Capítulo Oito: Teatro

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[Dobradinha de cap de novo? SIM]

Ana.

Ela sabia. Vitória sabia. Estava escrito em minha testa tudo que eu sentia por ela. Por um deslize, entreguei o jogo. Contei quem era a pessoa da minha declaração de amor. Contei de quem era meu par de olhos favoritos. Contei.

Voltei no dia que escrevi a música. No dia que coloquei tudo no papel, que falei tudo pra ela, sem falar. Ela sabia. Desde aquele dia. Ela sabia. Fazia cerca de um ano, ela sabia.  Eu não escondi. Eu contei. E fingimos que não. Fingimos ser uma música qualquer, sobre alguém qualquer, de universo qualquer.

Eu chorava compulsivamente. Tudo estava tão confuso. Tão perdido. Tão fora do lugar. Tinham acabado de jogar laranja no verde e isso não combinava, me embrulhava o estômago. Eu estava sem chão, chorando como quem perdeu a mãe no mercado. Meu peito gritava e minha cabeça tentava bolar um jeito de me desviar de tudo aquilo. Queria o canto do meu quarto em Tocantins, queria minha casinha, meu escurinho, meu ponto de paz.

Os braços de Vitória me abraçavam. E eu não sabia o que dizer, fazer, olhar. Sabia que ela me fitava, com seus grandes olhos castanhos esverdeados. Com seu grande universo tentando invadir o meu.

Seu corpo quente fazia o meu queimar. Éramos duas galáxias se juntando em uma só. Tudo entre nós foi muito intenso. Sempre foi. Cada sorriso, cada olhar, cada meio acorde e meio jeito. Cada toque, cada carinho, cada cuidado. Cada pedacinho de nós.

Éramos um casal antes mesmo de ser, de ter, de sonhar em viver. Os nomes sempre ficaram juntos. Colado. Num sabia mais onde terminava eu e começava ela. Onde eu e ela virou um nós. Em que dedo entrelaçado eu entrelacei meu ser nela? Em que parte do sonho eu desejei meus filhos com aquela leveza? Em que momento eu quis ser não só Caetano, mas Falcão também?

Eu continuava a soluçar e Vitória me aninhou no peito dela, me pegando no colo e me deixando desabar nos braços dela. Nem sabia porque chorava. Muito menos ela. Eu transbordava algo que me impede de dizer desde que aquele sorriso fez morada em mim. Eu queria que ela me provasse. Me enxergasse. Me sentisse. Se deixasse em mim. Encontrava lar nela, na curva do pescoço, no cheiro da nuca, no abraço-casa. Em qualquer música inventada por mim, tinha um pouco dela.

Meu coração pedia por ela, pelo jeito dela, pelo sorriso, pelo ser. Pela alma que ela carregava dentro do corpo. Eu não queria ser só Ana. Ou ser Anavitória. Eu queria ser Ana&Vitória.

Eu queria chamar tudo aquilo de meu. Eu queria ser chamada de sua, eu queria as mãos delas em mim, eu queria os lábios dela nos meus. Queria a galáxia dela entrando em colapso com a minha. Queria que ela virasse astronauta só pra viver na lua da minha noite. Queria ser girassol só pra seguir o sol do dia dela. Queria viver eclipse pra gente poder se ter.

Eu chorava cada vez mais, e Vitória me abraçava cada vez mais forte. Eu tinha medo. Medo daquele coração selvagem não ser meu. Daquela alma agitada não querer diminuir o ritmo pra me acompanhar. Tinha medo de errar o passo na dança e estragar o show. Precipitei a fala, adiantei a cena, abri as cortinas antes da hora, entreguei meu coração no escuro. 

Mas eu já devia saber que ela sempre foi melhor nos improvisos.

Ana&VitóriaOnde histórias criam vida. Descubra agora