Prólogo

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Oito anos antes

Ao meu lado estava sentada a pessoa mais brilhante que havia conhecido em toda a minha curtíssima vida. Algumas vezes a imaginava uma super-heroína, capaz até de coisas dificílimas como erradicar a fome no mundo ou trazer a paz que tantos almejam. Mas, na verdade, ela era apenas a minha mãe. A mulher que eu me espelhei desde cedo, a que gostaria de chegar a ser pelo menos um terço do que é.

Minha maior inspiração.

Sim, eu até me inspiraria na minha irmã mais velha. A questão é que não queria arriscar. Ouvi ontem mesmo meus pais conversando sobre ela e não estavam muito satisfeitos; papai até usou palavras feias para se referir a ela e a comparou com alguma atitude que mamãe havia tomado no decorrer de sua vida. Fiquei assustada ao sentir o tom áspero que usava contra as duas mulheres da nossa família, pensando que poderia ser a próxima.

Entretanto sabia que eles jamais nos desamparariam. Apesar de tudo, éramos felizes na maior parte do tempo.

Às vezes sinto o amor deles escasso, uma linha ultrafina prestes a se romper. Meu pai vem se afastando de mim cada vez mais e mamãe também, embora as palavras "eu te amo" saiam de suas bocas em demasiado. É como se existisse coisas de maior importância que o carinho e presença na vida da filha.

Avistei o homem alto e de cabelos impecáveis sair do escritório no andar debaixo da grande casa e andar até a sala de estar onde estávamos. Ele era bonitão, cheio de postura e superioridade. Minha mãe também exalava elegância e imponência, principalmente quando usava o uniforme da polícia; ninguém tirava da minha cabeça que a mulher mais bonita do mundo se encontrava ao meu lado em vários momentos. Na verdade, os dois eram o casal perfeito retirado das capas das revistas que Rebecca lê sem trégua. Eles se completavam de uma maneira que nem eu mesma sei descrever.

Meu pai surgiu com caras de poucos amigos, como se quisesse voar em alguém. Estranhei quando ele agachou em minha frente e segurou meu rosto com as duas mãos, impedindo que me movesse.

— O que aconteceu, papai?

— Nada, querida. Apenas me prometa que não deixará que nada mude sua cabecinha.

— Ricardo! — minha mãe contestou.

— Não, Luciana, é necessário. Esse mundo está terrível, temos uma prova clara disso dentro da nossa própria casa. Não quero que Cecília se deixe influenciar por qualquer um que venha colocar ideias malucas na cabeça dela, ela terá que ser forte para quando não estivermos mais aqui — acariciou minha bochecha, o olhar triste — Não seremos eternos.

Minha mãe deixou que uma lágrima caísse e a secou rapidamente, pensando que o gesto sutil tinha passado despercebido pelo meu olhar atento.

— Amanhã ou depois alguém poderá vir lhe falar coisas que jamais serão verdadeiras...

— Não faça isso, Ricardo.

— Tenho que fazer — respondeu seco — Independente do que acontecer, você é minha filha, Cecília. Não importa o que disserem, ninguém vai tirar do seu coração.

— Por Deus, Ricardo, vamos conversar lá dentro!

Ela se levantou depressa e o arrastou para o escritório.

Conseguia ouvir os gritos pela casa silenciosa e, além disso, reverberava uma série de perguntas no meu subconsciente. Querendo ou não, foi muito confuso meu pai dizer aquilo e agir como se fosse um dia normal, sendo que para ele explicava tudo, mas para mim só trazia mais e mais questionamentos.

— Ricardo, não pode sair desse jeito!

O homem parou no hall de entrada, prestes a atravessar a porta para ir embora. O sofá onde eu estava sentada dava uma visão privilegiada do local.

Cecília - Em Busca da Verdade (concluído)Onde histórias criam vida. Descubra agora