Capítulo Cinco: Acalme Esse Coração, Leãozinho.

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 Ana.

 Acordei com cheiro de café. Duas crianças conversavam animadamente e Vitória ria. Abri os olhos. Não estava no hotel. Nem em casa. Era um quarto grande, com todos os móveis em preto e branco e as paredes pintadas com flores, parecia serem feitas a mão, já que tinha algumas ainda não acabadas. O cheiro da casa era de terra fresca e tinha vasos de flores na janela. Me levantei, descalça e caminhei pelo chão que parecia madeira. Sai do quarto e encontrei um enorme corredor com fotos emolduradas. Fotos de praia, de duas crianças lindas. Caminhei devagar, sem entender o que acontecia. Até achar a cozinha.

 Lá estava Vitória, com o cabelo mais armado que nunca. Um shortinho de um tecido mais macio, uma regata, e uma longa camisa de seda com manga curta. Ela cozinhava e servia dois pratos.

 -- Bom dia, raiozin de sol. -- Ela sorriu e se aproximou de mim, enlaçando minha cintura e beijando meu nariz, e minha testa. -- Arrume um banco pra ti, cherô, eu tô terminando de fazer o café da manhã. Tem omelete, tem torrada, tem manteiga em cima do balcão e tem suco. Se sirva ai. -- Me sentei num dos banquinhos do balcão e vi os dois pratos servidos. Franzi as sobrancelhas.

 Tudo era tão real, tão vivo. O cheiro da comida, da casa, da Vitória. O sons, meus sentidos. Foi então que ouvi a porta de vidro da sala, que era logo ao lado, se abrir. Duas crianças vieram correndo do gramado que tinha. Uma menina e um menino. Ela tinha grandes olhos negros, o cabelo bem escuro e liso. Ele tinha cachos loiros e olhos castanhos esverdeados. Ambos usavam roupas em preto e branco. Se sentaram nos banquinhos e começaram a comer. Fiquei boba.

 -- Bom dia, mamãe. -- Disse o menino, que sentou ao meu lado. Ele estava sorridente e comia feliz.

 -- NaLua, calma. -- Vitória disse sorrindo para a menina, que comia com pressa. -- O café num vai sumir não, dê bom dia na tua mãe, menina.

 A garotinha saltou do banquinho e caminhou até mim, pulando no meu abraço e falando apressadamente:

 -- Bom dia, mamãe! -- Ela voltou saltitante pro banquinho e recomeçou seu café da manhã.

 Os dois pareciam ter entre 6 e 8 anos. Os dois tinham o sorriso de Vitória, mas a minha mania na hora de organizar a comida no prato. Meus olhos encheram de lágrimas, tudo era tão real ao mesmo tempo que não era. Duas crianças ali, que eu não precisava de respostas para saber que também chamavam a Vi de mãe. Encarei ela, com as lágrimas já rolando e ela veio me abraçar.

 -- Que foi, minha pequena? Porque chora? -- Ela segurou minha mão direita, com a esquerda dela, e senti algo metálico e frio no seu dedo. Uma aliança, dourada, simples e linda. Quase de imediato, encarei meu próprio dedo anelar caçando o par. E lá estava. Foi ai que desabei, meus olhos viraram cachoeira. -- Ô meu dengo, não chora. Conta pra mim, amor, o que foi?

 Encarei aqueles olhos cor de marte e segurei o rosto dela. Tínhamos filhos lindos, eu tinha Falcão no meu nome, eu tinha Vitória ao meu lado por todo o sempre e mais um pouco. Aos poucos, com medo, fui aproximar meus lábios dos dela. E assim que nossas testas se tocaram e nossas bocas iam se encontrar eu acordei.

 Eu acordei.

 O quarto estava escuro, silencioso. O vento balançava a cortina. Iamos embora amanhã cedo, tudo não passou de um sonho, e eu sentia falta do peso da aliança no meu dedo. Olhei para Vitória. Ela estava se mexendo. Isso não era normal, ela tem sono pesado. Ela dorme feito pedra. Mal se mexe. E lá estava ela, se revirando na cama e resmungando algo. Não foi difícil notar que ela estava tendo um pesadelo.

 Me levantei com calma, puxei a coberta e me deitei ao lado dela, logo suas mãos me encontraram e ela se virou, se agarrando a mim e deitando sua cabeça em meu peito, eu estava meio sentada, meio deitada, e ela se aconchegou em mim. Sentia seus braços me agarrando com força, parecendo buscar algum socorro ali. Passei a mão em seus cabelos.

 -- Shiiiii.... -- Fiz, baixinho. -- Tá tudo bem, leãozinho, acalma esse coração selvagem. Sossega essa alma agitada. Tá tudo bem agora, pode dormir em paz. -- Conversei, sabendo que talvez ela nem ouviria, mas deu certo.

 -- Canta, Aninha... -- ela murmurou e eu fiquei sem saber se ela estava acordada ou dormindo.

 Então, me deitei melhor, com a cabeça elevada e cantarolei "Leãozinho" até ela pegar no sono. E eu também me fui ali, com os dedos enrolados nos cachos daquela juba. Meu corpo relaxava de imediato perto dela e foi impossível não apagar. Dormi ali, com Vitória nos meus braços e com leves lágrimas imaginando as duas criaturinhas que vi em sonho e nunca quis tanto que fosse real.

[Dois capítulos em um dia? Isso mesmo, me deu vontade e eu fiz mesmo. Pode acontecer as vezes de eu adiantar capítulo. Ainda preciso saber o melhor horário pra postar pra vocês. Espero que tenham gostado.]

Ana&VitóriaOnde histórias criam vida. Descubra agora