38- Melhor notícia.

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Vicente narrando:

- Você está me dizendo que eu vou ser avó? – minha mãe ignora a minha presença e foca em meu pai sentado em sua cadeira presidencial.

Dona Marisa sente cheiro de merda de longe. Dessa vez não foi diferente, ela adentrou pela sala sem ao menos lançar olhares para mim. Sabe que essas "mini-reuniões" em família sempre são para discutir alguma porcaria que eu fiz. Mas agora é diferente. Eu não sou mais um adolescente inconsequente e dependente judicialmente dos dois.

A prepotente loira é minha mãe. Em alguns aspectos somos bem parecidos. Já em outros, seu preconceito e manias me tiram do sério. Tantas foram às vezes que ela expulsou meus amigos da piscina da mansão. Com a desculpa de que estávamos zoneando a casa. Aposto que foi porque eram pobres e negros. Só de pensar nesse tipo de sentimento tenho vontade de socar alguém.

- A clínica me comunicou para buscar o exame. Vicente pretendia esconder o fato – a ruga no meio da testa do meu pai se intensifica.

Contar aos dois imperialistas que terão que incluir mais um herdeiro no testamento deve ser preocupante. Minha mãe provavelmente está fazendo seus casuais cálculos mentais em dólares de quanto mais uma criança pode custar a sua fortuna. Até hoje suspeito que ela tenha escolhido ter um filho só para não criar concorrentes ao próprio dinheiro. Já meu pai. Carrega aquele olhar acusador de quem acredita que vou falir a empresa quando ele morrer.

Caminho impaciente de um lado ao outro da sala.

- Nada adianta com esse menino! – ela lamenta.

Quando essa chatice vai acabar? Eu pago a porcaria de uma pensão a esse moleque e pronto. Ele tem sido o caos da minha vida ultimamente.

- Pelo menos a garota vem de boa família Vicente? – minha mãe outra vez.

Sei bem o que ela quer dizer com "boa família". Se eles tem dinheiro.

- Não. Ela deve ser classe média. Me deu um belo golpe do baú- e eu idiota caí.

Os dois arregalam os olhos, fazem uma cena melodramática e o máximo que posso fazer e fingir que me preocupo.

A verdade é que minha cabeça lateja de ressaca pedindo cama. A noite de ontem foi uma das piores da minha vida. A primeira vez em três anos que sinto abstinência. Tive vontade de subir o morro e comprar droga. Por tão pouco não peguei o carro e o fiz.

Essa falta de controle próprio conseguiu me deixar aterrorizado. Liguei para Mayara três vezes tentando ouvir a voz dela me acalmar. Nada. Por sorte, um amigo do prédio me pegou descendo para a garagem e me fez ir para a festa no seu apartamento.

Deixei-me embriagar de cachaça e cerveja o que apaziguou a pior necessidade que poderia ter. Droga.

É tudo culpa dela. Era o que conseguia pensar de forma egoísta.

Saio da Heim irritado e vejo o mar no final da rua. Obrigo meu corpo a se deslocar até lá e despenco na areia. O sol já está sumindo e as pessoas fazem um zunido insuportável ao voltarem para casa. Será que não existe mais resquício de paz nessa porcaria de selva?

Eu nunca quis ter filhos. Nunca quis ter a mesma mulher. Nunca deixei o controle sumir das mãos. Nunca quis sentir essa merda.

Caralho. Eu tinha esperança de que depois que ficasse com ela tudo iria normalizar. Daria alguns trocados para que voltasse para casa, como muitas vezes eu fiz e no outro dia partiria para a próxima. Experimentar vários fetiches, sabores. Ter o total livre arbítrio para escolher e definir o que eu queria ou não.

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