Capítulo 3

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Quando adentrei pelos portões da diretoria, novamente atrasada e perturbada por um pesadelo tenso, a diretora me barrou. Seu olhar verde era pura reprovação. Eu sabia que viria sermão, mas também não me importava. Pelo menos seria o primeiro do mês.

— Atrasada de novo, Cecília?

Ajeitei a mochila nas costas e coloquei as mãos nos bolsos.

— Acontece, né?

— Com você anda acontecendo demais para o meu gosto...

— Não dou motivos além destes para reclamar de mim, diretora.

— Muito pelo contrário, você é uma das melhores alunas da nossa escola e, sinceramente, não consigo entender como consegue sendo do jeito que é.

— Tenho dons que a senhora desconhece! — estalei a língua e pisquei para ela.

As sobrancelhas dela arquearam.

— Mais uma advertência e você estará suspensa, Cecília. Junto com as demais, pode ser expulsa — calei-me, apenas com a boca comprimida — Não vai dizer nada?

— Não há o que dizer, a senhora tem razão. Como mentir com algo que você mesma viu?

— Só precisa se comportar por alguns meses, Cecília. Tenho certeza que vai passar em uma boa universidade e... — cocei os olhos, inchados de tanto chorar a madrugada toda — Está difícil, não é?

Suspirei.

— Vai melhorar, senhora. Só preciso voltar para a terapia e ocupar minha cabeça, assim eu não penso.

— Olha, se precisar de qualquer coisa, pode me procurar, ok? Não sei o que está se passando na sua cabeça, mas nada que não tenha solução ou cura. Não hesite em buscar ajuda.

Concordei com a cabeça e segui até a sala. Minha sorte era que Molly gostava muito de mim e sempre reparava nas coisas mais sutis. Quando eu estava com algum problema, por exemplo, e escondia de todos para não preocupar ninguém, ela era a única que notava a pontinha de tristeza ou medo nos meus olhos. Hoje em dia não aceito tão bem essa ajuda, tornei-me uma pessoa fechada demais ou até difícil de lidar.

As aulas foram tranquilas, um professor após o outro, passando seu conteúdo e indo embora. O garoto novo era bem entendido, respondia aos questionamentos e terminava as coisas primeiro. Apesar de as pessoas terem certo repúdio disso, que eu carinhosamente chamo de inveja, ele já era amigo de todos os mais populares. Até sentou-se com eles no intervalo. Era cômico como as coisas funcionavam, bastava ter um pouquinho a mais de dinheiro e ser "pegável" que já virava sensação do momento.

Aline e eu fomos até o vestiário trocar de roupa para a aula de Educação Física no meio da tarde. Estava calor e devia ter umas quinze meninas amontoadas naquele lugar. Odiava demais fazer exercício, preferia mil vezes ficar tranquila lendo um livro ou bebendo um café, mas se não participasse podia ficar retida e definitivamente era algo que não queria. Além de que era competitiva a ponto de aprender qualquer esporte mesmo não gostando.

— Fiquei orgulhosa por você ter confrontado sua irmã.

— Não foi bem um confronto, foi estranho, na verdade. Ela parecia tão... Triste? — questionei a mim mesma — Ah, eu não sei. Rebecca não reagiu como eu esperava.

— Melhor assim, pelo menos aceitou que fosse embora e ouviu umas verdades para deixar de ser arrogante! — amarrou os cadarços do tênis — Viu só o novato? Não perdeu tempo em fazer "amizades"! — Aline ironizou, fazendo aspas e mudando de assunto.

— Ele tem de amizade o que a gente tem de santa, Ali — joguei a mochila no armário e saímos do vestiário.

Assim que chegamos à quadra, avistamos Fredy escorado na parede alaranjada antes das arquibancadas. Ele acenou para nós duas e se sentou no chão, fingindo que estava ajeitando os tênis nos pés, sem a menor vontade de se aquecer ao comando do professor.

Cecília - Em Busca da Verdade (concluído)Onde histórias criam vida. Descubra agora