- Pessoal temos de fazer pouco barulho está bem?- pedi ainda um pouco eufórica pela quantidade de pessoas que se encontravam no meu quarto.
Ocasionalmente, vieram todas com presentes e carinhos para mim. E em círculo cumprimentei todas uma a uma, deixando Chad para último onde o abracei. E assim ficamos. Todos a conversar mas eu e ele na nossa bolha especial a olhar um para o outro e um pouco ausentes do grupo em que nos encontrávamos.Foi entrando mais gente e ocupando os diversos lugares vazios que o quarto ainda tinha. O chão alcatifado parecia ser confortável porque rapidamente se sentaram e começaram a conviver.
Havia comida também. Em cima da secretária , da mesa ao canto e da mesa de cabeceira.
Falámos de coisas ocasionais até que alguém veio bater à porta.- Eu avisei-vos que tínhamos de fazer pouco barulho!- quase gritei e fui abrir para dar de caras com o meu avô. Todos fingiram dormir numa respiração alta onde contavam "1,2,3..." - Subtil.
Depois peguei numa caixa. Era de Chad e tinha vários papéis numa mistura confusa com pétalas de rosa. "Melhor sorriso", "Minha miúda", "A mais bonita".
E eu puxei Peter e abracei-me a ele. Chorei nesse momento e tudo à volta ficou desfocado.
- Isto não é real! Nada disto é real!- entre soluços compulsivos disse. E ele sem reação apenas me tocava ao de leve como se tivesse sido apanhado no meio daquela espiral.- Eu quero ficar aqui, aqui gostam de mim! Deixa-me ficar aqui por favor!
Inspira. Expira. Inspira. Expira.
Os estores encontram-se iluminados pela luz proveniente lá de fora e já é dia. Puxo as minhas mãos para perto dos joelhos porque elas tremem, imenso.
Foi só um sonho, não acredito que foi só um sonho. Encolhi-me.
Só quero voltar a sonhar, por favor.Mas tenho um mundo lá fora para enfrentar e preciso de saber como está Anne. Preciso de estudar para "Arte da Performance", preciso de acabar o resumo de "Estudos Filmicos ", preciso de ligar aos meus pais, preciso de saber como estão os meus amigos...
Amigos... Inês fora a única com quem mantivera contacto constante. Guilherme e João ainda me falam por vezes mas de certo modo sinto que fui um pouco abandonada por todos quando cheguei aqui. Só porque estou longe. Só porque já não pertenço aparentemente ao mesmo lugar físico que partilham. Acho ridículo.
E sei que não deveria ficar afetada , no entanto fico. E não consigo mudar isso com a facilidade que gostaria.Tomo um banho rápido, deixando a água quente correr pelo meu corpo e agarrando o chuveiro por momentos.
Devia ir à sala hoje para tirar alguma coisa minha que tenha lá ficado. Maria é uma rapariga simpática mas de certo modo não consigo confiar nela a 100%. E posso ter deixado lá algum pertence demasiado pessoal que pode ser encontrado por ela. Ou por ele.
Ele que não cumpriu as minhas expectativas. Estou tão desiludida que me dói por dentro. Mas mais uma vez a culpa é só minha porque espero demasiado das pessoas. Espero que vá ocupar um lugar central na vida de quem apenas me põe na periferia das opções. E eu, vou-me acumudando a essa posição porque sei que não consigo melhorar a minha personalidade. Eu já tentei tantas vezes ser melhor só para não se irem embora. E nunca, nunca consegui. E agora estou um pouco cansada disso.
Visto-me e vou a cozinha onde Troy se encontra com um ar completamente desgastado. As olheiras marcam bem as feições faciais, o cabelo está despenteado e aposto que ainda não tomou banho. À sua frente tem uma garrafa de água que parece que foi vagamente tocada e eu aposto que não come bem há dias.
Quero abraçá-lo mas por outro lado tenho medo que necessite do seu espaço.- Bom dia...- sussurro enquanto entro e finalmente olha na minha direcção. Sou presenteada com um sorriso fraco e aceito-o sem contestar. Parte-me o coração.
- Ela vai ter alta hoje...- diz-me, enquanto o seu olhar se perde no rótulo.- Vou buscá-la depois do almoço.
- Eu vou contigo...- digo, tirando um iogurte e colocando o pão na torradeira.- Só tenho agora uma aula de manhã.
Ele acena e eu tiro as torradas e barro-as com doce de morango que eu sei ele gosta. Coloco-as a frente dele e dou-lhe um suave beijo na cabeça.
- Mary eu não...
- Por favor. Tu não comes nada de jeito há dias.- pedi, enquanto colocava duas para mim. Este suspirou e eu sentei-me e apertei a sua mão enquanto Peter e Megan entravam sonolentos pela cozinha a dentro.
Parece que todos nesta casa perdemos a energia.
Megan encontra-se num farrapo, com o pijama a cobrir o seu corpo que caminha a passos pequenos, sob o impulso da mão de Peter.Ambos sorriram e desejaram os bons dias enquanto tiravam alguma coisa para comer. A cumplicidade de ambos parece ter aumentado mas depois falo com Peter sobre isso. Numa altura mais calma.
- Até logo.- disse, quando acabei de comer e peguei na mala para sair para a faculdade.
Nenhum deles me respondeu e eu concentrei-me em chegar rapidamente à sala para puder ir para a aula em seguida, e por fim ir buscar Anne que necessita de mim de certeza.
O frio era imenso, é sempre imenso mas começo a senti-lo a passar as roupas e entrar-me diretamente no corpo. Sei que vou ficar doente, é uma certeza mas não tenho roupa mais quente cá. Talvez esteja na altura de fazer umas compras. Ou nas férias de Natal ir a casa.
- Bom dia.- disse ao porteiro e este acenou-me, deixando-me passar em seguida. Acelerei o passo até à sala porque sei que em seguida os corredores vão estar amontoados de estudantes.
Alguns olhares foram trocados como sempre é costume. As pessoas têm uma grande curiosidade pelas outras e por vezes pergunto-me o que se passará na sua cabeça quando olham para mim. Será que adivinham as minhas verdadeiras emoções por trás da imagem que deixo transparecer? E se adivinharem, será que se identificam ?
Entrei na sala, e fechei a porta de rompante, hábito que ganhei pelo medo que este local seja descoberto.
Caminhei até ao canto onde retirei um casaco que tinha cá ficado e detive-me por momentos a olhar para o sofá. A pensar no quanto eu gostei daquele momento que vivemos.Levantei-me deixando o ardor que se encontrava no meu peito um pouco de parte e olho rapidamente para a porta quando esta tenta ser aberta.
O meu primeiro instinto é baixar-me mas os músculos congelam. E quando Chad entra com um ar de descontração improvável eu quero sair dali a correr.
-Mary...- sussurra enquanto a última sílaba fica pressa na garganta. Não imaginava vê-lo aqui a esta hora e quero perguntar onde está Maria... mas não o faço. Controlo a minha raiva por momentos... e espero enquanto ele caminha na minha direção e pára a poucos centímetros do meu corpo.
Está demasiado perto.
- Eu já estava de saída...- afirmo enquanto tento esquivar-me para a direita , movimento que me custa porque o meu coração está a ficar acelerado.
- Não...- responde e agarra-me no braço.- Espera.
Olhando na sua íris sei que estou apaixonada. Porque são os mesmos olhos que me olham, de noite, antes de ir dormir. São olhos de carinho. São os olhos mais bonitos para mim.
E os lábios mais apetecíveis. Antes de puder sequer pensar em tudo o que daria para o beijar, já o seu corpo se aproximou do meu e aqueles lábios se colaram aos meus. Com paixão eu espero.
Porque eu não sinto nada mais, nada menos do que paixão por ele.
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Identidade Perdida.
Teen FictionQuando Mary é forçada a fazer uma mudança, tudo o que parecia certo na sua vida deixa de existir. Os amigos que conhecia, a casa que frequentava, a família que tinha e ainda por cima, é o primeiro ano de faculdade não só numa cidade mas num país dif...