9.

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"I see the way you're acting like you're somebody else!"


Daniel e Ana


Ana não sabia onde estava, nem porque estava. Provavelmente nem em São Paulo estivesse mais, levando em consideração a quantidade de ônibus que havia pego... a única coisa que Ana sabia era que não se sentia bem. Muito pelo contrário, sentia-se como um lixo, jogado ao meio-fio sem qualquer consideração.

Sentou-se em um banco de madeira envernizado, que ficava de frente para um laguinho artificial, onde patos faziam barulho e batiam as suas asas. Ela tirou as botas e esfregou os pés cansados de tanto andar. O lugar estava quase deserto, com a exceção de alguns corajosos senhores que jogavam xadrez ali perto. Era muito tarde ou muito cedo, mas, definitivamente, não era horário para ninguém estar na rua.

Ana cruzou as pernas e deixou-se perder nas águas calmas do lago. Pensava no beijo de Bruno, nos comentários maldosos de Eduardo e Luíza, nos olhares que Daniel lançava à Rebecca e em todos aqueles sentimentos que se misturavam e se chocavam em sua cabeça.

Percebeu que os velhinhos que jogavam xadrez deixaram a distração do jogo de lado e agora estavam observando atentamente a jovem menina de maquiagem borrada e olhos perdidos.

Ela se virou de lado, dando as costas para os novos amigos, e fechou os olhos. Antes que pudesse se dar conta, lágrimas do tamanho de uvas desciam como cachoeira por suas bochechas e queixo. Caiam de qualquer jeito na blusa, no banco e até mesmo nas pernas; ela inclinou a cabeça e franziu a testa, deixando o choro sair livremente; estava cansada de ser submissa aos comentários de pessoas que nem a conheciam, cansada de se abater tanto pela opinião dos outros. Se pudesse escolher, seria forte como Rebecca, livre como Luíza e indiferente como Raquel, mas ela não podia escolher, e aquilo a afetava muito.

Depois que o choro cessou, Ana começou a rir, relembrando-se de sua mãe dizendo que o choro lavava a alma. Na época, o bordão parecia-lhe ridículo, mas, naquele momento, não era mais.

Quanto mais pensava em quão fraca era, mais a risada aumentava. Logo, Ana gargalhava. Decidiu-se por ir embora antes que os senhores chamassem a polícia, e calçou de volta as botas. Levantou-se e saiu da praça, a procura de um ponto de ônibus.

Ela ainda não sabia muito bem o quê, mas algo havia mudado.


XXX


Raquel acordou ao lado de Daniel, sentindo o pescoço latejar. Olhou de soslaio para o amigo, que também estava desperto e se espreguiçava, e lembrou-se da primeira vez em que botara os olhos naqueles cachinhos castanhos, em meio a um tornado de total desespero. Nunca iria esquecer o quanto Daniel fora importante e como os seus conselhos a ajudaram quando ela mais precisou. Era até difícil admitir que, naquele momento, ela sentia muita raiva do amigo.

- Bom dia – Daniel desejou ao perceber que a amiga também estava acordada. Raquel respondeu com um "bom dia" seco enquanto bocejava. – Ainda está brava comigo?

- Que pergunta idiota – Raquel respondeu, ajeitando a saia sob os joelhos ossudos –, é claro que eu ainda estou brava com você.

- Então acho que nós precisamos conversar – o guitarrista sugeriu, enfiando a mão entre os dedos entrelaçados da ruiva e completando. – Por favor?

Raquel bufou teatralmente, mas no fundo sabia que não existiria pecado no mundo que a faria ficar brava por mais de 10 minutos com Daniel Azevedo.

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