Olhos afiados

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Fazia frio e estava garoando.

Eric chegou a casa de Lilian e tocou a campainha, logo mais, uma mulher de cabelos negros apareceu à porta. Provavelmente a mãe de Lilian, mas não se parecia muito com ela, nem a pele branca, nem o cabelo ou os olhos escuros. Exceto o nariz e a boca, estes dois sim, se pareciam e muito! Um nariz realmente atrevido - se bem que, não tão atrevido quanto o de Lilian - e lábios finos estranhamente sedutores.

A mulher transmitia uma sensação engraçada, tinha olhos afiados, parecia pronta para captar a menor das sutilezas e ainda deixava pairando no ar um sentimento afável.

- Entre logo! - mandou puxando-o para dentro pelo braço. - Você está todo molhado! - A mulher fechou a porta atrás de si.

Então Eric notou que o observava atrás da ombreira da porta dois olhos que cascateavam mel, amarelos como os de um gato.

- Lilian! - gritou não percebendo que a garota estava ali do lado. - Pega uma toalha e traz aqui! Seu namorado tá todo molhado!

- Tá! - respondeu desaparecendo porta à dentro.

- E vê se pega uma limpa!

- Eu sei, mãe! - gritou de volta.

- Espera aqui um pouquinho, eu vou tirar a lasanha do forno que tá queimando! - advertiu desaparecendo na mesma porta que Lilian.

E ele realmente esperou. Aquele ar familiar o deixava meio desconfortável.

Lilian logo apareceu com uma toalha rosa nas mãos.

- Oi! - cumprimentou colocando a toalha nos cabelos molhados de Eric e os secando, tinha o mesmo cheiro de hortelã da garota.

- Obrigado! - agradeceu. Lilian estava a poucos centímetros de Eric, espaço realmente perigoso. Tudo nela era atrativo para ele, o nariz atrevido, os lábios finos, o hálito doce, principalmente os olhos, que pareciam cascatear mel infinitamente.

- Só espero que vocês não fique doente - murmurou preocupada.

Eric tirou o casaco assim que Lilian finalmente o soltou, por sorte fora apenas ele o molhado.

- Venham comer vocês dois! - chamou a mãe da garota.

O cheiro da lasanha permeava a sala de jantar, que também era a cozinha, a mulher já havia servido os pratos e sentava-se à mesa à espera dos dois.

- Deu uma toalha limpa para ele?

- Dei, mãe!

Eric sentou-se e começou a comer ignorando aquela conversa.

- Eu não me apresentei, eu me chamo Romênia. - Apresentou-se sorrindo.

- Eric.

O resto da janta girou em torno do garoto, Romênia perguntava coisas sem muita importância como a idade, que ano estava no ensino médio, de onde veio e etc.

Duas coisas que Eric notou; apesar de geralmente ser distraído, foram:

Primeiro, havia fotos espalhadas por toda casa, geralmente nelas estavam presentes três pessoas, as duas primeiras eram relativamente fáceis de se identificar; Romênia e Lilian, mas a terceira fora arrancada fora, nem riscada ou cortada, e sim, rasgada da forma mais bruta possível.

Segundo, Romênia ainda usava uma aliança, o que o levava a crer que quem havia trucidado a foto não era a mulher de cabelos negros que havia guardado a aliança do marido e sim a garota de cabelos castanho claro que sentava ao seu lado e comia em silêncio.

Essas observações acima o fizeram se perguntar:

Quem é e onde está o pai de Lilian?

Afinal de contas, não era justa só ele ter o passado revirado sem dó.

- Você conhece um médico chamado Henry? - inquiriu Romênia de repente.

- Sim. - E acrescentou. - É o meu pai.

- Eu sabia! Você sabia disso, Lilian?

A garota engoliu em seco fazendo silêncio se estender por uma grande nesga de tempo:

- Sim - respondeu por fim olhando para longe de Eric.

O garoto iria ignorar aquilo por enquanto.

- Se me permite, como soube disso dona Romênia? - questionou ainda encarando a aliança dela.

- Ele foi o médico que cuidou de mim quando eu fiquei doente - começou a contar empolgada, se Lilian gostava de ouvir, Romênia gostava de contar -, disse que tinha um filho da sua idade que se chamava Eric, vocês dois são um pouco parecidos então eu só liguei os fatos!

- Entendo.

O resto da noite foi bem simples - Eric terminou de comer e ajudou Lilian a lavar e secar a louça -, e na hora em que ia embora, Lilian o acompanhou até a saída.

A noite ainda era fria porém a garoa havia parado, não havia mais nuvens no céu e brilhantes pontinhos de luz queimavam bem longe dali.

- Ei… - chamou com sua voz afável.

- Se é sobre o seu pai eu juro que eu descobri sem querer! - defendeu-se antes mesmo de ser atacada.

- Isso é impossível de se acreditar! - retrucou, mas teve que se segurar para não rir quando viu a expressão de desespero que se alastrou pelo rosto da jovem. - Mas não é sobre isso.

Lilian pareceu aliviada:

- É sobre o quê então?

- Bem… - Ele ia perguntar sobre o pai dela mas mudou de ideia. - Não, deixa para lá.

- Você está fazendo isso ultimamente! - acusou emburrada. - Parece que quer dizer alguma coisa mas não diz!

- Não se preocupe com isso.

- Não se preocupe com isso! - resmungou em retorno.

“O nariz dela está rosa de novo”, pensou enquanto olhava para o rosto emburrado da garota.

Queria beijá-la, mas desistiu quando viu dois olhos afiados os espiando da janela, então apenas afagou a cabeça da garota e foi para sua própria casa.

***

Outro capítulo para vocês raposinhas, espero que tenham gostado 😊

O oposto do inversoOnde histórias criam vida. Descubra agora