Capítulo 23

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  Tom parou bem atrás dela, e por um momento a respiração de Ana foi interrompida ansiando pelo próximo passo do homem de olhos escuros. Mas indo contra toda a linha de pensamentos dela, que giravam basicamente em torno de : ele vai me agarrar, ele vai me derrubar, ele vai sair correndo depois de me demitir, e aquela que ela julgava como preferida, ele olharia em seus olhos e diria o quanto ela é apaixonante.

  Ok, não faz sentido a última opção, Ana admitia, havia pensado demais com o ar em falta nos pulmões porque nem ao menos era apaixonada ou algo assim por ele, então por que queria a atenção daquele homem?

  Então, indo contra a linha de raciocinio (nada óbvio) de Ana, ele estreitou os olhos como se analisasse sua posição que naquele momento estava pendendo no ar, ela se apoiava em apenas uma perna, depositando o peso do corpo e tentando mante o equilibrio com os braços em aberto.

  Na televisão as pessoas mantinham o equilibrio com os braços abertos, mas nem isso a fazia ter muita desenvoltura julgando-se pela postura torta e seu olhos vidrados em Tom logo atrás dela.

  -Acho que tem algo errado aqui.

  -O que?- A voz de Ana saiu estrangulada, e junto com as palavras o ar foi solto, inundando o pulmão de alivio.

  -Você está torta. Seja lá que posição é essa, com certeza tá errada.

  -Com base no que afirma isso?

  -Com base em que você esta parecendo uma garça, misturada com cobra, com asa quebrada e dor de barriga.

  -Ioga tem animais?

  -Kung Fu sim.

  -Eu não sei Kung Fu.

  -Pelo visto ioga também não.

  -Estou me alongando, você também deveria fazer isso.

  -Não obrigado, não tenho idade para travar minha coluna. 

  -Ah qual é?

  -Não acho que você é boa em alongamentos. Nem em algumas outras coisas.

  Ana riu, e deixou que por poucos segundos seus olhos fossem capturados pelos olhos negros de Tom.

  Ela estava incrivelmente a vontade, e enquanto as horas passavam ela apenas queria que o tempo parasse, sua mente divagava pelos últimos dias ao lado dele e com isso a confusão se instalará, afinal como aquele homem tinha o efeito de a deixar leve, e a vontade, involuntariamente seu pensamento pousou em Dan,que até a pouco tempo era o único que transitava em sua vida.

  Os vários anos de amizade com Dan, para ser mais especifíca nove anos, a fizeram consciente da presença relativamente importante dele na vida dela, e os altos e baixos de sua vida de comedia de filme barato á fez muitas vezes duvidar de uma reviravolta digna de fiilme, e por muito tempo mesmo sua família se resumia a Dan, seu melhor amigo, e talvez essa fosse a hora de admitir á si mesmo que ele também era seu primeiro amor.

  Quem havia colocado tantos obstáculos no caminho dos dois certamente sabia o que estava fazendo, a reviravolta da menina rebelde para uma pessoa que trabalhava para se sustentar foi o grande fator que culminou em um obstáculo enorme entre os dois, pois o trabalho de Ana não era exatamente tradicional, nem mesmo ela tinha orgulho do caminho que havia tomado.

  Um menino rico e bonito como Dan tinha tudo para ser feliz e bem-sucedido, e caminhos para escolher, oportunidades que ela de modo algum queria interferir. Portanto o deixou livre para seguir seu próprio rumo, ainda que ele estivesse ao seu lado no maior parte do tempo que ele dispunha, ela se sentia culpada por estar entre Dan e Eliza, sendo um dos grandes fatores para os dois não se aproximarem.

  Não se aproximar... Olhou mais uma vez para Tom e ficou imaginando em que tipo de comédia ela havia se tornado, e em que raio de filme barato era sua vida. Final feliz ou trágico para essa mocinha?

  Não perca nos próximos episódios...

    A campainha tocou a tirando de seus devaneios, e a despertando para a imagem do homem tentando sair de fininho de sua casa, e de Dan olhando de forma estranha através de uma pequena abertura da porta.

  Ana suspirou. E se ela já se considerava confusa agora então se sentia no olho do furacão, os olhos de Dan ainda sobre ela, e seu olhar num misto de raiva e algo mais, fizeram seu estomâgo revirar, e por um momento ela desejou que um buraco se abrisse sob seus pés e a sugasse.

  Depois de esperar e concluir que nada aconteceria, encarou os fatos, ela tinha acabado de dar um motivo de um metro e oitenta para Dan concluir que ela seguia sua vida livremente.

  Mas não era isso que de fato ela queria passar, nem sabia se realmente estava pronta para seguir em frente, quanto dira aceitar o casamento dele com outra.

  Deixou Tom sair, com uma clara cara sem graça, então encarou Dan.

  Ficou observando os olhos azuis dele até se dar conta de que não sabia lidar com ele, nem com a expressão indecifrável, nem com o crispar de lábios. Não sabia o que fazer. Nem sabia se devia se explicar ou deixar ele dizer por que estava ali.

  Então por longos minutos os dois ficaram se encarando em silêncio. Ana se deu conta de que a situação estava realmente fora do controle, Tom foi embora achando que ela tinha algo com Dan, e este por sua vez a encarava ofendido. Mas afinal, o que estava acontecendo ali?

  -Trouxe pizza para você.-Dan disse com uma voz sem humor, seus olhos vidrados em Ana, e uma mão estendida em sua direção. Como ela não reparou naquela caixa nas mãos dele?

  -Que bom. Já estava achando que sua saga de me alimentar havia acabado.-Ana tentou ser o mais convincente possível, mas não conseguiu evitar o tom estrangulado que saiu a sua voz.

  -Acho que não estou preparado para me separar de você.

  Ana o encarou firmemente, a hesitação a deixava pregada em seu lugar, mas quando os olhares se encontrou ela não sentiu as borboletas no estomago que sentia antes, nem se sentiu nervosa ou em expectativa, apenas sentiu afeição. Concluiu que estava começando a aceitar a ideia de que o perdera. Enfim, o perdera.

  Ele por sua vez parecia preso em seus próprios pensamentos, não pareceu sentir a caixa sendo tomada de suas mãos e levada 'para a cozinha.

  Ana Júlia serviu as pizzas frias em dois pratos, e com uma cutucada que em sua cabeça seria delicada fez Dan despertar de seus devaneios.

  -Hora de comer !-Ana fez uma voz entusiasmada.

  -Só com comida para te fazer feliz mesmo.-Dan sorriu, mas havia algo em seu tom de voz.

  Não era só com comida que ela se sentia feliz, já fazia alguns dias que ela conseguia ser feliz com pessoas também, e com sensações novas de descobertas. Guardou todos os pensamentos em uma gaveta de sua mente e se concentrou naquele momento, deixaria para analisar o que todas as mudanças significavam mais para frente. De preferência quando não tivesse outra alternativa além de se deixar confrontar. 

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