A Borboleta que...7

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   Pensei que só existissem bodas de prata e de ouro, mas de repente descubro que tem festa pra todos os gostos: um ano, bodas de algodão; dois anos, de papel; três, trigo; quatro, cera; e por aí vai. Quem me deu essa preciosa lição de cultura inútil foi a Leninha. Os pais dela estavam completando 15 anos de casamento e iam comemorar, na sexta à noite, bodas de cristal. Quando ela me convidou para a festa, eu me lembrei do terrível jantar no restaurante Terraço, aonde fomos pra dar um flagra no meu pai e acabamos, quer dizer, eu acabei pegando o pai da Leninha com uma perua siliconada. Será que com a amante ele também comemorava bodas?


Falei que aniversário de casamento é coisa para a segunda idade, quase terceira, e além do mais eu tinha combinado de sair com a minha avó. Leninha reconheceu que a festa não era para o nosso bico, mas justamente por isso tinha convidado alguns amigos - única maneira de não se sentir descolada.


Opa! Por acaso eu ouvi a palavra...amigos? Na semana anterior, tivemos uma revisão sobre o emprego dos substantivos. A professora Clarice fez um protesto emocionado contra o machismo da nossa gramática, lembrando que quando um substantivo plural se refere a dois gêneros diferentes, prevalece o masculino. Supondo que Leninha conhecia essa regra, concluí que entre os convidados tinha haver pelo menos um garoto.


A gente estava na cantina da escola, dividindo o resto de uma Coca. Quando comecei a mastigar o canudinho, Leninha reparou na minha aflição e parou de fazer suspense. É claro que o Guto aparecia na lista - ele e o Júnior eram os substantivos masculinos. Fiz sobrancelha de intrigada: "O Júnior? Eu não sabia que você estava a fim...". Ela me disse que não era nada disso. Acontece que a mãe dela tinha ido ao salão da Salete pra depilar a virilha e, contando sobre a festa, deixou escapar que a filha chamaria "uns coleguinhas". Resultado: foi obrigada a convidar o Júnior.


A presença do Guto (pelo menos, na lista) mudou a minha opinião sobre a festa. Pensando bem, seria ma ótima oportunidade de antecipar o namoro, que, pelo meus cálculos, só deveria começar no dia seguinte, sábado, dentro do cinema, no meio de uma cena noturna de O Androide Exterminador. Pra ganhar essas 24 horas, eu seria capaz de qualquer sacrifício, inclusive cumprimentar os pais da Leninha e desejar ao casal mais 15 anos de completa felicidade.


Voltei para a sala de aula sem saber se pensava na festa (que cabelo, que vestido, sandália baixa ou de salto?) ou nas fórmulas que o Ozônio despejava no quadro, tão cheias de alfas e betas que a aula parecia de grego. E, pra bagunçar ainda mais a minha cabeça , tinha o encontro entre Guto e vó Nina, marcado para o fim da aula.



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