Depois de constatar mais uma vez que o vigia ressonava de maneira tranquila e quase invejável, Celestina e Horácio avançaram sorrateiramente pelo museu, orientados pelo mapinha de um dos numerosos panfletos que se acumulavam na recepção. Celestina guardou seu óculos inútil na bolsa.
Os corredores estavam cobertos pelas sombras. As únicas fontes de luz provinham de pequenas lâminas azuladas junto ao chão, marcando o caminho em casos de emergência. Seus fachos azuis e frios criavam vultos fantasmagóricos nas paredes e nos itens em exposição. Celestina podia sentir a apreensão em cada uma das passadas de Horácio, ambos tentando produzir o menor ruído possível com os tênis de solado emborrachado. Somente quem já andou no escuro em uma casa muito velha e muito grande é capaz de compreender esta sensação.
Após uma curva, onde sempre esperavam ser surpreendidos por guardas armados, pararam diante de uma portinha de vidro escondida, com um pequeno terminal de acesso retangular acoplado à parede. Horácio, de frente para a porta, fez sinal para que a amiga se aproximasse, estendendo uma mão em direção a ela.
A menina procurou na bolsa por alguns momentos, quase causando um infarto no jovem técnico. Horácio esfregava a testa e rezava em silêncio, mas por fim Celestina conseguiu achar o pequeno crachá plástico em meio à sua organizada bagunça.
O terminal emitiu um zumbido baixo, e um botão verde começou a piscar. A tranca metálica da porta girou e estalou de uma forma que durante o dia deveria soar praticamente inofensiva, mas que à noite parecia mais um tiro de escopeta. O casal fechou os olhos e cerrou os dentes.
Pelo amor de Gaia, deve ter dado pra ouvir esse barulho até do outro lado da cidade!
Celestina ignorou a planta em sua cabeça. Por um feliz acaso (todos os outros funcionários presentes estavam mesmo conversando sobre o jogo de futebol), ninguém apareceu para capturá-los. Atravessaram a porta e, chegando mais perto, a garota conseguiu divisar o que estava escrito na placa acima de sua cabeça: "APENAS PESSOAL AUTORIZADO". Precisou respirar fundo duas vezes para acalmar o coração, mas conseguiu acompanhar Horácio através do corredor.
O acesso dos funcionários consistia em uma estreita passagem metalizada, com diversas portas, vãos e salas anexas, cada uma com seu próprio terminal de acesso. A maioria das salas estava escura e desabitada. Porém, por debaixo da porta de uma delas, onde se lia "VIGILÂNCIA/TV", era possível ver uma fresta de luz e ouvir o burburinho de uma discussão acalorada.
Horácio segurou a mão da menina. Ela conseguiu enxergá-lo pedindo calma com a outra mão livre. Juntos, pé ante pé, continuaram em direção ao fim do corredor. Horácio apontava para uma grade junto à última entrada.
Porém, quando já estavam quase alcançando seu destino, ouviram o inconfundível barulho de uma porta sendo empurrada de supetão. A claridade que vinha de dentro da sala espalhou-se por uma grande área, formando uma faixa amarela que cortava o restante do corredor mergulhado no breu. Uma silhueta masculina foi se formando.
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Mamãe Vai Comer Meu Fígado
HumorUma história honesta sobre bruxas, samambaias e técnicos de tv a cabo.