O mais frustrante dessa situação toda é que eu não sabia o que ia acontecer agora. Quer dizer, eu acabei de descobrir um novo mundo que ninguém- fora eu e ele - conhece e não sei ao certo se vou poder voltar lá outra vez. Pelo menos não com Frank agindo desse jeito estranho..
Não estranho por ter se aproximado tanto de mim e ter tentado..bem..
Não estranho por sua ousadia, mas por ter se separado de mim sem mais nem menos e praticamente me expulsar de lá.
Resolvi deixar isso de lado por um tempo e desci até a cozinha, onde já estavam todos sentados à mesa tomando o café da manhã. Minha mãe foi a primeira a se pronunciar.
- Gee, onde você estava? Fui te chamar no seu quarto e encontrei apenas a cama arrumada..
- Ah, mãe.. Eu..só.. estava no banheiro.
Ela resmungou algo sobre "não responder quando ela chamou" e eu fiz uma careta breve antes de me sentar ao lado de Mikey, que já estava rindo da situação.
Assim que me sentei, meu pai se levantou em um pulo, pegou sua xícara de café e saiu do cômodo. Minha mãe liberou um suspiro alto e cansado, se levantou me lançando um sorriso sincero, me deu um beijo no topo da cabeça e saiu atrás do meu pai.
Eu não sei por quanto tempo eu ia aguentar isso tudo, mas tinha que me esforçar. Minha mãe e meu irmão são as únicas pessoas com as quais eu me importo, e se eu tiver que viver acabado e depressivo em um ambiente como esse, eu vou viver. Contanto que eles estejam felizes.
Mikey tentou criar um assunto, alguma coisa animadora pra tirar aquela tensão do ar, mas nada que tenha dado realmente muito certo. Pouco tempo depois eu peguei uma xícara grande de café e subi para meu quarto. Fechei a porta e me sentei na escrivaninha enquanto pensava no que tem acontecido durante os últimos dias.
Aparentemente, a única coisa que eu sei fazer é estragar tudo...
Tentei ignorar todo e qualquer movimento que eu percebia com o canto de olho. Eu não estava em um bom momento pra falar com Frank de novo. Voltei minha atenção para o papel à minha frente, peguei uma borracha e apaguei tudo o que eu havia desenhado na noite anterior.
Nada de espelho.
Nada de Frank.
Aliás, quando foi que esse cara estranho que eu mal vi na minha vida começou a passar tão frequentemente pela minha cabeça? Será que eu não tenho privacidade nem mesmo nos meus pensamentos?!
E, por falar nisso, será que ele me viu todas as vezes que eu troquei de roupa aqui?
Balancei a cabeça negativamente tentando afastar todos esses pensamentos e voltei toda a minha atenção para o sabor do café em minhas mãos.
Passei as horas seguintes assim, desviando o olhar da xícara de café vazia para a folha de papel em branco. Infelizmente, minha tentativa de relaxar e deixar de pensar em tudo o que me incomodava falhou.
A cada minuto que se arrastava dentro daquele quarto, mais aumentava a minha lista de burradas. Meu pai me odeia, minha mãe e meu irmão acabam sofrendo por conta disso, fui obrigado a me mudar para um fim de mundo, aparentemente perdi o único amigo que eu fiz aqui (que por acaso não é nada mais que um estranho que mora em um espelho), estou desempregado.. Será que isso um dia vai melhorar?
Escutei algumas batidas na porta e logo uma figura magra e alta adentrou o quarto.
Tá aí, mais uma coisa para a lista: meu irmão mais novo já é maior que eu.
- Hey, Gerd..tá tudo bem?
- Sim.
- Tem certeza? Já passou da hora do almoço e você nem saiu do quarto..
- Eu me distraí..
Ele assentiu calado e eu me levantei, agradecendo mentalmente por aquela cadeira ser acolchoada. Logo surgiu um silêncio tenso no quarto e eu pensei que Mikey fosse arrumar uma desculpa e sair logo dali, mas ele apenas se sentou na beirada da minha cama.
- O que tá te aborrecendo? Claramente tem algo diferente com você..
- Ah, Mikey..eu só..sei lá, acho que vou procurar um emprego.
- E desde quando você sabe trabalhar?
- Cala a boca, Mikey..
- Enfim..já pensou em alguma coisa?
- Não...
- Olha, com relação ao pai, as coisas..
- Tá tudo bem, Mikey..já me acostumei.
- Isso tudo é uma merda..- eu assenti e o silêncio desconfortável voltou. - Sabe, talvez você devesse sair um pouco daqui e tentar arrumar uns amigos.. Se distrair.. Eu conheci um cara que mora no final da rua que parece ser super gente boa, ele até tem um afro muito maneiro e...
Foi aí que eu parei de escutar. Não me leve à mal, estou feliz pelo meu irmão já ter uma nova vida social nessa cidade, mas ele fica impossível quando começa com esses monólogos gigantes.. Nesse meio tempo, eu só escutei partes aleatórias, como o nome dele -que eu nem me lembro mais- até que eu senti um certo impacto no meu rosto, que me fez andar alguns passos para trás.
- Dá pra você prestar atenção em mim?- Eu realmente odeio esses ataque de menininha do meu irmão.
-Você me tampou um travesseiro?
- E vou tampar outro se você não começar a me escutar..
- Ah é? - eu peguei o travesseiro que estava caído no chão e o arremessei de volta na direção dele. Ele agarrou o objeto antes mesmo de acertá-lo e logo o tampou de volta pra mim, acertando no meu ombro.
Enquanto eu me abaixei para pegar o travesseiro de novo, ele pegou o outro atrás de si e já ia arremessar de novo, mas eu me levantei bem rápido e segurei o objeto em suas mãos. Nós ficamos nessa guerrinha ridícula de quem consegue ficar com o travesseiro, até que eu tive uma ideia melhor e soltei o meu lado, de forma que Mikey deu alguns - vários - passos grandes para trás e caiu sentado na cama de novo.
Eu comecei a rir e ele simplesmente pulou em cima de mim. Eu caí deitado no chão com o impacto e ele pegou o travesseiro que ainda estava caído no chão e começou a acertar o meu rosto seguidas vezes, enquanto eu tentava, inutilmente, me proteger colocando as mão na frente.
- Tá, já chega..tá, tá, você ganhou..- eu disse em meio aos risos e ele me acertou mais algumas vezes antes de parar e começar a rir também. Depois de um tempo ele se levantou e me estendeu a mão para que eu fizesse o mesmo. Ficamos um tempo nos entreolhando.
- É bom ver você assim, sorrindo.. Faça isso mais vezes.- ele disse em um tom tão sincero que me fez estremecer. Como resposta eu dei um soco de leve em seu ombro direito e ele logo voltou a rir antes de deixar o quarto.
Sim, eu sentia falta de me divertir.Há muito tempo eu não fazia isso. Não verdadeiramente, pelo menos..
Bom, enfim.. Olhei meu reflexo no espelho, ajeitei ( ou baguncei ainda mais, não sei ao certo) meu cabelo e peguei o primeiro casaco que eu achei dentro do armário. Desci até a cozinha e preparei um sanduíche rápido só para não passar o dia de barriga vazia.
-Esse é o dia em que Gerard Way vai arrumar um emprego.- falei, para mim mesmo.
Ou tentar, pelo menos..
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Honey... /Frerard/
FanfictionCom um relacionamento familiar conturbado, Gerard Way se vê obrigado a deixar tudo para trás e começar uma nova vida em uma cidade diferente. O que ele não espera, na verdade, é que coisas bem estranhas aconteçam nesse seu novo lar..