Capítulo 33

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– Desculpe-me, señor, mas quem o agrediu na verdade, foi o meu amigo aqui. Eu nem me aproximei de você, compreende? Não atire em mim. É ele quem você quer matar. Exclusivamente ele...

– Você quer me foder, seu filho da puta?

– Não exatamente. Só queria te sacanear mesmo. – Respondi em intensa labuta para não rir por conta da expressão de desespero do Gordão.

O paraguaio apenas nos encarava. Eu enxergava o ódio em seus olhos e ele até tremia só de nos imaginar caídos com nossos corpos rotos por suas balas. Ele tinha ainda um semblante de que viria a fazer picadinho e nos enterrar por ali mesmo. Veio caminhando em nossa direção e parou a três passos de distância. Deixei de olhar diretamente em seus olhos, pois já me sentia morto só de vislumbrar as trevas em seu olhar. Ao meu lado o Gordão suava frio e resmungava mais preocupado em me agredir a suplicar pela sua própria vida ao paraguaio emputecido. Para a nossa sorte estávamos entrosados para situações semelhantes, mas que não envolviam uma arma de fogo em poder de um adversário:

– Briga de rua?

– Briga de rua! – Respondeu-me o Gordão.

– Bate e corre?

– Bate e corre!

Demos dois passos ligeiros em sua direção e executamos um movimento rápido e preciso direto nos olhos enraivecidos daquele homem. O Gordão atingindo o seu olho direito e eu, o esquerdo.

– Agora corra, seu magrelo miserável! – Me disse ele quando eu já estava quinze metros a sua frente.

– Anda logo, Gordo. Mais depressa. Depressa!

Quando ele me alcançou eu já estava na caminhonete. Coloquei a chave no contato e a girei. Pisei no acelerador um tanto forte demais para aquele primeiro momento. Saímos dali em arrancada. Fiz uma tremenda confusão com o câmbio da caminhonete que acabamos saindo em segunda marcha.

Pulando.

Parecíamos peões montados num touro até recuperamos a estabilidade e seguimos em frente.

– Nós somos fodas! Sinto-me em pleno vigor por ainda ter algum vestígio do elemento gordo em meu sangue. Eu...

Bang! Crack!

O Gordão mal concluiu sua frase quando repentinamente ouvimos o estampido de um disparo vindo da arma do paraguaio e em seguida, num intervalo quase imperceptível de apenas alguns centésimos, o som do vidro traseiro da caminhonete sendo estilhaçado pelo projétil.

– Pisa fundo, retardado!

E pisei como se afundar o acelerador fosse nos fazer percorrer muito mais rápido, mas na verdade cantamos pneu e saímos quase que na mesma velocidade.

Seguíamos por uma estrada que penetrava uma mata fechada nos arredores de San Estanislao. Viajamos por quase uma hora e dali a pouco tempo veríamos o sol nascer, aparecendo por de trás do Brasil, erguendo-se acima de nós em solo do Paraguai. Mais adiante deixamos de viajar rodeados por aquela mata para mergulharmos num imenso campo verdejante obscuro em meio ao negrume da noite. Um campo verdejante levemente iluminado pela lua que posava soberana a nos observar como se fossemos exclusivos para ela, e ela exclusiva para ser admirada por dois retardados. Retardados que viajavam adentrando cada vez mais naquele território em direção a capital guarani.

O Gordão enviou uma mensagem para o celular do Dani com o objetivo de descobrir a localização do trio parada dura.

– Agora vou apenas aguardar a resposta do Dani. Já passou da hora de abandonarmos esta caminhonete, Edu. Vamos voltar para a Zafira.

– Sim. Escapamos de uma encrenca daquelas nesta madrugada. Agredimos a morte e fugimos.

– Foi tenso, mas até que divertido. Veja – disse ele apontando seu dedo indicador para o retrovisor. – Este jogo de luzes sendo refletido. Tem uma viatura policial não muito atrás.

"Estamos dez minutos à frente de vocês. Já estamos no departamento de Cordillera. Encostamos logo a frente de uma placa indicando a direção de Luque e Assunsión". – Escreveu o Dani em sua mensagem para o Gordão.

– Estão parados esperando nossa chegada. Largamos este carro lá e então seguiremos com eles. Todos juntos.

– Quase todos!

– Sim, quase todos...

Logo avistamos uma placa indicando que o departamento de Cordillera já estava muito próximo e logo adentraríamos na jurisdição da cidade de Arroyos. Alguns minutos depois ouvimos um ruído ecoando atrás de nós naquela estrada. Sirene. Era uma sirene.

– E agora, o que faremos?

– Não sei, Gordão. Sinceramente não sei. Não posso simplesmente encostar. Não tenho os documentos do carro.

– Nem mesmo habilitação! Por que eu fui concordar com tudo isso? Por que estou aqui com você?

– Pare de chorar, seu peixe boi. Mudei de ideia. Vou encostar para não piorar a situação. Acho que tenho um plano.

– Você acha?

Assunção, alguns minutos mais cedo

– Holla.

– Alba! Poupe-me do seu espanhol.

– El Pelo. Me desculpe, señor. Em que posso lhe ser útil, querido Amado?

– Um dos meus vendedores foi agredido em San Estanislao.

– Amado, desculpe-me, mas nenhum dos meus homens tem ido até aquela Vila. Lhe garanto que nenhum agente federal pisa naquele lugar há dias...

– Sei que não foi um de seus homens. E sei quem foi!

– Que ótimo, señor. Passe-me todos os detalhes que antes de o dia amanhecer já o teremos capturado e plantado algo que o incrimine.

– Há um grupo de brasileiros, um grupinho de amiguinhos. São só garotos. Eles estão viajando pela região de Ciudad no eixo internacional da tríplice fronteira. Eles foram atrás de um de seus amigos, um idiota que ingeriu o elemento Z e outra coisa muito importante.

– Ordenarei imediatamente que os meus homens em Ciudad tomem as devidas providencias, Amado.

– Não acione seus homens em Ciudad. Alguns dos meus tentaram da pior forma despistá-los na via Supercarretera. A intenção era fazê-los desistirem da busca e voltar para Foz do Iguaçu, onde provavelmente estão hospedados, mas parece que dois deles não desistiram. Um gordo e um magro.

– E o señor faz ideia de onde possam estar agora?

– Saíram de San Estanislao num veículo que foi roubado na fronteira. Recebi uma ligação. Me disseram que um dos meus homens estava bêbado. Por isso havia sido deixado para trás. Que tinham deixado meios para que ele seguisse viagem, mas também me contaram que logo em seguida dois rapazes, um gordo e um magro foram pegá-lo. Não sei exatamente o que pensar sobre. Até pode ser que sejam aqueles dois, mas não creio que eles tenham culhão para tal façanha.

– Acredito que foi algum dos seus homens que efetuou o roubo, mas são estes dois manés que estão no veículo. Não precisaremos plantar nada. Basta estarem trafegando em meu país num veículo roubado.

– O veículo é uma caminhonete Ford F-1000. Cor vermelho.

– Tomarei providências assim que desligar, Amado.

– Garanta que irá tirar estes dois de circulação. A turminha dele já me atrapalhou muito nestas últimas vinte e quatro horas. Se não impedi-los, neste mês você não verá o seu pagamento e seu cargo no alto escalão será comprometido. Está me ouvindo?

– Sim, senõr. – Respondeu Alba engolindo em seco.

– Não falhe!


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