Capítulo 17

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"Bar Cataratas Brasil. Avenida Carlos Gomes, 100B - Centro / Venham para cá, assinado, O PODEROSO GATÃO." – disse o Gordão em sua mensagem para os outros.

Pouco antes de chegarem ao bar eu me levantei para ir ao banheiro tirar uma água do joelho. Quando percebi que já estava distante da mesa resolvi me apressar antes que fosse tarde demais e eu mijasse por ali mesmo e próximo à uma mesa onde havia apenas mulheres sentadas se divertindo. Teria sido uma imensa vergonha.

Cheguei ao banheiro e lá tinha vários mictórios. O teto daquele lugar era tão alto que poderia estar numa altura equivalente a dois andares e seu chão era xadrez em branco e preto imitando um ambiente rockabilly. Como de costume, me dirigi ao último mictório.

Sempre bom descarregar o tanque quando se está muito apertado. É uma das melhores sensações do mundo com certeza. Alguns segundos depois de começar a urinar, escutei a porta se abrir e depois alguns passos lentos pela área das pias indo em direção a área dos mictórios – Big Chris Rock? – eu pensei, mas não, foi só um susto e ao invés do bem dotado que me intimidara no banheiro do Bar do Bahia em São Paulo, era apenas um rapaz que não parecia ser brasileiro. Ele era baixinho, pois devia ter por volta de um metro e sessenta de altura, já seu cabelo era na altura do ombro e em sua testa usava uma bandana preta. Sua pele era de um tom vermelho e ele até que se parecia com algum jogador de futebol que eu tenha visto durante alguma transmissão do Cerro Portenho ou Libertad, que são dois tradicionais times de futebol do Paraguai que às vezes disputam a Libertadores da América.

– Holla. Como estás? – disse ele daudando-me.

– Estoy bién.

– Estás a viajar por a cá?

– Sí! – Logo percebi que aquela era uma ótima oportunidade para colocar em prática a minha fluência em portunhol. – Viajo com mí amigos del trabalho.

– Que legal. Muito bacana mesmo – disse ele em um bom português. – Também falo a sua língua.

– Sim. Fiquei sabendo que por aqui muita gente fala ambas as línguas dos países da região.

– Pois é. Me chamo Edgard. Trabalho para a aduana paraguaia do lado de lá da ponte.

– Nossa. Sério? Trabalho com importações, inclusive com algumas cargas rodoviárias que passam pela sua aduana e pela aduana argentina antes de adentrar em território brasileiro. – Falei enquanto caminhávamos para as pias para então lavarmos as nossas mãos.

– Interessante. Vocês vieram às compras? Lá na aduana vendemos muita mercadoria não declarada que acaba apreendida. Passe por lá. Os preços são bem abaixo da tabela. Isso porque precisamos liberar espaço e apreender outras mercadorias não regularizadas. Esse é o nosso fluxo. – Completou com um largo sorriso no rosto.

– Saquei. Curti a ideia e tenho um amigo que a apreciará ainda mais. Vou avisá-lo.

Achei muito gentil da parte dele me avisar sobre um lugar onde poderíamos comprar algumas coisas a baixo custo normal e sem ir muito longe no território paraguaio.

– Até mais. – Me disse.

– Até! – Respondi.

Cheguei à mesa e todos já estavam lá. Começamos a rir das palhaçadas do Gordão que gesticulava para que os garçons pudessem ir atendê-lo, mas nenhum deles o enxergava, pois alguns dos retardados ainda estavam de pé e parados entre ele e um dos garçons que estava livre e de bobeira próximo a um balcão.

– Chega. Vou até lá falar com alguém. Precisamos pedir mais alguns copos e outras garrafas, pois agora temos mais gente e a cerveja não pode parar!

Enquanto ele se levantou, aproveitei para conversar com o César e o Dani que estavam mais próximos de mim para pergunta-los então sobre como foi o primeiro dia deles no lado paraguaio da fronteira.

– Cara – disse o Dani –, compramos algumas coisas legais, mas vamos ter problema com o espaço no carro quando voltarmos, pois provavelmente teremos de levar algumas coisas em nosso colos.

– Acredito que isso não seja um problema – respondi.

– E você não sabe, na volta para a Amplo nós vimos aquele velho louco, o Carlos e o seguimos.

– Não fale assim dele – disse o Fabiano interrompendo-o.

– Como não? – Bradou o Guto. – Aquele velho biruta. Nós desconfiamos dele e então fomos averiguar, assim acabamos nos deparando com os bonitinhos numa espécie de cassino ilegal.

– Ei, rapaz. Você não pode falar sobre essas coisas por aqui. Não alto desse jeito!

– Nossa. Mas o que aconteceu? – Perguntei.

Então o Tony me chamou para perto dele, pulei algumas cadeiras e ao seu lado ouvi tudo o que ele me contou sobre o que havia acontecido.

– Caralho, gente. Vocês são malucos. – Comentei após ouvi-lo.

Enquanto conversávamos, o Gordão terminava de pedir mais copos e bebidas para um garçom e, quando virou-se para voltar para a mesa se deparou com um rapaz que o observava.

– ¿Hola como estás? Él sólo habla español o portugués?

– Oi queridão. Só português! – Respondeu o Gordão.

– Não tem problema. Falo a sua língua com fluência e também sou ótimo em outras, pois sou poliglota.

– Que bacana. Está curtindo de viagem por aqui?

– Sim. A propósito meu nome é Ronald Garcia. Sou o chef de cozinha do melhor restaurante de La Paz, na Bolívia.

– Sério? Sou o Martín. Muito prazer, chef. Cara, estou sentindo o cheiro das suas mãos. Deve ter andado preparando algo muito bom.

– Sempre! Estou de passagem por Ciudad del Este para um evento em um restaurante, mas estou por aqui em Foz pelo fato de a hospedagem ser um pouco melhor.

– Muito legal. Estou viajando com os meus amigos do trabalho.

– Tem que aproveitar mesmo. Bem, pegue esse papel com o endereço do restaurante. Lá haverá a distribuição de grandes kits de degustação. Diga-os que o Ronald Garcia lhe deu isso para levar um dos brindes apetitosos.

– Nossa, você ganhou a minha amizade. Pode deixar que eu passo por lá. Preciso voltar para a mesa. Até mais meu querido. Ah, de agora em diante pode me chamar de Gordão!

– Até mais, Gordão.

Aquilo seria muito estranho para mim se eu estivesse junto, mas não para o Gordão sozinho, pois aquele era o mesmo homem que havia se apresentado para mim no banheiro como Edgard, o funcionário da aduana do Paraguai, o que não tem nenhuma ligação com a culinária boliviana de La Paz e o pior... Pela primeira vez o olfato do Gordão havia falhado, pois o que ele havia pegado com aquelas mãos pouco antes não era nada comestível ou com cheiro de fome...

Rumo ao ParaguaiOnde histórias criam vida. Descubra agora