Capítulo I

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         A vida não é fácil meus amigos, nunca foi! Quem gosta de romantizar favela nunca viveu em uma, nunca precisou vender o almoço para comprar a janta

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A vida não é fácil meus amigos, nunca foi! Quem gosta de romantizar favela nunca viveu em uma, nunca precisou vender o almoço para comprar a janta. Eu amo meu povo, sou favela e não nego mas se eu pudesse sairia daqui. Negar minhas origens ? Jamais! Mas só quem vive o dia a dia da periferia sabe como é querer sempre evoluir e sair dali.



A minha história se iniciou em uma sexta, uma como qualquer outra. Eu levantei, me arrumei, dei banho na pequena Rane e café da manhã, limpei o básico da casa e sai para deixá-la na escolinha aqui da comunidade. Passando por uma viela próximo de casa me deparo com minha mãe e meu padrasto com um cachimbo improvisado e um cheiro de crack imenso, como eu disse, a realidade na favela não é totalmente linda mas não escolhemos onde vamos nascer ou quem serão nossos pais, apenas nos jogam no mundo predisposto a morrer ou a ser feliz. Todos tem seus demônios, os meus moram comigo.



Deixei a Rane na escola e subi até a casa de Roberta, estávamos ajudando na contabilidade do tráfico no morro e Mauro estava me ensinando como fazer a distribuição do dinheiro para nenhum lugar ficar desfalcado. Era uma área que eu gostava de atuar, um por receber bem e outra por poder alugar meu cantinho com a Rani. A parte ruim é ter que trabalhar com Roberto.



- Todos os repasses foram feitos corretamente? - Mauro entrou com uma cara nada boa, Roberto que estava ao meu lado também percebeu.



- Sim, só falta o da escola que ainda não está na hora - falei e Mauro sorriu, mas parecia que algo estava o afligindo de uma forma surreal



- Beta está no posto de saúde, hoje é dia de vacinação então aquilo tá um inferno. Gostaria de jantar com a gente Jane? - falou com uma voz calma mais calma, diferente da que entrou



- Claro, vou pegar a Rane na escola e subo com ela tudo bem? - falei sorrindo e ele concordou, Roberto me olhou com uma cara não muito boa, mas não liguei e voltamos a trabalhar.



A parte da manhã passou rapidamente, já tinha resolvido vários problemas e já estava na hora de buscar Rane na escola e como era do lado do posto resolvi passar lá antes para chamar beta para almoçar, mas acabei desistindo quando vi a enorme fila para a vacina contra gripe, resumindo, ela não almoçaria em casa e eu teria de aguentar Roberto sozinho.



Cheguei na escola de Rane e ela não estava lá, perguntei para a professora e a mesma disse que minha mãe havia pegado ela fazia meia hora, estranhei mas agradeci e fui até minha casa e não tinha ninguém lá , olhei cada pedaço e nada estava lá, nem Rane, nem minha mãe e nem as roupas da minha pequena e foi aí que me desesperei, pra onde ela levou Rane? Será que ainda estão no morro? Será que estão bem! Desci o morro correndo com os olhos cheios d'água e me deparei com Vinicius e Roberto conversando, quando Vini viu meu desespero perguntou o que havia acontecido e entre lágrimas eu finalmente consegui falar:



- Eles levaram ela! - e tudo de apagou.



Acordei meia tonta no sofá da casa do Roberto, ouvi uma grande discursão ao fundo entre Mauro, Roberto e Vinícius, na sala estava apenas eu e uma mulher ruiva que nunca havia visto, ela estava segurando um pano com uma garrafa de álcool ao lado, quando reparou que eu finalmente tinha acordado ela se levantou do chão ao meu lado e me ajudou a sentar lentamente, porém sem dizer nada, quando já estava sentada me deu água e chamou Mauro e os menos para perto.



- Está melhor pequena ? - Vini pergunta sentando ao meu lado



- Eles levaram ela, e eu não sei para ondo Vini. Eu fui buscar ela na escola e a professora disse que ela não estava lá, que minha mãe a levou - falei voltando a chorar



- Eu estou tentando achar eles mas até agora nada, a única notícia que temos é que um dos pivetes que estavam soltando pipa na entrada do morro viu sua mãe, seu pai e Rane entrando em um carro preto, mas já soltamos que ela sumiu para os outros morros, jaja ela tá de volta - Roberto falou mas isso não me acalmou, eu sei que ela provavelmente não está bem.



- Oi, não fomos apresentadas - falei para a ruiva a minha frente - Me chamo Jane



- Olá Jane, sou Nayto, namorada do Mauro. Ele me chamou pois está preocupado com sua irmã, conhecendo a fama de seus pais desconfiamos que eles a venderam para algum traficante de órgãos ou de pessoas - a notícia me deixou sem chão mas sabia que não poderia desanimar, eu acharia minha pequena de um jeito ou de outro.



O restante do dia foi completamente escuro, ao menos para mim. Todos estavam andando de lá pra cá, várias ligações foram feitas, uma correria total! Roberta chegou era umas seis e veio me abraçar, ela sabia que eu estava morrendo por dentro e aquele abraço foi como uma força que ela passou para mim.



- Melhor dormir aqui hoje, só por segurança mesmo - Roberto falou e eu concordei, ele estava aflito, amava de mais Rani desde quando ela nasceu.



Jane? Mana eu estou aqui! Cadê você ? Jane?



- Jane? Acorda está tendo um pesadelo! - Roberto me balançava e no impulso do medo o abracei, foi então que eu percebi que ele estava meio molhado como se estivesse saído do banho ao ouvir os meus gritos, fiquei mais alguns minutos no seu abraço e passando a mão na minha cabeça sussurrou - Está bem ? - balancei a cabeça e ele se levantou e foi em direção a porta fez um gesto com a cabeça e saiu, eu naquela noite não dormi e fiquei pensando aonde minha irmã estaria.



Me levantei pela manhã e fui até a cozinha precisava de um copo d'água, chegando próximo a um quarto que Mauro usava como escritório escutei ele a a ruiva conversando sobre o caso da Rane, eles desconfiam que minha mãe vendeu ela antes do suposto sequestro e isso me deixou extremamente mal, ainda não acreditava que minha mãe seria capaz de fazer aquilo com a própria filha.



Andei até a parte de trás da casa e fiquei sentada num balanço que tinha lá desde que eu era pequena. Fiquei lá olhando para o nada durante muito tempo até sentir uma mão no meu ombro.



- Vou começar a achar que anda me vigiando - brinquei para descontrair um pouco.



- Vim tomar água e te vi aqui, ainda aflita ? - perguntou se sentando no balanço ao lado



- Muito, minha irmã está por aí Roberto a deus dará, nem sabemos se está viva ainda. Isso me abala muito - falei e senti que iria chorar novamente, não sei se por impulso mas ele me abraçou meio desajeitado e disse que tudo estaria bem e que mesmo no pior eles estariam ali.


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Capítulo revisado (espero que gostem)

Vendida Para o Dono Do Morro - Livro IOnde histórias criam vida. Descubra agora