Dois dias depois, no final da tarde após o expediente, Celestina encontrava-se na mesma casa onde passara a infância.
Nada havia mudado muito exceto seu antigo quarto, que virara uma espécie de depósito para as bugigangas de Artemisia. A mãe era uma acumuladora nata, desde que pudesse manter sua bagunça longe dos olhos das visitas. O chão da sala era impecável, o interior das gavetas e armários, não.
A mãe a recebeu na porta do sobrado de dois andares com um olhar surpreso.
"Celestina?"
"Olá, mamãe" a garota sorriu.
"Mas que inesperado! O que veio fazer aqui?"
"Ah...visitar você, ué. Estou atrapalhando?"
Celestina sempre perguntava se Artemisia estava ocupada com outros assuntos. Conhecera um número suficientes de namorados da mãe para cultivar esse hábito.
"Não, claro que não. Eu fiquei surpresa, só isso" respondeu ela. "Você quase nunca vem me ver, geralmente é o contrário... Está tudo bem?"
"Acho que é toda essa situação com a varinha..." Celestina mentiu. "Estou sob muita pressão. Precisava do conforto de casa."
Ela não orgulhava-se do que estava fazendo, mas tentava convencer a si mesma de que era por uma boa causa: Vó Diná quase sempre sabia das coisas.
Artemisia, por sua vez, não só comprou a mentira de primeira como também pareceu ficar emocionada. Deu um abraço apertado na filha e puxou-a para dentro, levando-a imediatamente para a cozinha. Celestina tinha boas lembranças daquele lugar: sua mãe podia ter vários defeitos, mas era muito boa em manter uma criança bem alimentada.
A jovem foi rodeada de pãezinhos de aveia, bolinhos de nozes e um sem número de geleias caseiras. Artemisia parecia realizada em retomar aquela velha rotina, e não parava de rodopiar pela cozinha, tirando iguarias e mais iguarias da despensa.
"Então..." a mãe puxou assunto após finalmente considerar que havia colocado opções suficientes de comida sobre a mesa. "O que Horácio achou da família? Ele não ficou assustado, ficou?"
Celestina riu enquanto mastigava um dos bolinhos:
"Na verdade, acho que ele gostou bastante."
"Ah, que coisa ótima!" a mulher ficou ainda mais radiante. "Estou tão orgulhosa, minha filha. Sabia que, depois que vocês foram embora da festa, sua Tia Ofélia deu o braço a torcer e disse que ele era mesmo um excelente partido? HA! E olha que aquela ali só nasceu pra falar mal dos outros..."
"Então estamos finalmente admitindo que Tia Ofélia pode ser um pé no saco quando quer?"
"Oh, sim, eu nunca neguei isso" Artemisia parecia não entender qual era o ponto em que Celestina queria chegar. "Só não sei o que a chatice da sua tia tem a ver com a sua obrigação de comparecer ao aniversário dela."
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Mamãe Vai Comer Meu Fígado
HumorUma história honesta sobre bruxas, samambaias e técnicos de tv a cabo.