A Fênix

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RYAN


Bob havia virado a arma em minha direção.

Eu sabia que ia morrer. mas não me importava.

Eu havia tentado. Eu iria morrer por fazer o que era certo. Sabendo o que era certo. Era mais do que eu podia pedir.

E se eu tivesse colocado uma sementinha de dúvida que fosse no coração daqueles homens que nos rodeavam, fazendo-os aceitar a necessidade de continuar minha empreitada, talvez nem tudo estivesse perdido. Haveria esperança de salvar os zumbis.

Ouvi a arma disparar, e fechei os olhos.

Mas assim que ouvi um baque seco à minha frente, os abri novamente, aterrorizado.

Não, Não. Não!

Só tive tempo de gritar.

– CHLOË!!!! NÃO!!

Chloë cambaleou à minha frente e caiu para trás. Abarquei seu corpo em meus braços. Ela tremia. Não, não, Chloë não...

Ouvi o engatilhar de várias armas ao meu redor. Vislumbrei Gail e Shawn com duas pistolas miradas em Bob. Para meu choque, todos os outros também miravam no presidente do Comitê. Bob mantinha a arma erguida, e olhava ao redor com o choque estampado no rosto.

– O que vocês pensam que estão fazendo?? - Bob rosnou, olhando alucinado para os outros integrantes do Comitê.

– Chega, Bob! - Garret disse - você disse besteira o suficiente nessa tardinha. Nós acreditávamos no que você disse sobre um novo governo para a humanidade... mas isso não justifica o que você quer fazer aqui! Acabou. Chega dessa paranoia de extermínio.

Voltei minha atenção para Chloë. Ela tinha os olhos abertos, fixos em mim. Soluçava em seco, com a mão na barriga.

Tudo ali era vermelho. Ela estava sangrando. Muito.

– Garret! - gritei, chamando a atenção de todos - ela está sangrando! Chloë está sangrando! Me ajude!

Garret meneou a cabeça, ordenando que Paul fosse até nós. Ele se aproximou, com o choque atravessando seu rosto, e começou a pressionar o ferimento de Chloë.

– Meu Deus - ele murmurou - ela não é zumbi... de forma alguma... zumbis não sangram...

Olhei outra vez para Chloë. Minha garganta se fechou, e senti meus olhos arderem.

– Por que você fez isso, sua idiota? - gemi, com a voz embargada. Encostei a cabeça em sua testa.

Chloë estava perdendo levemente a cor branca que havia conseguido nas últimas semanas. Meu estômago parecia afundar cada vez mais num abismo sem fim.

Ela deu um sorriso fraco, observando de modo grogue Paul estancando seu ferimento com a jaqueta.

– Se for pra eu morrer de novo... - Chloë sussurrou - que seja por um bom motivo... dessa vez.

Paul retirou algo da jaqueta que cobria Chloë. Um cartucho pontiagudo, ensanguentado.

– Nem pense em fazer isso... - beijei sua testa - não me deixe... fique acordada... olhe para mim...

– Ryan.. - murmurou Gail, atrás de mim - vou fazer um curativo nela... traga ela aqui...

Peguei Chloë no colo e a levei até onde, momentos antes, era a bancada da loja. Não tive coragem de olhar para o corpo inerte de Julia, que estava ali ao lado. A imagem dela esmagada contra a barra de ferro ainda estava em minha retina, e não me ajudava a ficar calmo, sentindo Chloë tremer em meus braços.

Todos do Comitê mantinham os olhos fixos em Bob, acompanhando apenas superficialmente o que ocorria ao redor deles.

– Vocês ficaram loucos - ouvi Bob dizer, enquanto Paul e Gail enrolavam a cintura de Chloë com uma atadura dos primeiros socorros - esses monstros vão dominar a Terra! Vão transformar todos em zumbis! Acham mesmo que vendo cinco zumbis diferentes dos outros, isso prova que essas coisas podem voltar à ser humanas?!

– Não custa tentar comprovar, Bob - Garret disse, sarcástico - assim como não parece custar para você usar sua vida miserável para matar as pessoas ao seu redor.

Vi a cabeça de Chloë fraquejar para a frente, enquanto sustentava suas costas.

– Chloë... ei, levante a cabeça... tente ficar acordada...

Chloë ergueu a cabeça um pouquinho, me olhando fracamente.

Percebi, surpreso, que ela não pareci mais estar em risco de uma nova morte.

Apesar de estar obviamente fraca, estava estranhamente lúcida, e parara de tremer. Em seu rosto, só podia se ver dor e irritação. Mais nada.

– Ryan... - Chloë murmurou - tá tudo... bem...

Senti meu corpo amolecer, aliviado.

– Ah, Chloë... - abracei-a, beijando seus cabelos negros. Olhei, por trás de seu ombro, Bob soltar a arma no chão, provavelmente ameaçado pelo Comitê.

– Ande, Bob - murmurou Garret, cutucando Bob com sua espingarda - vai ficar no caixa-forte da loja por enquanto... aí resolveremos o que fazer com os verdadeiro monstros que estão aqui...

Bob ergueu as mãos no alto e avançou em direção ao almoxarifado destruído ao nosso lado, com Garret mirando em suas costas. Eles passaram lentamente por nós.

Foi quando Bob se jogou contra mim.

– Ryan! - arfou Chloë da bancada,

Bob e eu rolamos pelo chão poeirento. Ele me acertou um soco tão forte que quase fiquei inconsciente. Tentei usar os braços para revidar e tira-lo de cima de mim, mas os cinco anos de incursões nas ruas pareciam ter feito Bob adquirir o peso e a força de um lutador de UFC. Ouvi as armas engatilhando-se outra vez.

– Não atirem! - berrou Garret - podem acertar Ryan!

Enxerguei a pancada que eu dei no nariz de Bob. O sangue espirrou em nós dois. Continuei procurando libertar meus braços, mas Bob me imobilizara no chão. Ouvi um barulho de algo se quebrando, e senti uma dor excruciante abaixo do joelho.

De repente, senti algo pesado atingir Bob e tira-lo de cima de mim.

Quando me levantei, arfando, com as mãos na perna, vi Chloë prendendo Bob ao chão.

– Chloë! - arfei.

Ela rosnava bestialmente, sem olha para mim, fincando as unhas no pulso de Bob, que berrava de dor. Sua perna estava enterrada no peito dele; podia ver o sangue escorrendo pelos braços de Bob. Chloë parecia enlouquecida; seus olhos prateados nunca pareceram tão assustadores e cruéis.

Pela primeira vez desde que a conheci, vi em Chloë a sombra de um verdadeiro zumbi, Um ser Irracional, com um único objetivo em sua mente.

Não pude impedi-la.

Nem quis, no fim das contas. A decisão foi dela, afinal.

Apenas virei o rosto quando ela atacou o rosto de Bob.

Não olhei para trás enquanto aconteceu.

Nem mesmo quando senti algo quente e líquido espirrar em minhas pernas.

Apenas olhei para os rostos aterrorizados ao meu redor e me certifiquei que Pim estivesse apavorada o suficiente para continuar com o rostinho enfiado na mão de Carl.


Voltando à ViverOnde histórias criam vida. Descubra agora