Capitulo Nove

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             Victoria

Encarava os flocos de neve girarem devagar e caírem macios sobre o chão, agora branco, do jardim.
Suspirei e a vidraça da janela, onde meu rosto estava colado, ficou embaçada. Desenhei um coração com o dedo nela e a voz do meu pai me despertou.

- Está apaixonada meu peixinho? - revirei os olhos ao ouvi-lo me chamar pelo apelido que ele mesmo me deu quando eu era criança.

Pescaria era o hobby que ele mais amava e sempre me levava com ele, porque eu adorava e minha mãe ficava louca com isso. Eu vivia imitando a boca dos peixes que ele pescava e chorava até fazê-lo mergulhar no rio junto comigo todas as vezes que íamos pescar juntos. E daí nasceu o apelido que ele me chamava até hoje.

- Pai... - murmurei envergonhada e ele sentou do meu lado, afagando meus cabelos.

- O quê?

- Não estou apaixonada... - murmurei tentando me convencer disso também.

Ele riu, fazendo seu bigode tremer.

- Como se eu não te conhecesse. - encarei seus olhos castanhos e toquei seu rosto. - Você nunca conseguiu disfarçar sentimentos, Vic. Quer falar sobre isso? Quem é o sortudo que conquistou esse coraçãozinho aqui? - riu da minha cara de tédio.

- Não tem ninguém, pai. Já falei. - baixei a cabeça e senti seu beijo em meu cabelo.

- Tudo bem. Não quer falar...
Abracei ele apertado. Ficando escondida no seu peito. O lugar onde eu sempre me senti protegida. Desde criança, quando acordava assustada por causa dos "monstros" embaixo da cama, e ele me abraçava, e me deixava ficar quietinha ali.

E agora eu me escondia ali com medo desse sentimento novo, que não era tanto um monstro mas me assustava tanto quanto um.
Nathan andava me confundindo pra valer.
Ao mesmo tempo que eu tinha vontade de me jogar nos braços dele, alguma coisa me prendia e não me deixava fazer isso. Talvez fosse por causa da sensação de que ele escondia algo de que eu não gostaria muito se soubesse.

Inspirei o cheiro da colônia do meu pai. Ainda era a mesma desde que eu nasci.
Lembro de uma vez ter perguntado o por quê dele não trocar de perfume e ele me respondeu que, não podia para eu não confundir o seu cheiro. Realmente, seu cheiro era único.
A voz animada da minha mãe nos tirou do nosso momento.

- Estamos carentes hoje, é isso? - meu pai olhou pra ela sorrindo e seus olhos ainda brilhavam como antes.

Observei ela deixar seu casaco molhado de neve e seu gorro em cima da poltrona, e se aproximou de nós, prendendo a gente num abraço macio que só ela sabia dar.

Eu estava me sentindo com cinco anos de idade outra vez. Quando a gente ficava enroladinho um no outro, embaixo do cobertor, vendo a neve caindo lá fora enquanto assistia algum filme sobre o Natal, que sempre passava na TV.

- Eu amo tanto vocês... - murmurei me sentindo aquecida, com os dois ao meu lado.

Minha mãe riu, inspirando no meu pescoço, e meu pai deixou um beijo demorado em meus cabelos. E eu tinha certeza que ele estava de olhos fechados, fazendo sua prece de agradecimento por esse momento juntos. Ele sempre fazia isso.

Minha mãe levantou alguns minutos depois, lembrando que tinha uma ceia pra preparar e me deixou com o meu pai. Nós dois jogados no sofá. Acabamos pegando no sono, em meio a cobertores quentinhos e sussurros na TV esquecida ligada.

Acordei algumas horas depois. As luzes da árvore na sala já estavam acesas e a TV agora desligada. Sentei olhando pela janela e não consegui enxergar muita coisa além de luzes ofuscantes da decoração natalina por toda a rua coberta de neve e um carro preto estacionado perto do meio fio.

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