Capítulo 15

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— Daniela! — grito enquanto bato fortemente contra a porta.

Isto não pode estar a acontecer. Não pode. Não depois de tudo o que se passou.

— Acalma-te, Sheldon — diz-me o Zhao ao pôr-me a mão no ombro para me puxar para trás.

— Como posso ter calma? Fecharam-na aqui dentro! — Protesto mais enervado do que o que seria de esperar.

— Temos que ir antes que venha alguém — alerta-nos o Kevin.

Fazem-me sinal para voltar com eles lá para cima, mas recuso-me a sair daqui.

— Não te vamos deixar cá em baixo sozinho, mano — insistem.

— Temos que a tirar primeiro daqui — digo enquanto forço a porta abrir-se, mas é inútil. Está trancada.

— E se chamarmos a polícia? Têm que a tirar daí — sugere o Zhao.

— Achas? — respondo bruscamente. — Já tentámos isso antes e nunca resultou. Não era agora que iria funcionar.

A verdade é que a polícia nunca virá, pois há demasiadas queixas feitas por alunos da escola na brincadeira e isso fez-nos perder a credibilidade. Para além disso, o nosso motivo para ligar não faria o mínimo sentido; onde é que já se viu chamar a polícia porque uma aluna ficou fechada numa sala da escola? Nem devíamos estar aqui.

— Não há forma que não envolva chamarmos alguém para pedir ajuda — diz-me o Kevin, numa fracassada tentativa de me acalmar. — Não é propriamente fácil derrubar uma porta de madeira maciça e trancada.

— E agora? — Custa-me imenso que a culpa de ela estar ali tenha sido em parte minha. Ela não merece isto.

Subitamente, o medo de a perder envolve-me por completo e talvez seja maior ainda do que o sentimento de culpa. Há tanta coisa que não lhe contei e que podia ter contado. Agora vejo o quanto errei ao não confiar nela. Só a queria proteger, mas acabei por a entregar.

Ela não sabe tudo. Não sabe da história do homem da cave, do passado da escola antes de ser uma escola, nem do envolvimento da diretora nesta história toda.

Talvez me tenha precipitado ao pedir-lhe ajuda nisto, todavia a verdade é que sem ela ainda haveria muitas mais coisas que não saberíamos a respeito do lugar onde estamos.

Ela é uma peça crucial do mistério desta escola, e assim que a vi naquelas filmagens da câmara de segurança soube que, finalmente, estávamos perto do fim do jogo.

De tudo isto, o que mais me custa é que ela não faz ideia do quão importante é.

— Daniela! — Volto a gritar e a bater na porta.

— Será que foi ele que a trancou? — sugere o Zhao.

— Não faz sentido.

— Mano, só pode ser ele — insiste o Kevin.

— Há algo que não bate certo...

A resposta só pode estar naquela noite.

Um arrepio percorre-me todo o corpo ao recordar-me que ela só aceitou vir cá abaixo porque lhe pedi. Não me vou perdoar se aquele psicopata lhe fizer alguma coisa.

Tenho que me concentrar no que ela me disse; a aluna que desapareceu está cá em baixo e a pedir ajuda. Ela ajudou a Daniela a fugir, mas conseguiu fugir ela? Tudo aconteceu naquele dia do filme no pavilhão e foi justamente nessa noite que ela desapareceu.

— Foi ela, não foi? — pergunta-me o Kevin.

— Ela o quê?

— Que levaste lá naquele dia ao quarto.

— Que história é essa? — intervém o Zhao.

— Sim, foi ela — respondo-lhe. — Mas isso não importa agora. Ajudem-me a tirá-la daqui, que depois logo falamos disso.

— Ficaste com a chave? — pergunta-me o Kevin, e, subitamente, faz-se luz na minha cabeça.

— A chave, — digo para mim mesmo — é isso; a chave! — Ela deu-ma naquele dia em que dormiu no meu quarto, e eu deixei-a lá.

— Achas que vai dar? — pergunta-me o Kevin.

— Tem que dar. Deixem-me só ir buscá-la.

— Não me digas que a deixaste no quarto — repreende-me o Zhao.

— Já devias saber que se te apanharem estás feito — continua o Kevin.

— Dêem-me uns minutos — digo isto e corro até lá acima.

Quase tropeço num dos tapetes por culpa desta luz demasiado fraca, e deparo-me com a Mila lá em cima apoiada no corrimão das escadas. Os rapazes que cá estavam já devem ter ido embora, por isso ela ficou sozinha.

— Sheldon? — diz assim que me vê a subir. — A Daniela está bem?

— Mila, já falamos sobre isso. Deixa-me só ir levar uma coisa lá abaixo — digo, tentando acalmá-la.

— Prometes que está tudo bem? — pergunta-me, provavelmente já cheia de sono e a querer voltar para o quarto.

— Podes ficar descansada. — Dou-lhe a minha palavra. Não vale a pena deixá-la preocupada, principalmente a esta hora da noite.

Vou até ao nosso quarto e agarro na chave, que está ainda debaixo de uns cadernos.

Depois de a Mila voltar para o quarto delas e eu voltar a trancar a nossa porta, os corredores ficam vazios e eu corro até lá abaixo até me voltar a encontrar com eles.

— Não acredito que estamos a pôr tudo em risco só para a tirar daí — critica-me o Zhao com um tom de repreensão.

— Mesmo se ficássemos aqui mais umas horas, ninguém ia saber; a escola está vazia — respondo-lhe.

— Não deviam estar cá os empregados? — questiona.

— Segunda-feira nunca estão — responde-lhe o Kevin.

— Será que tem a ver com isto cá em baixo? — pergunto-lhes ao tirar as chaves do bolso.

— Realmente, faz sentido — murmura o Zhao.

Apresso-me a pôr a porra da chave na fechadura e, tal como esperávamos, a porta abre-se.

What the hell? Como é que sabias que ia abrir? — diz o Kevin, confuso.

Não lhe respondo e empurro a porta com toda a força possível.

São precisos apenas uns três segundos para eu perceber o que se está a passar e quase meio minuto para conseguir reagir. A Daniela salta da cama, assustada, e vem ter comigo a correr para me agarrar.

Uma confusão de sentimentos invade-me. Por um lado, surpresa por a ideia da chave ter, estranhamento, resultado; e por outro, a confusão pelo cenário com que nos deparamos.

Tal como esperávamos, é uma sala parecida com as dos hospitais, só que sem janelas, e ao centro está uma aluna ainda com o uniforme do último ano deitada numa cama de cirurgia, que assumo que seja a desaparecida.

O Zhao e o Kevin entram rapidamente e vão ver como está ela, e a Daniela abraça-me com mais força, deixando os cabelos cair sobre o meu ombro. Sem saber ainda como reagir a tua isto, decido tentar acalmá-la.

— Daniela — murmuro, enquanto lhe tiro os cabelos da cara. — Que se passou? — Tento soar calmo também, mas esta situação não tem nada de calma.

Os outros dois tentam acordar a jovem, mas ela não reage.

— Nunca mais me deixes sozinha — responde-me a soluçar com as mãos na cara e encosta-se ao meu ombro.

É a primeira vez que a sinto frágil e assustada. E ainda assim, não sei se sou eu que a estou a consolar, ou se é ela que me está a consolar a mim.


O Mistério do InternatoOnde histórias criam vida. Descubra agora