Capítulo 30

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  O resto da semana foi calma, nem parecia mais a semana que começou com uma amiga de quatro patas chamada Mel, e com seus sentimentos bagunçados e confusos.

  Já era sábado, Ana estava na cozinha com a receita de bolo aberta numa página da web, com ingredientes espalhados por toda a sua cozinha, com sua roupa que agora estava pintada de chocolate, e com o rosto de farinha.

  Parecia muito uma cena de filme, aquele filme que ela insistentemente dizia que tinha um péssimo diretor e um roteirista pior ainda, talvez ela achasse exagero, mas tinha que admitir que não entendia como tinha tanta farinha por todo canto. A nota mental mais importante daquele dia era não deixar o liquidificador com a tampa aberta, uma nota mental que ela só fez depois que voou massa de bolo pela pia.

  Ela não era o tipo de pessoa que deixava sua teimosia reinar, geralmente preferia os caminhos mais fáceis, mas naquele dia em especial queria fazer algo por si mesma, queria mostrar os dotes culinarios (que ainda não existe) para uma pessoa.

  Depois do que foram quase duas horas desde que entrou na cozinha, lá estava seu bolo com uma aparência aceitável e com uma cobertura que escorria pela assadeira.

  O orgulho que aquecia seu peito era indescritivel, finalmente estava aprendendo, finalmente estava de fato se esforçando. Os altos e baixos de sua vida eram uma montanha russa que muitas vezes ela não sabia lidar, sua desorganização, seus caminhos tortos e suas confusões eram seus companheiros desde muito cedo, mas no fundo ela só queria ser alguém que valesse a pena conhecer e ser amada.

  Enquanto secava seus cabelos lhe passou na cabeça novamente que os cabelos loiros não pareciam mais tão naturais quanto achava. Com um sorriso assustadoramente decidido, pegou uma sacola jogada no canto do quarto e saiu...

  Assim que a porta da padaria foi aberta por Tom, Ana não pode deixar de soltar um sorriso de satisfação ao ver as feições do homem se tornarem um misto de surpresa e encantamento. Ela via isso nos olhos dele. Via algo que nunca viu no rosto de mais ninguém.

  Os cabelos loiros platinados foram deixados de lado, agora Ana estava com a sua cor natural de cabelo, um loiro natural com as pontas mais claras na altura dos ombros em um chanel médio.

  Ela não estava com muita maquiagem, suas roupas estavam mais confortáveis do que apresentaveis, mas o que de fato chamaria a atenção de qualquer um era o brilho curioso nos olhos. Ela estava feliz.

  -Bom dia chefinho. Olha o que eu trouxe.- Ana ergueu a sacola na altura dos olhos de Tom, sua animação era evidente, e a cara de "não estou entendendo nada" no rosto do homem era igualmente evidente.

  -O que está acontecendo aqui?

  -Olha chefinho, fiz um bolo para seus alunos. Você vai dar aula hoje não vai? Então, olha o que eu fiz!

  Ela empurrou a sacola para Tom e entrou saltitante. Tom assentiu, ainda perdido e a seguiu. Ela se pôs atrás do balcão e começou a colocar avental. Nas últimas semanas descobriu que não há nada que uma boa xícara de café não resolva. Não há nada do que um toque de amor não resolva.

  Sua atenção estava na aguá que caia no filtro de café, com movimentos delicados e circulares deixava a aguá se misturar com o café. O amor que ela tem pelo café vai além do que aprendeu com Tom, vai até suas memórias doces dos dias em que acordava cedo e ficava vendo seu pai com todo o cuidado fazer o café mais delicioso que ela já provara.

  Um café com toque de amor. Esse era o segredo que seus pais queriam que ela aprendesse, que para as melhores coisas é necessário amor. É necessário dedicação e cuidado, como uma planta a ser regada se deve cuidar das pequenas felicidades como se fossem de fato palpáveis. Ela tinha que aprender a aceitar os dias felizes e outros nem tanto. 

  Talvez o caminho ainda nem tivesse um fim, mas não há de fato um final de trilha quando se busca seu lugar no mundo, não há como apenas ir atrás da felicidades, porque se apenas perseguir isso, descobrirá por fim que nunca foi feliz.

  Tengo miedo de nunca encontrar la felicidad... 

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