XXXVII

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Anne saiu apressada de casa, jogou um sobretudo apenas para cobrir o pijama. Não se importava com hora, não se importou em avisar Harry que estava prestes a sair por sua melhor amiga se encontrar em um estado desconhecido em um hospital. Totalmente sem sono e agitada, a adrenalina pela notícia inesperada a acelerou, foi difícil encontrar um táxi àquela hora, mas depois de algumas ligações já estava a caminho do hospital em alta velocidade.

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Uma pitada de sorte e muito planejamento o levou ao resultado final: Vitória. Era isso que vagava por sua mente ao que estava deitado de maneira distraída naquela madrugada, saboreando um vinho e sorrindo para as paredes. Um sorriso maldoso, retorcido e macabro.

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Harry não dormia, seus braços contornavam e apertavam o travesseiro contra seu corpo.

Aquela sensação lhe sufocando mais uma vez, a sensação de haver alguém ali, o observando nas sombras. Dessa vez, estava mais espessa e densa, lhe apavorando gradativamente antes mesmo de abrir os olhos. Ele se moveu, girando seu corpo ao simular ser apenas algo involuntário perante o sono, mantendo-se ao lado oposto ao que julgou haver alguém, seus olhos fielmente fechados, sentia as sombras em suas costas e assim, com suavidade tateou a cama, querendo estar enganado ao constatar o óbvio: Anne não estava ao seu lado.

Isso o surpreendeu, claro. Entre linhas, afirmo que Harry não concluiu esse como sendo o ponto crucial da noite, ele não sentia medo por Anne ou pelo que tenha acontecido-a. De maneira inexplicável, ele sabia, ele sentia que ela estava bem. E seja o que estava prestar a ocorrer, era com ele, só e exclusivamente com ele. Essa conclusão tendo uma parcela de culpa a soma dos acontecimentos anteriores –– junção do agora com a perseguição omissa de antes.

Seus pelos se arrepiaram completamente ao ouvir um pequeno risinho atrás de si, como se o divertisse o desespero que emanava do menino que fingia dormir sobre a cama. Realmente, o divertia.

Medo, muito medo. Seu peito subia e descia com rapidez, se destacando ao não ser somente uma respiração rotineira, dando a quem quer que fosse, a plena certeza de seu despertar.

Tomado por uma súbita coragem, ou apenas querendo ter a certeza de que era apenas mais uma sensação ruim e que ao abrir os olhos e virar-se não haveria nada além de um quarto mal iluminado e sua mãe no andar de baixo assistindo algo após alguma provável insônia, justificando ao lhe dar essa como uma razão coerente para sua ausência.

Harry abriu seus olhos, seu campo de visão limitado e prejudicado pela falta de iluminação. Isso nunca o havia incomodado tanto antes.

Ainda estava deitado e com o travesseiro em seu aperto.

A pequena risada repetiu-se mais uma vez, estridente e exaltada aos seus ouvidos medrosos, ele quase imaginou alguém se curvando para trás e gargalhando de maneira perturbadora. Tudo projetado por seu subconsciente, houve risos, porém nada mais que um sopro gargalhado baixinho se sobressaindo pelo silêncio gritante do cômodo.

Talvez estivesse em seus planos virar para checar com mais exatidão. Porém, não foi necessário. Passos que estalavam sobre o piso lhe davam certeza que não era apenas alguma espécie de alucinação. Seja o que fosse, ou quem fosse, se aproximava lentamente como se testasse o ambiente e analisasse-o de maneira atenta.

Harry não movera um único músculo, apenas seus olhos voltaram a fechar com força enquanto implorava para acordar e ter Anne ali, ao seu lado. Implorava para aquilo tudo não passar de um pesadelo.

Isso não aconteceu.

Seus dedos fizeram um rasgo sobre o tecido do travesseiro de sua mãe, seus pelos se eriçaram e uma lágrima solitária trilhou caminho até sua bochecha, se perdendo por ali.

Little sweetheart (l.s)Onde histórias criam vida. Descubra agora