Capítulo 14 - "Onírico"

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Apoiada por uma das mão de Dionísio, Luna flutuava, de olhos fechados. O céu estava manchado de estrelas. A tempestade havia passado e a lua dominava o ambiente com sua beleza estonteante. Dionísio apenas observava, vertido num silêncio contemplativo. Pela primeira vez desde que a viu, foi tomado por um pensamento paradoxal haurido de seu inconsciente. Um mundo sem ela, sem aquele ser que pairava, que levitava diante de seus olhos. Sentiu medo e soube então que o mundo começara pra ele. Luna Abriu os olhos e se deparou com o universo aceso e belo na ponta de seu nariz. Um tecido estelar envolveu sua retina, deixando-a suspensa.

— Acordou? — brincou Dionísio.

— As vezes precisamos do "escuro" para enxergar com mais nitidez a beleza das coisas. Que céu lindo, essa imensidão é fascinante.

— Concordo plenamente "lua". Não existe luz sem escuridão, assim como não existe imagem sem sombra, branco sem o preto, felicidade sem tristeza, completude sem solidão. E, acredite, você sem mim.

— Ou seria o contrário professor? — ela o enquadrou, inquisitiva.

— TALVEZ...! Vem, vamos sair, vamos fazer um pouco de barulho...incomodar o universo!

— Só saio à força! estou com frio....Dion...! — o desafiou, sorrindo.

— Pra quem tinha medo, até que você se saiu bem... — ele a abraçou sorrindo.

Dionísio maliciosamente se abaixou e a envolveu. Luna esmoreceu e percebeu a cilada tarde demais, quando já estava nos braços do "lobo". Ambos sorriram num tom de cumplicidade e afetividade.  

— Assim não vale! Trapaceiro.

— Compensarei. Fique com minha camisa!

A noite corria bela, acompanhando o casal em êxtase. Dion vestiu a bermuda, se sentou e tirou o vilão da caixa. Luna se vestiu e se sentou ao lado de sua perdição". Não demorou muito e Dionísio impôs as primeiras notas. O som ecoou doce e comovente. O clássico "Chorando e Cantando" da autoria de Geraldo Azevedo e Fausto Nilo fez Luna estremecer. Os dois estavam ali, voltados para o mar, num mundo que acabara de se abrir para ela. Ao ouvir a melodia, Luna sentiu seu peito estremecer e a vontade de chorar a tomou com voracidade.

— Perfeita Dion. Uma rara poesia. Tua voz então, me atormenta...

— Perfeita igual a você! Alguma Especial?

— "Pra Você Guardei o Amor"! — acrescentou Luna..

— Nando Reis...belíssima. — rebateu Dionísio, enquanto dedilhava os primeiros tons.

Os dois cantaram embebecidos de ternura. Entreolharam-se num amor tão fecundo que souberam naquele momento que "o caminho não tinha mais volta". Estavam nesse mundo numa relação diretamente proporcional, um para o outro. Uma raríssima expressão de quiralidade, uma confabulação dos deuses. 

— Adoro essa canção! — Luna se agitou.  

— Uma incontestável expressão do belo. Agora vamos de "Chão de Giz", do grande paraibano Zé Ramalho, de Brejo do Cruz.

Luna respirou fundo e congelou diante daquele disparate de metáforas lúdicas e profundas. Um espetáculo. Não satisfeito, Dionísio continuou com "Beira-Mar" também de Zé Ramalho. 

— Nada mais sugestivo, Dion. É deveras mística...

— Essa é a marca do Mestre Zé.

E a brincadeira acústica continuou entre músicas belas e comentários lisonjeiros e carinhosos. Estavam aprofundando as almas, tocando pontos até então inabitáveis. Dionísio estava vidrado naqueles olhos cintilantes. Luna, incrédula, diante da sagacidade e da desenvoltura do "lobo".

"DIONÍSIO" - Manipulador (Livro I)(COMPLETO)Onde histórias criam vida. Descubra agora