Aquário Negro

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Faz tempo desde a última vez que dormi uma noite em paz, não me recordo quando e nem quantos anos eu tinha, pois os últimos tempos em minha casa não foram os dos melhores. 

Olhei para a cama ao lado a procura de Luana e ela não estava mais lá, oque aconteceu com nosso combinado de quem acordar primeiro acordaria a outra? Por incrível que pareça, em apenas um dia eu já me sinto a vontade nessa casa. Saí do quarto e fui até o banheiro, lavei meu rosto e escovei os dentes. Me surpreendi ao me ver sorrindo para mim mesma em frente ao espelho, eu estava feliz. Voltei para o quarto e Luana já havia voltado.

- Bom dia! - Percebi que ela não estava mais de pijama, usava em vez disso um shots jeans e uma regata fininha. - Troque de roupa, vamos andar de bicicleta.

- Iremos a algum lugar específico? - perguntei enquanto remexia em minha mochila.

- Vou te mostrar um pouco da cidade em que eu cresci, depois passamos no McDonalds pra pegar um lanche.

Estava calor lá fora, vesti um shorts e uma camiseta, depois me perguntei se ainda sabia como andar de bicicleta, já fazia tantos anos... Peguei a bicicleta de Luana e ela foi com a da Tia Camerci - sim, já estamos nessas intimidades - subi e me reacostumei, Luana gargalhava enquanto eu tentava tirar o pé do chão. Depois de muito esforço consegui me equilibrar e saímos pela cidade.

A cidade de Luana me lembrava aquelas cidades do interior dos filmes, bem arrumadinha e sem muitos carros ou coisas espalhafantosas pelas ruas. Havia várias arvores e o ar era muito bom de respirar. Nós resolvemos apostar corrida, onde seria a 'chegada' não estava definido, na verdade era só pra ver quem andava na bicicleta mais rápido.

 Enquanto Luana estava na frente eu apenas a segui, tentando alcançá-la, e quando isso foi feito apenas fui em frente, eu não conhecia a cidade então nem sabia para onde estava indo. A adrenalina me dominou e só lembrei oque estava realmente fazendo quando Luana gritou "Cuidaado!" e eu me assustei, apertei o freio mas já não havia mais tempo. No chão estava eu, a bicicleta e um garoto.

- Vocês estão bem? - perguntou Luana. - Hã? Renato?

Me recuperei do susto e finalmente pude observar quem tinha sido minha vítima: um ser humano moreno, cabelos e olhos castanhos, agora com a roupa suja e alguns arranhões na cara.

- Luana, quanto tempo! - falou ele, esboçando um sorriso simpático. - sua amiga?

- Alana, minha amiga. - ela se voltou para mim. - Esse é Renato, meu ex-namorado.

Acenei, pedi desculpas e fiquei quieta. Os dois conversavam sobre o passado, não de um jeito triste, mas rindo de alguns fatos que aconteceram antes de Renato mudar de cidade e Luana ir para um colégio interno.

Alguns longos e eternos minutos se passaram até que nos livramos dele, fala demais! Subimos nas bicicletas e pedalamos para o McDonalds, compramos três lanches e voltamos para casa.

- Vocês demoraram - disse Tia Camerci. - Aconteceu alguma coisa?

- Primeiro resolvemos apostar corrida. - Luana sorriu o menos falso possível. - Depois a fila no McDonalds estava grande também.

Nos sentamos a mesa e comemos os lanches, sim, esse seria o nosso almoço de domingo. Nunca que minha mãe deixaria eu fazer algo como isso, mas não quero pensar nela. 

Lavei a louça e Luana secava e guardava, enquanto isso pensei no que poderíamos fazer até as 20 horas, antes que tivéssemos que voltar para a escola. Nós poderíamos sair, mas já fizemos isso ontem e, pelo menos eu, tenho um para me ajudar a pular o muro e outro quando eu quiser sair pela porta da frente. Enfim, pensar em algo que podemos fazer aqui e não lá.... filmes! É, não tínhamos TV no quarto e as únicas notícias que sabemos do mundo à fora são pelos jornais, aquilo - a escola - é tipo uma prisão.

Dei a ideia para Luana de ficarmos assistindo filmes até o último minuto, sairimos as 19h30 e tia Camerci nos levara de carro.

 Nos jogamos no sofá, com o notebook no colo e pipoca na mão passamos o resto de nossa tarde. Começamos com Vingadores - A Era de Ultron, depois Velozes e Furiosos 7 e para finalizar por causa do nosso tempo assistimos Smiley. Por sorte Luana tinha o mesmo gosto pra filmes que eu, já pensou se ela quisesse assistir Barbie, Moda e Magia?!

Pegamos nossas mochilas e com expressões nem um pouco agradáveis estávamos saindo pelo portão em direção ao carro.

- Por que as caras tristes? - perguntou tia Camerci. - Vocês não disseram que gostavam de lá?

- Claro que gostamos, mãe! - Luana exagerou um pouco. - Mas é claro que preferimos ficar em casa também...

De carro não demorava muito para chegar, infelizmente, em 20 minutos estávamos em frente ao portão de nossa cela.

- Sabe que estou fazendo isso pelo seu bem. - tia Camerci depositou um beijo na testa de Luana e depois veio até mim, fazendo o mesmo. - Se cuidem meninas.

Nos despedimos e entramos, nossas mochilas pesadas nas costas e poucas pessoas estavam de volta, entre eles Steven, que sorriu ao ver Luana. Luana hesitou um pouco, mas logo sorriu e foi falar com ele. 

Meu objetivo era continuar o caminho até o dormitório sem interrupções, mas na parede perto a porta principal estava Dante, que sorriu ao me ver. Fiquei surpresa por ele ter chegado cedo também, afinal, ele tinha saído?

- Que foi? - perguntei.

- Estava com saudades. - disse ele - Como foi seu fim de semana?

- Ótimo - sorri. - E o seu, foi visitar sua família?

- Sim. - para onde tinha ido o sorisso dele? - Que foi?

- Eu que te pergunto: Que foi? Você ficou triste de repente.

- Quem sabe um dia eu te conto?

- Você é cheio de mistérios. - revirei a cara. - Ah, por falar nisso... posso ver denovo aquele aquário negro que você esconde atrás da escola?

Dante começou a caminhar e eu o segui, já estava noite agora e não sei se consiguiriamos enxergar alguma coisa. Assim que ele puxou o objeto retangular do meio dos arbustos e tirou o pano, abri a boca surpresa. O negro do aquário havia se misturado com o escurecer da noite e as pintinhas amarelas de antes agora brilhavam, como vaga-lumes, mas vaga-lumes não podiam ser, pois não se mechiam.

- Com algumas coisas que aprendi no clube de Química e Física consegui desenvolver isso. - disse ele.

- É tão lindo!

- Você gostou? - assenti, ele observava meu rosto maravilhado. - Posso fazer um para você, mas em tamanho menor, é claro.

- Você faria mesmo?

- Todos querem o perfume das flores, mas poucos sujam as suas mãos para cultivá-las.- disse ele encarando o aquário.

- Nossa... - eu disse rindo. - de onde você tirou isso?

- Uma pessoa me disse.

- Quem?

- Seu nome começa com a letra 'A'

Apenas um único nome me veio a cabeça, quem mais podeira ser? Não falei mais nada, apenas sorri sem saber ao certo porquê. Juntos, voltamos para dentro da escola.

Augusto Cury nos disse para amar! [Completo]Onde histórias criam vida. Descubra agora