Dean
“A vingança é como morder um cão porque o cão mordeu você”.
Austin O’Malley
Apesar dos meus esforços, acabei na mansão. Eu ainda tinha um negócio para cuidar e, na maioria das vezes, eu trabalhava de lá. Meu apartamento era o meu santuário. O lugar onde eu ficava para relaxar e não para me preocupar com as merdas com que tinha que lidar todos os dias. Ultimamente, parecia que eu só me sentia relaxar quando estava com Tyler, e eu não gostava deste sentimento. Estava me sentindo confortável ao lado dela, me acostumando com a sua presença e seus desejos. Acostumei-me a estar junto dela e percebi que pensava nela quando não estávamos juntos. Isso estava nublando meu julgamento. Eu poderia lidar com isso? Será que eu poderia deixar o passado para trás e esquecer? Uma parte de mim desprezou a ideia, mas um outro lado se alegrou. Eu poderia revelar meu rosto, guardar meu moletom com capuz e acabar com isso. Mas o que aconteceria com Tyler e eu? Será que ela ainda iria me querer quando soubesse quem eu sou, ou o que a excitava era o fato de não saber a minha identidade? Ela provavelmente ficaria entediada depois de um tempo e desejaria o seu estranho de volta, seu Lótus.
Não podia mais pensar nisso. Comecei este jogo, então tinha que terminá-lo. Eram apenas os poderes mágicos de Tyler me enfeitiçando novamente. Ela sempre dava um jeito de me lançar seu feitiço. E que porra de feitiço esse.
Nas últimas semanas, Jimmy vinha observando Tyler, acompanhando seu dia. Ele estava fazendo isso porque eu não podia. Estava preso aqui, esperando o telefonema de um dos meus colegas de trabalho nos EUA; eu estava determinado a tirar partido da desaceleração econômica no exterior. As propriedades estavam sendo vendidas a preço de banana. Scott Cooper era alguém que eu havia contatado alguns meses atrás, quando fui à Miami, de férias. Devo admitir, foi mais uma operação de análise de campo do que férias propriamente ditas. Humphrey havia me colocado em contato com ele, já que Scott trabalhava no setor imobiliário. Ele tinha economizado um pouco e queria ampliar sua agência, mas não tinha o suficiente. Humphrey disse a ele que eu estava considerando expandir meus negócios para os EUA e, claro, Scott ficou muito animado em encontrar-se comigo. Eu o conheci, ele falou, gostei das suas ideias e entrei com metade do investimento. Acho que ele sabia que estava fazendo um pacto com o diabo, mas ele jamais fez nada para demonstrar que sabia que eu era algo mais que um homem de negócios. O fato de eu ter dito a ele que, se ele fodesse com tudo, eu cortaria suas bolas e sua garganta, nada tinha a ver com isso.
Então, sentei e esperei a ligação de Scott, bem como do meu advogado em Miami, que provavelmente estava aguardando suas instruções também. Assinar uma procuração tinha tornado as coisas muito mais fáceis.
A única coisa que surgiu de diferente foi o fato de Tyler estar direto naquele hospital. Comprei uma máscara para Jimmy, mandei que ele se virasse e entrasse lá. Ele ganharia um bom dinheiro com isso e eu sabia que ele poderia se foder, mas iria dar um jeito de descobrir.
Ele soube que Tyler estava visitando um garoto chamado Jeremy. Fui pesquisar sobre ele e descobri que era um menino pobre, que tinha estado dentro e fora de hospitais e lares adotivos por toda a sua vida. Ele era um paciente com leucemia. Entristeceu-me saber que ele teve uma vida difícil. Mas o que eu não entendia era o que ele tinha a ver com Tyler. Então, procurei um pouco mais e descobri a forma interessante como Tyler e Jeremy se conheceram. Muito interessante mesmo.
Estava tão empolgado com meus pensamentos, que nem percebi que Humphrey havia entrado.
― Dean… hum… como posso falar isso? A Sra. Carmichael está na porta e deseja falar com você. ― Olhando para Humphrey do outro lado da minha mesa, percebi que ele parecia perplexo.
― Leve-a até a sala de estar, ofereça uma bebida e avise que estarei lá em um minuto. Você pode ficar de olho nas minhas chamadas e me avisar se Scott ligar? Vou falar com ele assim que a Sra. Carmichael partir. Acredito que esta seja uma visita passageira?
Humphrey deu de ombros, mas balançou a cabeça e saiu. Eu não precisava dessas merdas agora, já tinha muitas outras para lidar. Mas tenho que admitir, fiquei intrigado para saber por que diabos ela estava me visitando. Eu só a tinha visto uma vez, com Aidan e seus filhos, de modo que essa visita era algo totalmente inesperado. Fechando meu laptop, levantei da cadeira e fui em direção à sala. Ao abrir a porta, vi a Sra. Carmichael sentada no sofá, o mesmo que seu marido sentou com uma prostituta no colo, acariciando-a enquanto tomava um copo de Bourbon.
Olhando para cima, ela educadamente sorriu e eu sentei em frente a ela.
― Dean, obrigada por me receber.
Balancei a cabeça graciosamente.
― É um prazer, Sra. Carmichael. Algum problema? Acredito que a senhora tenha um motivo sério para essa visita.
A Sra. Carmichael olhou timidamente para o chão e se mexeu em sua cadeira.
― Na verdade, me sinto muito desconfortável por vir aqui falar com você sobre isso.
Balancei a cabeça.
― Não há motivos para sentir-se assim. Sou tão seu amigo quanto do seu marido.
Cynthia sorriu, mostrando seus dentes brancos e perfeitos. Ela devia ter cerca de quarenta anos, e era bastante atraente para alguém casada com um homem como Aidan. As pessoas, após o casamento, pareciam tornar-se complacentes e desleixadas, mas Cynthia sempre manteve uma bela aparência e usava as melhores roupas. Seu cabelo loiro era perfeitamente penteado e sua maquiagem era discreta. Além disso, ela amava o marido e as filhas.
Aidan, você é um babaca idiota!
― É bobagem, realmente, mas eu precisava te perguntar algo. Aidan tem estado mais distante do que o habitual e eu tenho tentado descobrir o porquê. Sei que é estúpido da minha parte vir aqui, mas estou tão perdida. Achei que, como vocês estão sempre se falando, talvez você pudesse saber o que há de errado.
Então, caí em mim. Aidan não era o único babaca idiota. Eu também era. Por minhas próprias razões egoístas, eu o encorajei a transar com minhas duas prostitutas naquela noite. Não importava que ele não precisasse de muito incentivo. Eu ainda tinha desempenhado um papel, machucando esta pobre mulher.
― Tenho certeza de que, seja o que for, ele vai voltar ao normal em breve. Ele provavelmente deve estar com algum problema no trabalho ou algo assim. Talvez você só precise dar um pouco de tempo a ele. ― Me senti um merda falando isso, como se ela fosse uma criança de cinco anos de idade. Cynthia, obviamente, não nasceu ontem.
― Eu sei, você está certo. ― Ela sorriu. ― Talvez seja só uma fase e ele logo voltará ao normal. Não sei. ― Ela suspirou e olhou para fora da janela por um momento. ― No fundo, sei que ele tem me enganado.
Ela olhou para longe, dando-me a impressão de que se sentia culpada por acusá-lo. Isso ou ela sentia-se envergonhada. Era ele quem deveria se sentir envergonhado, aquele babaca. E vou fazê-lo entender isso, em breve. Já estava ficando farto das suas bravatas estúpidas mesmo.
― Escute, vou conversar com ele, posso? Ele sabe que pode falar comigo a respeito de qualquer coisa. Tenho certeza de que, seja o que for, posso conversar sobre isso com ele e tentar fazê-lo colocar a cabeça no lugar. Vou lembrá-lo de que ele precisa dar mais valor ao presente que ele tem em casa. ― Dei-lhe um sorriso insolente e ela corou.
― Você é tão gentil, Dean. Sabia que poderia contar com você. Você sempre foi maravilhoso conosco. Inclusive para as meninas. Vejo a forma como você olha para elas e tenho certeza de que você será um ótimo pai, algum dia. Elas até se referem a você como Tio Dean.
Sorri. Isso aconteceu, provavelmente, porque sempre comprei presentes caros em cada aniversário e Natal, mas as crianças eram realmente adoráveis. Eles eram uma família bem situada financeiramente, mas as meninas nunca agiram de forma arrogante. Elas sempre mantiveram os pés no chão.
― Você tem duas meninas incríveis, Cynthia, deve ter muito orgulho delas.
Levantando-se, ela sentou ao meu lado. Cruzou as pernas e bateu os cílios para mim.
― Você realmente acha isso a meu respeito? ― ela sussurrou.
― Isso o quê? ― Eu meio que sabia aonde isso ia nos levar, mas tinha que ter certeza.
― Você sabe ― disse ela, desviando o olhar. ―, que eu sou um presente?
― É claro. ― Eu sorri. ― Você é uma mulher atraente, Sra. Carmichael. Qualquer um seria um homem de sorte em ter alguém como você como esposa.
Ela tremulou os cílios para mim novamente.
― Sério? Você acha? ― Ela se aproximou ainda mais.
Ah, merda.
― Hum. Sim, claro.
― Tem muito tempo desde que alguém me elogiou dessa forma, é muito bom ouvir isso. Me faz sentir mulher novamente.
Eu não podia acreditar nisso. Era difícil acreditar que seu marido era tão cego.
― Talvez, Aidan só precise ser lembrado disso.
De repente, colocando a mão em meu joelho, ela apertou-o sugestivamente.
― Ou, talvez, eu pudesse ter alguém para me lembrar disso.
Dando um pulo da cadeira, fiquei de pé.
― Sinto muito, Sra. Carmichael. Sei que você e seu marido estão com alguns problemas, mas não quero ser a causa deles.
― Você não me quer? ― ela perguntou com um beicinho.
Olhando para ela, eu sabia que transaria com ela em qualquer outra circunstância, mas ela era uma mulher casada, e eu não ficava com mulheres casadas.
― Claro que desejo, Sra. Carmichael. Quem não desejaria? Mas não posso fazer isso. Vocês são meus amigos e eu estimo muito a nossa amizade. Não posso fazer isso. Se não tivesse Aidan nesta equação, eu adoraria ter algo mais íntimo com você, mas, por favor, entenda que não posso fazer isso com a família de vocês.
Ver as lágrimas em seus olhos me fez sentir como um babaca ainda maior.
Ela cobriu a boca com as mãos e virou a cabeça.
― Sinto muito. ― Ela soluçou. ― Não sei o que deu em mim. Nunca traí Aidan antes. Isso é patético. Você me faz um simples elogio e eu ajo como uma vadia.
Eu ri, mesmo que a situação estivesse longe de ser engraçada.
― Cynthia ― eu disse, sentando ao lado dela e segurando sua mão. ― Não quero que você se sinta envergonhada com nada. Não é sua culpa que seu marido tenha esquecido a mulher maravilhosa que tem. Por que você não o surpreende? Sugiro que você compre uma peça íntima nova. Posso garantir que essas coisas geralmente funcionam. ― Dei uma piscada sugestiva e ela sorriu. ― Enquanto isso, vou conversar com Aidan e lembrá-lo do quando a família significa. Não se preocupe. Não vou mencionar nossa conversa, mas certamente não posso deixar de fazê-lo perceber como você está chateada.
As lágrimas escorriam pelo seu rosto enquanto ela sorria carinhosamente para mim. Levantando, peguei um lenço de papel e coloquei em sua mão.
― Como você sabe, nunca me casei, mas acho que é um trabalho duro. Às vezes, um casal precisa passar por momentos difíceis, a fim de testar seu relacionamento. Vocês estão casados há muitos anos, é normal ter alguns altos e baixos.
Enxugando as lágrimas, ela fungou e assentiu.
― Sim, você está certo, é claro. Obrigada.
Acariciando-lhe o ombro, balancei a cabeça.
― Sem problemas. Quer ficar um pouco mais e tomar outra bebida, até que você se sinta um pouco melhor? Eu não me importo.
Cynthia balançou a cabeça.
― Não, está tudo bem. Já te ocupei por muito tempo. De toda forma, já me sinto muito melhor.
― Você tem certeza? ― Sei que sou um monte de coisas, mas um bastardo sem coração não é uma delas. Cynthia era uma daquelas mulheres que meu pai costumava sempre falar. Ela merecia o meu respeito, e ela merecia ser cuidada e respeitada pela porra do marido idiota dela.
― Tenho sim ― disse ela, levantando-se. ― Preciso ir e encontrar com as meninas. Elas estão em uma festa de aniversário e devo buscá-las em meia hora.
Levantando, coloquei a mão na base das suas costas e caminhei até a porta com ela.
― Obrigada ― ela disse novamente, virando-se para sair.
― Disponha, Sra. Carmichael, e dê olá para as meninas por mim. ― Ela sorriu, entrou no carro e partiu.
Enquanto eu a observava sair com o carro, Humphrey apareceu ao meu lado.
― Dean, Scott ligou há dez minutos. Ele disse que os documentos estão prontos para serem assinados e que já estão com o advogado.
Balancei a cabeça.
― Obrigado, Humphrey. Vou ligar para eles agora.
Voltei para o escritório e fechei a porta. Liguei para Scott e para o meu advogado, Louis, e tudo parecia estar correndo como o previsto. Fiquei satisfeito. Eu estava satisfeito com um monte de coisas agora.
O telefonema que recebi a seguir, eu atendi com prazer. Eu sabia que era Jimmy e que era sobre Tyler.
― E aí, Jimmy? O que tem para mim? ― Ele hesitou e percebi que havia algo errado. ― Não me diga que ela deu um balão em você e você não sabe onde ela foi parar? O que foi desta vez? Ela está brincando de gato e rato contigo? ― Eu sabia que estava sendo sarcástico, mas já estava puto com essa merda.
― Hum… o que esta garota significa para você, Dean?
Minha postura ficou rígida.
― Que porra de papo é esse, Jimmy? Desembucha!
Ele suspirou e eu sabia que não era bom.
― Eu a segui. Ela estava com a gostosa que trabalha com ela e aquele outro cara. Eles saíram para dançar há algumas horas, no Buddies, e estão ficando cada vez mais bêbados.
Quanto mais ele falava, mais eu sentia a raiva crescer. Se algum filho da puta se atrevesse a colocar uma mão sobre ela, eu o mataria pessoalmente, sem pensar duas vezes.
O próximo telefonema que recebi, eu respondi com prazer. Eu sabia que era Jimmy e eu sabia que era sobre Tyler.
Ele suspirou novamente, e eu sabia que o que ele iria falar era a pior parte, o que quer que fosse.
― Tyler estava dançando com aquele cara do trabalho… seu nome é Ian. ― Eu sabia muito bem o nome do filho da puta. ― Bem, ele está com ela a noite toda, mas não é só isso, Dean. Ele beijou-a.
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Sortilégio
RomanceEste não é um conto de fadas. Ele não é um príncipe encantado que vai levá-la em direção ao pôr do sol. Esta é uma história sobre traição, luxúria, desejo e, em última análise, vingança... E a vingança só pode conduzir a uma coisa. Tyler Ele era um...