— É um lugar bonito, titia.
Larissa estava jogada no sofá da pequena sala de estar. Balançava os pezinhos com excitação por estar fora de sua zona de conforto. Minha sobrinha usava uma tiara de strass azul, sandálias brancas também de pedras e o vestidinho rosa que há muito me pedira e que só agora pude presenteá-la. Eu gostava de agrada-la, gostava de ver seus olhinhos em expectativa para algo que quisesse muito, gostava de vê-la feliz.
— Que bom que gostou — peguei o balde de pipoca e levei até a cozinha — Pode vir aqui sempre que quiser.
— Com certeza, titia.
Rebecca logo viria busca-la, o que era angustiante. Desde o momento em que saí de casa, nós não nos falamos. Éramos orgulhosas demais para isso e também não poderia ser de outra maneira, tínhamos uma rivalidade de anos e não acabaria com um simples adeus. No dia anterior, sexta-feira, peguei Larissa na escola, após a mesma me ligar pelo telefone da mãe dizendo que queria dormir aqui em casa, e nem ao menos precisei trocar palavras com minha irmã.
A menininha correu animada até a porta quando ouviu o bater suave. Apoiei no balcão com os braços esticados e a cabeça baixa, sem nem ao menos olhar na direção. Rebecca se direcionaria a mim de um jeito ou de outro.
— Oi, mam...
— Que roupa é essa?
Assim que ouvi a pergunta dela, sem nem esperar que a filha completasse o cumprimento, ergui os olhos. Rebecca tinha a reprovação e nojo estampados na face, sem nem ao menos tentar esconder.
— Tia Cecília quem me deu... — baixou o rosto para o vestido.
— Retire-o agora! — minha irmã bradou — E não me interessa se gostou, já tem roupas demais.
Larissa não contestou, apenas deixou o olhar no chão e seguiu até meu quarto, onde estavam suas coisas. Deixei o balcão para trás e andei para a frente de Rebecca. Ela estreitou as sobrancelhas quando minha mão se chocou contra a lateral esquerda de seu rosto, segurando o local com raiva.
— Como ousa fazer isso com a sua própria filha?
— Isso mesmo, minha filha! — enfatizou — Não vai receber seus presentes, Cecília. Você a abandonou, não vai compra-la com matéria. Não vou permitir!
— Ela sempre quis aquele vestido e não sabe como ficou ao vê-lo, louca para mostra-lo a você — respondi, desgostosa — Não vou repetir o que já te disse, Rebecca, mas Larissa é uma boa menina, a filha que só quer dar orgulho para uma mãe que não se importa! Ela não tem culpa do que aconteceu com aquele homem, ela é apenas uma criança cheia de sonhos e esperanças. Por favor, ainda é tempo de mudar com ela!
Rebecca me olhou estranho.
— Eu nunca, escute bem, quebraria os sonhos da minha filha! Ela vai ter o que nós não tivemos, algum dia...
— Por que não hoje?
— Porque eu ainda não posso... — encolheu-se levemente — Ainda não é possível!
— Quero saber, Rebecca!
— Não! — foi ríspida — O passado ainda está aqui, reverberando entre as paredes daquela mansão e entranhado na nossa pele, e, enquanto não pudermos seguir em frente, não posso dar à minha filha o que ela merece. E Larissa é merecedora de mais do que estou dando, sei disso.
Minhas mãos coçaram para abraça-la, algo em mim queria que nossa história fosse um pouquinho diferente para podermos ser normais. Mas não éramos, tínhamos uma bagagem pesada e desproporcional que nos distanciava a cada dia. Havia problemas que eu guardava somente para mim, assim como segredos que minha irmã mantinha dentro do seu coração a sete chaves.
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Cecília - Em Busca da Verdade (concluído)
Teen Fiction+16 | A vida de Cecília Castro nunca foi um mar de rosas. Quando tinha apenas dez anos, perdeu os pais em um trágico acidente de carro ao tentarem desviar de um caminhão em alta velocidade. Desde então passou a viver com a irmã mais velha, a qual gu...