Capítulo 31 ou "Persuasivo, esse Avelar"

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– Estou aqui. – eu anunciei ao entrar no ateliê de David, só para dar de cara com o retrato de Karina coberto por um pedaço de tecido escuro (o que me deu arrepios); ele esticou o pescoço para reconhecer a minha presença e se levantou da mesa onde ficavam seus dois computadores, desligando a tela e me lançando um olhar apreensivo – Sobre o que você queria conversar?

– Existem provas de que Stela usa o almoxarifado da quadra de esportes como estoque para as drogas que vende. – ele falou sem respirar, como se fosse perder a coragem de dizer as palavras.

– Uau. Bom dia. – eu esperei ele retirar o que dissera, na esperança de que fosse um espasmo involuntário e não o motivo real da conversa.

Arregalei os olhos na direção dele quando percebi que era mesmo o motivo da conversa. Certamente não era isso que eu tinha em mente quando eu recebera uma mensagem dizendo que ele tinha algo importante para me falar. Eu engoli em seco, me recusando a acreditar que um simples retorno de Lucas Avelar à minha vida parecia ser o suficiente para que tudo que eu estivera lutando por tanto tempo para manter em silêncio agora gritasse aos quatro ventos.

Não que não tivesse sido exatamente assim um ano antes, quando ele vencera minhas defesas e encontrara a verdade por trás dos meus segredos guardados a sete chaves. Só que, veja bem, no ano anterior eu não tinha exatamente que me preocupar com a segurança das pessoas, porque a própria ameaça a elas achava que eu estava morta.

– Isso não é uma pergunta. – foi só o que eu consegui elaborar.

– Não é.

Como você sabe disso?

– O irmão dela. – ele sacodiu a cabeça; eu sabia que era o irmão de Stela quem fabricava as drogas que ela vendia. – É um idiota que estudou comigo. Ele já fazia isso quando frequentava a Fundação, duvido que tenha deixado de fazer agora.

Eu ergui uma sobrancelha. Isso dificilmente poderia ser considerado prova de alguma coisa. Depois de tanto tempo lidando com audiências e advogados, eu sabia reconhecer uma prova quando via uma, e aquilo nada mais era do que especulação. Mesmo assim, fui na dele.

– Não me parece lá muito esperto usar o almoxarifado da escola para esconder drogas.

– E não é. Mas é conveniente, se você usa o laboratório para fazê-las. – eu me empertiguei, impressionada com o quanto David sabia sobre tudo, o que aparentemente era tanto quanto eu – Para roubar substâncias e usar como matéria-prima de sei lá que porcaria eles colocam nas drogas. Ou pelo menos usava, antes de Carlinhos explodir tudo.

Ainda me admirava que ele tivesse guardado para si tudo o que sabia por tanto tempo. Era quase como o que eu tinha feito, só que ele havia permanecido em Viveiro lidando com tudo. Minha consternação deve ter transparecido em alguma parte do meu rosto, porque David perguntou:

– O que foi?

– Nada é só que... eu passei tanto tempo guardando esse segredo. – abaixei a cabeça, desconfortável de uma hora para a outra – Ainda é estranho ouvir as outras pessoas falando sobre ele.

– Vale, pensa comigo. – ele ignorou minha tortura pessoal e foi direto ao ponto. David, como Lucas, não parecia inclinado a desistir de provar a minha inocência (o que eu não acreditava ser possível se ele achava que um almoxarifado cheio de drogas era prova de que eu não havia começado incêndio nenhum) – Por que Carlinhos começou o incêndio?

– Para esconder o corpo... da sua irmã. – as palavras saíam de mim com dificuldade, e eu sabia que David não estava exatamente se divertindo em ouvi-las.

Quem Brinca Com FogoOnde histórias criam vida. Descubra agora