Cap.31- Dor.

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Alec.

  Dor. Era tudo dor. Minha cabeça... Doía. Meu peito... Rasgava. Minha vida... Estava no fim.
  Chega. Chega! Foi a hora em que me sentei na cama, em forma de suor. Minha respiração pesada. Lágrimas escorrendo. Meu coração batia forte. Mas, não em esperança. E sim em... Perda.
– Não... – Falei, chorando mais.
  Eu não podia acreditar. Estava quase amanhecendo. Enterrei a cabeça nas mãos e neguei. Neguei eternamente. Peguei meu telefone e liguei para meu pai.
– Alô? – Ele disse, bem rouco.
– Pai... – Chamei, aos prantos.
– Alec? Meu filho, o que foi?
– Pai... Aconteceu alguma coisa... – Falei.
– O que?
– Eu não sei... Algo ruim. Pai... Vem pra cá?
– Vou. Vou sim. Me espera aí.
  Desliguei o telefone e fui até o banheiro. Tomando um banho quente. Eu não conseguia me acalmar. Precisei ficar sentado no chão do box, pois eu não aguentava ficar em pé. Saí do chuveiro, me enxuguei, coloquei uma camiseta branca e uma calça moletom cinza e calcei chinelos pretos. Saí do quarto. Não aguentava mais ficar lá. Fui até a sala. As janelas começavam à clarear a sala com o sol nascendo. Eram 5:50 da manhã.
  Depois de um tempo, a campainha tocou. Atendi e vi que eram todos. A família de Camille, a minha e os amigos de Camille. Eles me cumprimentaram e todos nós nos sentamos no sofá.
– Querido, fale. O que aconteceu? – Minha mãe perguntou.
– Alguma coisa aconteceu com Camille. Agora. Preciso saber o que é.
– Você... Você tem certeza?
  Balancei a cabeça, positivamente, com as mãos juntas nos lábios.
– Pode ter sido apenas um pesadelo, filho... – Meu pai disse.
– Quem dera fosse, pai. Mas, não é. – Falei.
– Então... O que o está deixando tão assustado? – Cassandra perguntou.
– Eu estou sentindo algo.
– O quê? 
  Respirei fundo e olhei para todos.
– Perda.

Katie.

  Aquela não era a minha intenção. Eu pretendia apenas afastá-la de Alec e mandá-la para longe. E não matá-la. E de pensar, que também, matei uma criança. Alec jamais iria me perdoar.
– Fale para Alec... Fale para ele que eu amo... – Ela disse, fraca, mas não completou.
  Camille fechou os olhos e caiu de lado. Levei minhas mãos à cabeça e levantei.
– Katie, ela está morta? – Jake perguntou, assustado.
– Oh meu Deus, o que que eu fiz...? – Eu falava, baixinho. Me sentindo culpada.
– Katie!
– Foge. – Falei.
– O que?
– Escuta: Vou entregá-la à polícia. Ela precisa que a levem ao hospital. Enquanto isso, você foge. Você vai ser preso se não fugir. Vou pegar algo que indique que vi ela sendo morta e dizer que fugiram com ela. Mostrarei à Alec. Apenas foge. – Falei.
  Ele observou Camille no chão.
– Katie, olha o que você fez... – Ele disse, com os olhos cheios de lágrimas. – Ela ia ser mãe...
– Você a esfaqueou.
– Você me mandou fazer a minha parte e não me disse que ela estava grávida!
– Eu não podia!
  Ele se calou por um tempo. Depois, apontou o dedo na minha cara.
– A assassina aqui é você. E você vai viver com esse peso. Pra sempre. – Ele falou.
  Ele saiu da sala e fiquei ali, parada. Com minha vítima ao meu lado. Olhei para as minhas mãos, cobertas de sangue. Olhei para Camille. Branca mais que papel, os lábios brancos, o suor, os olhos fechados com as olheiras molhadas por lágrimas.
  Pela primeira vez, tive pena de um inimigo. Me toquei de tamanha gravidade que cometi. Ela nunca me fez nada... Por que tirei a vida dela? Por que tirei dela o momento de ser mãe, se tive o meu momento? Por que tirei dela o amor de sua vida, se nunca até mentalmente o perdi? Por que eu tinha que me tornar isso? Me ajoelhei à sua frente e toquei sua mão gelada. E eu nem amava Alec. Tirei dela, uma coisa, a troco de nada. Deixei uma lágrima cair.
– Perdão... – Falei, baixinho.
  Retirei sua blusa toda manchada de sangue e vesti nela, uma blusa minha. Troquei de roupa. Coloquei um vestido azul, um salto alto preto e deixei meus cabelos soltos. Lavei minhas mãos e coloquei sangue falso em minha cabeça. Guardei a blusa na bolsa e saí.
  Cheguei na casa de Alec uns 30 minutos depois. Um dos policiais dormia no carro e o outro lia, atentamente, o jornal. Nem me viu chegar. Peguei a blusa na bolsa e fui em direção à entrada da casa de Alec. Respirei fundo e toquei a campainha. Alec atendeu. Ele me olhou, assustado. 
– Katie? O que aconteceu? – Ele perguntou, virando meu rosto e observando minha cabeça.
  Ele me colocou dentro da casa e comecei à chorar. Lágrimas de verdade. Pela primeira vez, eram lágrimas de verdade.
– O que foi? – Ele perguntou.
  Todos me olhavam. Puxei o até o sofá e fiz com que ele se sentasse. Me ajoelhei na sua frente, como uma mãe conversando com seu filho. Ele me olhava, esperando minhas palavras. Segurei suas mãos.
– Alec... Preciso que você seja... Bem forte. – Falei e ele me olhou com a testa franzida. – Eu... Estava vindo pra cá e vi dois caras batendo em alguém. Cheguei para separar a briga e vi que era uma mulher. Era Camille. – Seus olhos se encheram de lágrimas. – Seu quadril estava esfaqueado e ela estava mais branca do que uma folha de papel. Tentei separar, mas era tarde demais. Ela não conseguiu resistir ao último soco. Ela morreu, Alec. – Falei, sentindo as lágrimas escorrerem.
  Alec chorava, desesperadamente.
– Eu sinto muito. – Falei.
  Todos choravam. A família de Camille, principalmente.
– Não... – Ele falou.
  Assenti com a cabeça. Ele enterrou a cabeça nas mãos e chorou. Chorou de uma dor imensa. Como se mil espadas estivessem atravessando seu peito. Eu o abracei e senti ele retribuir o abraço.
– O que eles fizeram, depois que você viu? – Ele me perguntou, soluçando.
– Eles bateram na minha cabeça e eu caí. Eles pegaram Camille e fugiram. Não consegui ver seus rostos. Eles usavam máscaras. A única coisa que pude pegar foi... – Peguei a blusa e estendi em sua direção. – Isso.
  Ele pegou a blusa e chorou mais. Meu coração estava apertado, por estar mentindo e falando a verdade ao mesmo tempo.
– Sinto muito pela sua pequena, também. – Falei.
– Quero morrer. Agora. Não aguento mais.
– Shh... Não fale isso...
– Não tenho mais nada, Katie. Absolutamente nada. Ela era tudo o que eu tinha. Tudo o que eu sempre quis ter. Ela era meu porto seguro, meu maior amor, meu maior bem,... Viver, pra mim, era ter ela. Ela era a minha vida. Então, já que a perdi, apenas vou me desfazer de minha existência. Não quero mais.
  "Ela era a minha vida.". Ele nunca havia me dito aquilo... Tive noção de tamanha besteira que fiz. Ele pegou a xícara vazia de café ao seu lado e jogou longe. Quebrando-a na parede. Depois, voltou à enterrar a cabeça nas mãos. Ouvimos passos e olhamos para a escada. Audrey e Caleb. Os dois usavam pijamas. Audrey carregava seu ursinho embaixo do braço e os dois nos olhavam, ainda sonolentos. Eles vieram em direção ao pai e Alec os pegou no colo, abraçando os dois. Eles não falaram nada. Apenas o abraçaram. Com força.
– Aconteceu alguma coisa, papai? – Caleb perguntou.
  Eles se sentaram ao lado do pai e Alec buscou palavras para falar com os dois.
– Vocês se lembram de quando eu falei para vocês sobre quando uma pessoa morre? – Alec perguntou às crianças.
– Sim. – Eles disseram.
– Você falou que quando uma pessoa querida vai para o céu, ela não volta mais, mas ela vai sempre estar olhando a gente e que o amor e a saudade vão sempre permanecer. – Audrey falou.
– Isso. É... Não vai ser fácil falar isso pra vocês. Nem pra mim é. Mas, quero que saibam que... Não importa o que aconteça. Vocês nunca vão estar sozinhos.
– É. Porque a gente vai ter a Camille e a nossa irmãzinha. – Caleb falou.
  Alec começou à chorar novamente.
– Por que está chorando, papai? O que houve?
– A Camille, ela... Infelizmente, ela... Foi embora.
– A Camille deixou a gente, papai? Pra onde ela foi?
– A Camille... Morreu. – Alec disse.
  As crianças ficaram caladas. Lágrimas escorriam, sem parar, por seus olhos.
– Mas, papai...
– Eu sinto muito. Não queria ter dito isso à vocês.
– A gente nunca mais vai vê-la?
– Infelizmente, não.
  Eles abraçaram o pai e choraram. Me senti mais culpada ainda. Camille era como uma mãe pra eles. Eu não conseguia acreditar. Não conseguia acreditar que quem tinha feito aquilo, fui eu. Fiz isso, sem nem pensar em consolar quem realmente a amou.
  Sua família chorava. Sua irmã estava nos braços do marido e não parava de chorar de jeito nenhum. Seus pais estavam acabados e parecia que chorar lhes causavam muito mais dor. Os pais de Alec choravam por causa do carinho imenso que tinham pela futura nora. Christopher e a namorada estavam abraçados, tristes pelo sofrimento de todos. Alec estava acabado. Como se não lhe restassem mais forças. Ele se entregou à tudo e, naquele momento, estava preparado para se render à morte também.

Alec.

  O meu amor... Minha fonte de forças... Meu maravilhoso desejo... Se foi.
  Eu não conseguia acreditar. Eu não queria acreditar. O que eu iria fazer? Como eu iria viver sem ela? Sem seus beijos, sem suas carícias, sem suas declarações, sem tê-la pra mim?
  Fui para o jardim. O nosso jardim. Me sentei na beira da piscina, de pernas cruzadas. Pensei em me afogar, mas não queria perder nenhuma lembrança dela. Observei tudo. Todos os detalhes do lugar que seria a nossa casa, onde criaríamos nossa filha, onde íamos fortalecer nossa relação. Viver por mil anos, até depois de nossos dedos não se moverem mais de tanto os entrelaçarmos. Seriam boas lembranças.
  Sempre me perguntei o porquê de Deus sempre me tirar tudo de mais precioso. O porquê de eu sempre estar cara a cara com o sofrimento e ser derrotado. O porquê de sempre estar cara a cara com uma oportunidade de uma vida feliz e algo me impossibilitar disso. Eu estava cansado de ser eu. Cansado de ser fracassado. Cansado de ser derrotado. Cansado de perder. Bastava de perdas. Chega! Já perdi muito da minha vida. Por que insistir em me tirar mais?
  Olhei para o meu pulso. A tatuagem. O que pra sempre estaria marcado, assim como a mágoa e a dor em meu peito.
  Alguém se sentou ao meu lado. Anna. Seus olhos estavam vermelhos, lágrimas ainda desciam por seu rosto, ela observava a água limpa da piscina.
– É tão incrível a capacidade de Deus para colocar e retirar as pessoas no mundo... Ao mesmo tempo, é tão doloroso... – Ela disse.
– Nem me fale... – Eu disse.
– Minha irmã amava muito você.
– Eu sei...
– Ela estava tão animada para a chegada de Noah e... Caitlin.
  Deixei uma lágrima escapar.
– Só faltava ela para nossa família se completar.
  Anna começou à chorar novamente.
– Eu não pude nem me despedir... – Ela disse.
  Eu a olhei e ela me abraçou, chorando.
  O amor dói demais... É algo que você não pode impedir e ele se empodera de você. Faz de você o que ele quiser. Depois, bagunça todo o seu coração e sai, prevalecendo o caos.
  Mais tarde, quando todos foram embora, coloquei o jantar para as crianças, as dei um banho e as coloquei para dormir. Novamente, era eu por eu. Eu teria de fazer tudo sozinho. Tomei um banho demorado, coloquei uma camiseta azul, uma calça moletom preta e me deitei, apagando todas as luzes.
  Chorei baixinho. Senti as lágrimas formarem rios no meu travesseiro. Senti falta de sua presença ali ao meu lado, de seu carinho,... E me matei mais de chorar, sabendo que nunca mais sentiria aquilo denovo. Eu não sentiria, nem mesmo, o prazer de sentir. O prazer de amar. Porque eu nunca amaria mais ninguém.
  O cadeado foi passado, novamente, em meu coração. E Camille levou a chave com ela.
 

À Procura do Amor (EM REVISÃO)Onde histórias criam vida. Descubra agora