6- Sem esperanças. (REVISADO)

179 13 0
                                    


Sonhava com Areal, suas pequenas ruas entrecortadas por mercadinhos conhecidos, o povo sorridente e os parentes com os quais eu esbarrava em cada esquina. Eram tios que não acabava mais e primos aos milhares.

Uma brusca batida de porta rompe meu sono. Pulo da cama assustada com a possibilidade de ser Vicente de novo, mas não era. Notei Letícia encolhida em posição fetal choramingando baixinho de encontro ao travesseiro. Vi-me na mesma situação horas antes e não soube como reagir. Sem pensar ajoelhei do lado de sua cama e acariciei suas costas. É eu realmente estava virando amiga dessa menina.

- Let se aconteceu alguma coisa que você queira me contar fique a vontade- sussurrei.

Ela ergueu o olhar molhado para mim e seus olhos entristecidos responderam por si só. Era sério e só podia ter a ver com Pedro. Esse era o nome do anjinho que ela carregava em seu ventre alguns meses atrás.

- De vez em quando eu me sinto assim. Culpada. Eu fiz tanta coisa errada durante essa gravidez. Eu bebi, continuei a sair normalmente e ele não suportou mais viver dentro de uma mãe tão perturbadora- falou machucada e não me importei em tomar a liberdade de deitar junto a ela. Encolhi- me na beirada da cama e passei os braços em sua volta em forma de proteção.

- Você não estava preparada para ter este bebê.

 Sou péssima para conselhos. Minhas palavras só fizeram aumentar o choro e eu a abracei mais forte para conter minha culpa. Adormecemos assim e a sensação de estar em casa me alcançou. Inúmeras foram às vezes em que dormi desse jeito com minhas irmãs. E a culpa de me fazer sentir um pouquinho perto de casa era toda dela. Letícia.

***

Saí correndo desajeitada sobre o gramado verdinho da manhã em que finalmente começariam as aulas. Acabei por me atrasar dormindo demais, mas confesso que ressenti em voltar aqui. Ressenti em voltar ao prédio da faculdade em que tanto sonhara. Não. Coloquei na cabeça que preciso ocupar os  espaços  da minha vida entre o alojamento e a faculdade. Serpentei com os olhos o primeiro andar do prédio vistoso do meu curso e vi no canto direito, pendurado na parede, um grande mural com diversas folhas. Parei em frente ao mural, um tanto organizado por sinal típico de arquitetura, e observei as notificações.

"Cr da turma 2ª-2013" Uma listagem de nomes decorria o papel.

"Projeto desenvolvido pela faculdade será apresentado em Harvard." Uau. Também quero desenvolver projetos e levá-los a âmbito internacional. Sorri com a minha ideia no momento em que observei um papel colorido num cantinho do mural parecendo ter sido colocado ali há pouco tempo. Nele dizia:

"Oferta de estágio não remunerado para alunos iniciantes no curso de Arquitetura. Venha fazer parte da empresa Heim e adquira conhecimentos fundamentais para o seu aprimoramento na carreira."

Perfeito. Era exatamente o que eu precisava. Digitei o número exposto no anúncio no meu celular quando alguém resmungou ao meu lado.

- Merda!- Vicente exclamou dando um murro no mural de leve.

- Zangado?- ergui uma sobrancelha para ele em desafio.

- Imagina, só estou fazendo carinho na parede- acariciou o mural em provocação. Ele não ficava nada mal de cara amarrada juntamente de mais uma blusa da Tommy agora na cor vermelha. Esse cara era um tremendo mauricinho!

Segui seus olhos até o papel que o deixara irritado e logo percebi a razão. Eram as notas do semestre. Os Crs.

- Ops! Alguém ai deve ter financiado o governador para entrar na faculdade- não consegui conter o comentário. Era uma boa forma de rebater a insinuação das cotas. Ponto para mim!

Ilhas de IlusõesOnde histórias criam vida. Descubra agora