Capítulo 4 - Pequeno milagre

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Eu era muito nova quando tudo aconteceu.

Foi algo que nunca soube definir exatamente. Talvez por não lembrar com detalhes, já que era tão nova e que tinha tantas coisas para me lamentar.

Não recordava da sensação no seu inicio, só sei dizer que ela nunca foi boa durante toda a minha infância.

Eu era uma criança diferente e nada que eu fizesse poderia mudar aquilo.

Até porquê eu nem sabia como.

Um dia, como outro qualquer de aula, mudou a minha vida e a da minha família. Porém, o que eu não sabia é que mudaria algo muito maior que minha própria personalidade.

Eu tinha por volta de 8 anos e voltava da escola mais cedo por conta da indisposição que senti durante a aula de artes. Na Napean se uma criança simplesmente passasse mal, os diretores não a liberavam para casa sozinha. Eles chamavam um dos zeladores para se certificarem que a criança chegasse em casa sã e salva, quando os pais não podiam busca-las.

Naquele dia, a mulher mais querida dentre a equipe de zeladores, me levou até minha casa. Ela era baixa, com grandes olhos castanhos e usava roupas largas para esconder os quilos a mais que carregava.

A Sra.Melvin era encantadoramente carinhosa. Do tipo que seria uma ótima avó quando tivesse seus netos. Ela adorava estar cercada das crianças menores e sempre as tratava tão bem.

Lembro dela me deixando em frente a minha casa e que estranhei ver o carro da minha mãe estacionado em frete à área de carros. Ela deveria estar trabalhando naquela tarde. Até porque se ela estivesse em casa, não teria ligado para meu pai.

Apesar de ser bem pequena, pude pressentir que aquele simples ato tinha algo de errado. Minha mãe estava no lugar errado na hora errada. Porém, fiquei feliz, porque, apesar de sempre me dar melhor com meu pai do que com minha mãe, mães sempre sabem o que fazer, quando seus filhos não se sentem bem.

Entrei pé por pé em casa, já que meu estômago doía cada vez com mais força. E por mais que minhas pequenas e frágeis mãos pressionassem meu abdome, não diminuía em nada o desconforto.

A primeira coisa que me chamou atenção foi um casaco masculino jogado sobre as almofadas do sofá. Não lembrava do meu pai ter aquele casaco. E quando me aproximei e toquei o tecido lembrei que era do Sr.Ronoway.

Kevin Ronoway era o melhor amigo do meu pai. Eles trabalhavam juntos na micro empresa que abriram em sociedade. Ronoway era um homem simpático que frequentava a nossa casa e fazia parte da nossa família há muitos anos, já que morava sozinho na cidade.

Ele não tinha familiares em Toronto, então, passava mais tempo na nossa casa do que com o seu colega de quarto. O que sabíamos da sua vida é que ele havia deixado para trás uma mulher e um filho para tentar a sorte na cidade grande. Não sabíamos os motivos de ele ter tomado aquela decisão e, apesar do meu pai não concordar muito com a atitude dele, nunca o julgou por aquilo.

Com o passar do tempo o Sr. Ronoway nos contou que quando estivesse estável na firma e comprasse uma casa digna de uma família traria a esposa e o filho, porém, nunca o fez. A empresa rendeu muitos lucros a ponto do meu pai comprar nossa deslumbrante casa e pagar os estudos da minha mãe. Já o Sr.Ronoway não via os lucros da empresa como suficiente para trazer sua família.

Como ele era um homem bastante prestativo e agradável jamais imaginei que pudesse ser tão falso, pois, enquanto meu pai o tratava como um membro de sua família, ele o apunhalava pelas costas. Traição que jamais poderia ser feita por um homem de bem.

1- A Telepata_ PersuadidosOnde histórias criam vida. Descubra agora