-Beck?- Ana estava incredula ao encarar a figura da mulher de cabelos azuis em sua porta.
-Oi Ana, posso entrar?
Ana assentiu dando espaço para ela entrar. Ainda sem reação a loira conduziu a outra mulher para o sofá, perguntou por educação se a mulher gostaria de beber algo, e ficou grata pela resposta negativa. A verdade é que seus pensamentos tinham dado um nó e ela não conseguiria fazer nada direito, acreditava até na possibilidade de queimar a água mesmo sabendo que era impossível. Mas se tratava de Ana Júlia, se tratando dela as coisas mais confusas aconteciam.
-Aconteceu alguma coisa?- A pergunta de Beck deixou Ana desconcertada, quem deveria estar perguntando isso era ela.
-Não sei ao certo, me diz você... Aconteceu algo?
-Aconteceu, as coisas parecem estranhamente tristes sem você na padaria, o que é estranho demais se considerar que você nem ficou tanto tempo assim.
Ana levantou os olhos, mas a única coisa em que ela pensava era " E Tomas?" , ela queria saber desesperadamente como ele estava, o que aconteceu nesses meses foras, e se ele sentia a falta dela tanto quanto ela a dele. Não perguntou. Refreou seus pensamentos antes que eles criassem voz própria.
-Eu também sinto a falta de vocês...
-Então por que não volta?
-É complicado.
-É complicado o que? Admitir que você é apaixonada por Tom, ou considerar a ideia que ele também te ama?
-Ele não me ama.- Ana baixou os olhos para o chão tentando segurar as lágrimas que se formavam.
-E como pode ter tanta certeza? Ele disse isso?
-Não, mas eu sei.
-Se você não pergunta a resposta sempre será não, então o não você já tem só falta buscar o sim.
-Não é tão fácil...
-O que não é tão fácil é lidar com dois cabeças duras como vocês. Tom passou esses últimos meses como um fantasma vagando pela padaria, seus pais praticamente acampam na padaria vigiando ele, nós simplesmente sentimos o clima pesado. O problema de vocês é que são lerdos demais. Simplesmente admitam o que sinta e protagonizem aquelas cenas melosas e sentimentais de casais apaixonados.
Ana deu uma risada sem humor, era dolorido, parecia que alguém estava cutucando sua ferida e isso era horrível. Mais horrível ainda era não conseguir acreditar que realmente aquele homem a amava.
Dentre todas as pessoas imagináveis, e as inimagináveis também, Beck era a última pessoa que Ana esperava receber em sua casa depois de tantos meses.
No fundo queria que fosse Tomas. Mais fundo ainda queria não ter tanta esperança.
Segurou a vontade de chorar, e tentou não ser mal-educada nem grossa, queria que ela fosse embora, mas uma parte de Ana, uma parte que ela odiava admitir ser grande, queria saber sobre aquele homem.
-Pode perguntar boneca de porcelana. Eu respondo. Manda a ver.- Beck deu um sorriso irônico como se tivesse lido cada pensamento dela.
-Eu só queria saber se sentiram minha falta mesmo, não sei...-Ana baixou os olhos para o chão, não queria dizer que só precisava saber de uma pessoa.
-TODOS sentiram.
Ana assentiu, distraída pousou os olhos no relógio de pulso de Beck e viu que quase uma hora já tinha se passado, e parecia que nada tinha sido dito.
-Eu estou ocupada agora Beck, se me der licença...
-Está tentando fugir de mim?
-Não exatamente, eu tenho compromisso para hoje a noite. Não posso perder de jeito nenhum. È caso de vida ou morte.
-O que é?
-Preciso ir para o aeroporto antes que aquele avião decole. Mas antes de você ir embora quero que entregue algo a Tomas...
Ana foi até o quarto e voltou com uma caixa nas mãos, se sentou no sofá segurando a caixa como se sua vida dependesse disso. Olhou da caixa para a mulher em sua frente e depois estendeu relutante. Ela precisava que aquela caixa chegasse até Tomas, mas sabia que lhe faltava coragem. Já haviam se passado três meses, e ainda sim parecia tudo recente demais.
Com pesar no olhar, viu sua caixa contendo os mais profundos sentimentos indo embora com a mulher de cabelo azul. Se sentiu vazia. Se sentiu aliviada. Se sentiu desesperada quando olhou novamente para o relógio e viu que estava atrasada.
Então era isso... Encarando seu amigo ela se sentia muito estranha. Sentia como se uma parte dela estivesse indo com ele. De fato estava, depois de quase dez anos juntos, ele estava indo para um lugar em que ela não o acompanharia. Era o final de uma etapa e o começo de outro, ela repetia isso várias vezes em sua cabeça enquanto tentava não chorar.
Seu rosto branco estava vermelho, seus olhos idem. Mas havia sorrisos naqueles dois rostos. Dan parecia leve, parecia mais jovem, depois de todos esses anos ele estava fazendo algo por ele, ela sabia que esse era o certo, deixar que o cordão fosse cortado para sempre e que os caminhos fossem seguidos separadamente. Então por que ela queria grudar nas pernas dele e pedir para ficar?
Ela estava com medo, nitidamente apavorada em ficar sozinha. Era mais um adeus que ela estava dando, um adeus menos traumático mas ainda sim um adeus. Mesmo assim, sustentava fortemente um sorriso encorajador.
Dan a envolveu em seus braços, Ana se apertou um pouco mais no abraço, em algum lugar uma voz distante anunciava o voo. Era pouco mais de dez horas da noite, ela não queria deixar ele ir, tinha comprado uma passagem só para estender um pouco mais o tempo com ele. E nessas horas enquanto esperavam a hora do embarque conversaram sobre besteiras quaisquer, não importava o que, nem onde, nem o lugar, eles definitivamente sempre seriam os dois velhos e grandes amigos de sempre.
Ele se soltou de Ana e caminhou em direção ao portão de embarque enquanto el ficava para trás. Ana se virou para ir embora, mas assim que olhou para trás viu um rosto muito conhecido do qual ela sentiu muita falta...
-Tomas?
-Sou eu.- Um sorriso tímido surgiu em seus lábios.
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ENTRELAÇADOS
RomanceAna Júlia, Aninha ou apenas Anaju,uma mesma mulher em muitas formas. Aos 17 anos sua vida mudou drasticamente com o acidente que matou seus pais. E sua esperança. Aos vinte quatro anos sua vida caminhava da forma mais confusa possível, sua camin...