Horácio babava no banco do carona.
"Ei, ei..." Celestina chacoalhou o garoto pelo ombro. "Acorda...você não pode ficar dormindo no meio da rua."
Ele resmungou um pouco, entreabriu os olhos e voltou a adormecer.
"Eu não devia ter te dado tanta cerveja..." a bruxa suspirou, indecisa entre ficar preocupada, ficar irritada ou achar graça.
Aparentemente, conhecer Vó Diná fora demais para Horácio, que já devia estar fragilizado por todo o assédio que sofrera da família Hypatia de maneira geral. Precisava admitir que o rapaz tinha fibra: poucos teriam suportado a festa do início ao fim com tanta desenvoltura. Após descerem as escadas, Horácio agarrou um caneco de cerveja oferecido por Tia Ofélia. Bebeu tudo num longo gole. Foi mais ou menos a partir daí, e com a ajuda de mais uma dezena de canecos, que Horácio começou de fato a se sentir em casa.
Ele riu com as piadas, fez um brinde com Artemisia, abraçou os ocupantes da mesa dos maridos. Já estava mais pra lá do que pra cá quando Celestina o arrastou para a porta da frente, tentando relembrá-lo de que ambos precisariam acordar cedo para trabalhar no dia seguinte. A lua cheia já havia sumido do céu.
O caminho de volta foi tranquilo, embora Celestina lutasse contra o sono. Tilda mostrou-se uma ótima ajuda para manter os olhos abertos, pedindo relatos constantes sobre todos os detalhes da festa, as vestimentas e as conversas. O plano inicial seria deixar Horácio em casa com o furgão e depois pegar um táxi: ela sabia que moravam mais ou menos próximos. Porém, Horácio nunca realmente lhe dissera seu endereço completo, e após praticamente desmaiar assim que fora colocado no banco do carona, Celestina perdeu todas as esperanças de extrair qualquer informação coerente.
Depois de muito suar para tirar o beberrão de dentro do carro, agora a jovem bruxa tentava conceber uma estratégia para içá-lo pelos três andares de escada do seu prédio. Horácio apoiava-se com as costas na parede da portaria, rindo abobalhadamente enquanto Celestina passava-lhe o braço em volta da própria nuca.
"Vamos lá, Hórus, o Escolhido" ela bufou contrariada, erguendo o peso do rapaz. Ele riu mais uma vez:
"Eu já disse que adorei...a sua...família?" as palavras saíam embriagadas de sua boca. "Aquela casa é...hilária! Parece até magia...Será que consigo voltar lá amanhã?"
"Duvido muito" Celestina firmou o pé no primeiro degrau da escada. "A casa é feita para não ser notada. Ainda mais por alguém na sua condição alcoólica."
"Sabe o que isso significa?" ele inclinou-se para ela, o rosto sério de repente. "Eu acho...que a sua família...é bruxa!"
"Você jura?"
"SHhhhh..." ele colocou o dedo na boca da menina. "Não conte para ninguém..."
Haha, quem diria que o nobre moço da tv a cabo virava um piadista depois de uma birita, hein?
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Mamãe Vai Comer Meu Fígado
HumorUma história honesta sobre bruxas, samambaias e técnicos de tv a cabo.