Capítulo 8

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Ao chegar em casa, aproveitei o tempo livre e sozinha para organizar as minhas malas para a mudança. Eu não tinha muitas coisas para levar, inclusive queria deixar aqui tudo o que fosse da minha irmã ou que me lembrasse ela. Gostaria de apagar a figura loira e autoritária da minha memória, uma mera sombra no passado obscuro de uma menina perdida. Mas não era possível, ela me acompanharia para sempre.

Entrei no escritório dos meus pais e lembrei das vezes que brincava deitada naquele chão; era o único jeito de passar um pouquinho mais de tempo com eles, antes que voltassem a trabalhar. Abri a gaveta da escrivaninha e peguei de lá o caderno de desenhos que me pertencia. Desenhava muito mal, rabiscava um cabelo cor-de-rosa em bonecos palitinhos e dizia que era ótima no que fazia.

Reparei que algumas daquelas gavetas estavam trancadas, o que atiçou a minha curiosidade como nunca. A chave provavelmente estava com a Rebecca, o que dificultava um pouco a bisbilhotagem. Mas era simples resolver aquilo com um grampo de cabelo ou um pedaço de arame, já que vivia perdendo a chave do meu armário escolar. Demorou alguns minutos e consegui abrir. Haviam papéis, documentos, cartas com recortes de revistas e outras que nem foram abertas.

Engoli em seco assim que a porta se abriu, escondi a papelada bagunçada no meio do caderno de desenhos e fechei a gaveta com a perna. Rebecca me encarou sem entender nada e com a testa franzida.

— O que está fazendo aqui?

— Até onde sei essa casa é minha também, posso andar em qualquer lugar daqui sem te dever satisfação!

Ela revirou os olhos.

— Estava procurando esse caderno velho? Vai leva-lo consigo? — confirmei, sem a menor paciência — Quando vai partir?

— Hoje mesmo, só estava procurando por isso e já vou chamar o táxi — mordi a parte interna da boca — Não devia estar trabalhando?

— Saí mais cedo para resolver uns problemas e aproveitei para saber como estava.

Aos poucos recuei do escritório e andei quase correndo para o quarto. No apartamento olharia com mais calma todos aqueles papéis, ou simplesmente devolveria quando minha irmã não estivesse aqui; afinal, com certeza não entenderia nada do que estava escrito lá.

***

Cheguei ao apartamento lá pelas três da tarde, estava muito calor e o ambiente todo fechado me sufocava. Mas era acolhedor, um espaço pequeno: dois quartos, um banheiro, cozinha e sala de estar; com as paredes pintadas de creme e branco e móveis em tons escuros. Eu estava orgulhosa de ter conseguido esse lugar por um bom preço e me livrado da Rebecca como brinde.

Ela, inclusive, me pediu que pegasse Larissa na escola hoje, porque precisava sair para resolver alguns problemas e não deu tempo mais cedo. O bom é que passaria umas horinhas com a minha sobrinha e não causaria tanto transtorno na cabecinha dela com a ausência repentina.

— Sério que já se mudou, titia?

— É, Rapunzel, mas vamos nos ver sempre que der — agarrei a mãozinha dela — Que tal tomarmos sorvete hoje?

A animação tomou conta de seus olhinhos brilhantes e corremos para a sorveteria mais próxima. Como sempre, Larissa pediu sorvete de chocolate e eu de flocos com cobertura de morango. Ela se sentou ao meu lado no banco da praça, enquanto tomávamos nossos sorvetes.

— Acha que a mamãe vai ficar muito diferente agora que você foi embora, tia?

— Por que, meu anjo?

— Não sei, ela anda preocupada demais comigo e com tudo ao redor... Nem ao menos ficou zangada quando eu peguei carona com a minha amiga — murmurou, a voz mole.

Cecília - Em Busca da Verdade (concluído)Onde histórias criam vida. Descubra agora