à fazer. Quem se arriscaria tanto para salvar pessoas que todos consideram simples bestas sem sentimentos?

– Pim, me ajuda aqui, coisa fofa? - brincou Gail ao meu lado, fingindo segurar com dificuldade uma bola de praia nas mãos.

Pim veio saltitando até Gail, e puxou a bola dela com um sorrisinho maroto no rostinho pequeno. Era como uma boneca do mal - fofa e arrepiante ao mesmo tempo.

Papai riu, e senti meu peito estufar outra vez, como uma bola murcha sento enchida com ar. Quanto tempo que não fazia desde a última vez que ele rira assim...

– Ei, Chloë! - a voz de Ryan ribombou da claraboia da Clínica - temos novo paciente.

Vi a silhueta de Ryan cair na torre de almofadas, acompanhada de uma sombra minúscula em seus braços, que, para minha surpresa, nem sequer se debatia.

Quando ele apareceu diante da luz, todos recuaram, chocados.

Meu coração se partiu em mil pedaços cadavéricos quando olhei o que Ryan segurava.

Gail deu um gritinho e pôs as mãos na boca, parecendo prestes a chorar.

Era um bebê. Um bebê zumbi.

Parecia ter uns cinco ou seis meses quando morreu. Uma coisinha minúscula, do tamanho de uma caixa de sapato grande, toda cinzinha, com um buraco enorme no pequenino tórax, que podia ser visto através do rasgo que havia em sua roupinha azul encardida.

O bebê estava com os olhos abertos, com a boquinha escancarada como se fosse chorar, mas tudo o que fazia era emitir um rosnado rouco e baixo, como um gatinho faminto.

Aquilo me provocou algo que beirava à angústia. Minhas pernas tremeram de aflição.

Ryan se aproximou, parecendo confuso com minhas reações.

– Quer pegar? - ele estendeu o pequeno zumbi para mim - ele nem sabe andar, que dirá atacar alguém - a voz dele quebrou no final; parecia tão angustiado em ver a situação do bebê quanto eu.

Peguei a criança desajeitadamente, fazendo um tipo de ninho trêmulo com meus braços. Senti o corpinho gelado do bebê entrar em contato com minha pele.

Meus olhos arderam. Eu tinha vontade de chorar. Meu Deus, aquilo era irracional e errado. Um bebê, uma pessoinha tão inocente e pura, passando por aquele inferno.

Voltando à ViverOnde histórias criam vida. Descubra agora