Capítulo 20

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– Bom dia, molecada. Acordem preguiçosos... vão já registrar declarações de importação no sistema da receita federal. Tem mercante pra olhar, conhecimento de embarque para validar e embarques para aprovar.

– O quê? – todos acordaram juntos e gritando desesperados. Aquele era o Ricardo tentando nos acordar.

– Poxa, finalmente. Deveria ter tentado essa antes. Já estou acordado faz tempo. Gritei, fiz barulho e vocês não acordaram. Só me restava falar algo assim para não ter que ficar mais esperando vocês decidirem viver.

– Que susto, Ricardo. – disse o Guto – Não viajamos para cá a trabalho. E hoje é sexta. Sexta é dia de aprontar. Você está me entendendo?

– Engraçadinho. Bom vocês levantarem ou não vão aproveitar o dia. Já são quase meio dia.

– Que merda! – Resmunguei. – E por que não nos chamou antes?

– É como eu disse, Eduardo. Eu tentei e além disso essa é a terceira vez que volto aqui para chama-los.

– Tudo bem. Vamos nos levantar, tomar banho e sair que nem loucos daqui.

Corri para o banheiro aproveitando que os outros estavam distantes e o Dani ainda deitado. Desta forma eu não corria nenhum risco de ser prensado contra as paredes. Fechei a tampa do vaso sanitário, deixei minha roupa dobrada sobre ela e fui para o chuveiro.

Terminei e me vesti de pressa, pois a tarde daquele dia já estava se iniciando, então eu precisava liberar o banheiro o quanto antes para que os outros pudessem tomar seus banhos. Enxuguei-me e vesti a minha roupa. Selecionei uma bermuda de cor vinho, uma camiseta preta com uma estampa de crânio e calcei um tênis também preto. Me olhei no espelho para ajeitar o meu cabelo jogando-o para o lado direito. Às vezes sorrio em frente ao espelho. Me lembro de quando posicionei um espelho na sala de minha casa para copiar cada detalhe e então criar o Edu Paulista, jogador que eu criava para me representar nos jogos de futebol pelo PlayStation quando ainda tinha vida para dar atenção aos games.

Enfim no quarto, pronto e cheiroso. O Dani foi para o banho logo em seguida e no quarto entrara o velho Carlos para perguntar-nos se gostaríamos de comer algo antes de sair.

– Não. Não precisa se preocupar. Não queremos causar-lhe nenhum incômodo – respondeu-lhe o Gordão enquanto todos olhavam para ele assustados por presenciarem-no recusando comida.

– Imagina. Apesar de acharem que sou um lunático, até que gosto de vocês.

– Obrigado. Também gostamos de você, mas te achamos louco mesmo. Todos nós somos loucos. Não é legal ser normal. Mudando de assunto, você sabe pra que lado fica a Niagara Falls?

– Fica o quê?

– Niagara...

– Viagra?

– As cataratas, Carlos – falei interrompendo-os antes que o bate papo tomasse outras dimensões com zoeiras por parte dos outros pela dificuldade de entendimento do velho Carlos –, o gordo aqui acha que as cataratas daqui são as mesmas de lá do Canadá.

– Entendi. O parque das cataratas fica ao sul da cidade entre Foz e Puerto Iguazú, a cidade argentina da tríplice fronteira. O melhor lugar para assistir às quedas d'água é do Mirante da Garganta do Diabo. Caso queiram, outro lugar muito bonito para se assistir às quedas é de Salto Union, um ponto turístico de Puerto, mas para irem até lá, devem seguir pela Ponte Tancredo Neves e seguir pela Ruta Nacional 12 já em território argentino.

– Muito obrigado pelas informações, Carlos! – Agradeci.

– Por nada.

Nos preparamos para sair. O Fabiano e o Tony iam visitar um moto clube nos arredores de Ciudad del Este. O Ricardo aproveitou e pegou carona para atravessar a fronteira e ficar próximo ao hotel onde aconteceria o workshop sobre negócios internacionais e os planos do Mercosul. O trio parada dura entrou na zafira e foram em direção a ponte para fazerem mais compras. O Gordão e eu saímos caminhando pela primeira vez rumo ao Paraguai desde que chegamos em Foz na manhã do dia anterior. Quando chegamos à ponte me lembrei de um aviso do Lucas sobre atravessar a fronteira a pé que era perigoso em certos horários por conta do alto índice de roubos por ali. Tentei não pensar nisso, mas ficamos atentos às poucas coisas que levávamos com a gente: o celular em um bolso e no outro as nossas identidades com algumas notas de reais e outras notas de guaranis, moeda paraguaia. De frente para nós vinha caminhando um rapaz que ia em direção ao Brasil. Careca, pele clara e barba por fazer. Ele usava uma regata branca, uma bermuda camuflada e calçava sandálias croc daquelas que faziam lembrar a máscara do Jason dos filmes da série Sexta-feira 13. Quando chegou a poucos metros de nós, sacou uma faca esportiva em aço inoxidável daquelas utilizadas por assassinos e nos pediu que lhe déssemos tudo o que tínhamos em nossos bolsos. Como impulso deferi-lhe um soco no rosto que o fez largar a faca e cair no chão. O Gordão chutou sua faca para que caísse no rio enquanto o sujeito levantava-se e corria de volta para o lado paraguaio.

– Você está louco? – Gritou o Gordão. – Reagir a um assalto. Isso não se faz.

– Desculpa, cara. Eu sei, mas ninguém me rouba calçando uma sandália croc!

– E se ele estivesse de pés descalços ou calçando tênis?

– Aí ele poderia levar tudo e até me deixar só de cueca aqui mesmo, mas exijo respeito. Como ficaria a nossa moral se chegarmos em São Paulo para contar aos outros sobre a nossa viagem e no meio da conversa comentarmos que fomos roubados por um cara que calçava sandálias croc? Isso não admito!

– Você é um idiota, cara. Retardado!

– Eu sei. Nós somos, seu gordo. Mama eu.

– Se diz "vem mamar", tonto!

– Que seja!

Rumo ao ParaguaiOnde histórias criam vida. Descubra agora