Capítulo 19

96 7 0
                                    

Cinco meses antes – Leonardo Vargas

Em dois anos muita coisa havia acontecido. Minha vida girou em cento e oitenta graus muito rapidamente. Tive que procurar trabalho e me esforçar muito para que meus patrões não me demitissem por chegar atrasado quase todos os dias desde que minha avó adoeceu e comecei a trabalhar em dois empregos. Não tinha tempo para quase nada e raros eram os momentos de lazer que tínhamos.

Três meses depois de partir, a saudade foi tanta que retornei para a cidade e fui procurar por minha amada, mas ela já estava acompanhada de um garoto da sala dela. Ria, empurrava-o com o ombro e revirava os olhos. Do mesmo modo que fazia comigo, ouvindo mais do que falando.

Não a culpei por isso, mas à princípio fiquei realmente chateado por ter seguido tão rápido com a vida. Logo meu coração se acostumou e entendi: Cecília era dona do próprio nariz e eu era o maldito que a havia abandonado, tinha todo o direito de seguir com quer que fosse e eu apenas deveria abaixar a cabeça e aceitar que perdi.

Segurei a mão de minha avó. Ela estava em um hospital público, sendo atendida e monitorada desde o último infarto que teve. Os médicos disseram que é questão de tempo para ela me deixar, que suas chances eram escassas e que eu me despedisse enquanto ainda havia oportunidade.

— Meu netinho! — sorriu de leve.

— Não tenho mais lágrimas para chorar, vovó. Sei que estou sendo um maldito egoísta, mas não quero que a senhora vá!

— É a lei da vida, todos nós vamos morrer algum dia. E chegou a minha hora, querido.

— Eu não posso viver sem a senhora!

— Pode sim... — afirmou, fraca — Tenho um pedido para fazer!

— O que quiser! — beijei sua mão.

— Faça a verdade vir à tona, não deixe mais aquela menina ser enganada por todos! Faça valer a pena os anos que vocês sofreram separados, enquanto podiam lutar com isso juntos...

Sequei as lágrimas, concordando.

— Não tivemos muito tempo juntas, mas tenho certeza que é uma boa garota e que não mereceu o que fizeram com ela... Principalmente o que você fez, meu filho.

— Eu vou me retratar por tudo, vó. Te juro!

— Ótimo, parto tranquila sabendo que você tem consciência dos seus erros e da sua palavra — fechou os olhos — Sabe o que tem que fazer, meu amor!

— Por favor!

Sua mão se desprendeu da minha e o monitor apitou insistentemente. Minha avó havia me deixado às três e quarenta e quatro da tarde de uma quinta-feira do mês de outubro.

Foi um dos dias mais tristes e densos da minha vida. Esperei uma semana para cremar o corpo e poder leva-la para junto de seu filho na cidade natal. Meu pai pode ter feito as piores coisas enquanto vivo, mas o coração da mulher que me criou era tão doce e maleável que tenho certeza que de que era isso que gostaria. De estar junto dele em sua última morada.

Estacionei o carro em frente a uma casa bonita e de uma pessoa muito especial para mim. Apertei a campainha duas vezes e aguardei em frente à câmera. Logo o portão eletrônico foi aberto e eu entrei, passando pelos cachorros que já me conheciam há anos e parei quando a vi.

— Oi... — cumprimentei, sem graça.

— Meu filho! — Molly correu para me abraçar e eu a apertei, cheio de saudade — Eu sinto muito!

— Está tudo bem, mas preciso mesmo desse favor, Molly.

— Pode ficar o tempo que quiser, querido! A casa é sua!

Cecília - Em Busca da Verdade (concluído)Onde histórias criam vida. Descubra agora