Capítulo 21

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Não demorou muito para chegarmos em casa. A principio não o encontrei em lugar algum, chegando a pensar que havia novamente saído. Até eu resolver ir até a cozinha preparar algo para comer e me deparar com o meu pai sentando na bancada.

Existem certos momentos ao qual passamos cuja reação que devemos proferir não condiz com o que realmente queremos fazer. Aquele momento onde nossa alma quer simplesmente fugir, para não ter que passar por tal situação. Estar em um local com meu pai, sempre me trazia essa vontade. Minhas pernas fraquejavam, minhas mãos suavam e fazia de tudo para falar as palavras certas, pois nunca sabia o que esperar dele. Por ser sempre sério, era uma surpresa quando ele fazia alguma piada ou trocadilho engraçado. Na verdade, nunca sabíamos se podíamos rir.

Meu pai usava uma camisa polo branca e tinha seus cabelos molhados. Provavelmente tinha acabado de sair do banho. Segurava em suas mãos uma taça de vinho e olhava para o nada. Ele não era muito de abraços ou manifestações de carinho. Assim como minha mãe, presentes e dinheiro era seu modo de demonstrar amor. No fundo sabia que isso era uma fachada, quando estava bêbado ele tinha mania de me apresentar para todos seus amigos, orgulhoso por ser a eterna garotinha dele. Mesmo odiando suas festas, de certo modo sempre fui grata por existirem. Nelas não existia o famoso Roberto Loughester, era simplesmente meu pai. Bêbado? Sim! Porém somente nesse estado, ele conseguia demonstrar o afeto que eu tanto buscava.

Fiquei encostada no vão da porta durante alguns minutos, sem dizer uma palavra sequer. Respeitando seu silêncio. Ele era bom em não demonstrar seus sentimentos. Enquanto minha mãe tentava mostrar a todos a família perfeita, meu pai simplesmente não escondia o homem orgulhoso e insensível que era, tanto na empresa como em casa. Nesse momento, ele estava concentrado. Não sei o que se passava em sua mente. Ele tocava de leve a taça, mas não bebia. Estavam completamente limpas suas bordas, ele não havia bebido até então.

— Soube que chegou hoje do hospital — quebrou o silêncio, porém não ousou olhar para mim, nem fazer um movimento sequer.

— Sim! — assenti acanhada e me aproximei sentando ao seu lado — Conheci a casa e conversei com a mamãe.

— Ela me disse! Pensei que ao sair do hospital, você ainda ficaria em repouso. — sua voz era rouca e concentrada.

— Sim! Mas pensei acho que já fiquei tempo demais deitada. Precisava resolver umas coisas.

— Tipo?

Respirei fundo. Tenho total certeza de que ele já sabia o que fui fazer, porém como o bom advogado que era, queria ouvir da minha boca o que fiz. Sabia que ele tinha em mente, tudo que iria dizer. Só precisava seguir seu jogo, para ver aonde ia me levar.

— Tipo o trancamento da minha faculdade.

Pela primeira vez ele tomou um gole de sua bebida e não disse mais nada.

— Acha isso mesmo necessário? — Ele ainda evitava olhar pra mim, assim como minha mãe quando foi ao hospital.

— Sim! — falei confiante — Já tinha isso em mente durante meu período no hospital, e quando a mãe disse que havia arruinado a empresa, vi que era uma confirmação para o que tinha em mente. Esse ramo não é pra mim.

Ele arqueou as sobrancelhas e deu mais uma golada.

— Sendo assim, você tem noção que deixa o caminho livre para seu primo tomar posse da frente da empresa?

Ele tinha que me lembrar do idiota do Luiz. Ele iria ficar todo orgulhoso e debochado por conseguir o que sempre quis. Irá dizer que desistir por saber que ele é mais inteligente e uma garota como eu não seria capaz de comandar uma empresa daquele porte. Pensando desse lado uma dúvida invadia minha mente. Queria provar para aquele egocêntrico que eu poderia muito bem ser melhor que ele, mas não valia a pena. Eu sabia por que desisti da carreira e tinha que lembrar sempre desse motivo "minha felicidade em primeiro lugar". Mesmo que para isso, tenha que ouvir o idiota do meu primo enchendo minha cabeça para o resto da vida.

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