XXXIV

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Desmond estava suando, suas mãos tremiam sem parar, estava nervoso e com muita vontade de dar meia volta e ir embora dali, o mais rápido possível, ainda havia tempo.

Mas não podia, não dessa vez.

Optou por fechar os olhos e com intensidade puxou sua respiração uma, duas, dez vezes.

Vislumbrou o céu escuro acima de sua cabeça, escurecendo-se ao formar uma tenebrosa tempestade, toda a neve havia cessado por alguns momentos, mas a chuva parecia se aproximar de forma furiosa. Ele só queria sair antes que ela se despejasse sobre si, entretanto, para sair, teria que entrar.

O homem observou a frente do estabelecimento, simples e confortável, e através da porta de vidro foi possível analisar Anne, distraída ao passar um pano sobre o extenso balcão da recepção.

Avançou em alguns passos, abaixando a cabeça e a escondendo no seu capuz escuro, ele voltou a contagem mental com o intuito de se acalmar, não teve muito sucesso, porém, isso não o impediu de prosseguir.

Com leveza, a porta foi empurrada, um pequeno sino tocou acima da sua cabeça anunciando assim, sua chegada.

Anne sorriu simpática, deixando o pano sobre o balcão e erguendo o olhar, o cliente deu as costas à ela, analisando de forma entretida a estante que se estendia a sua esquerda.

“Boa tarde, senhor.” ela saudou, fazendo uma careta ao não obter resposta. “Parece que o céu vai desabar lá fora, não é?”

Desmond prendeu a respiração. Aquela voz lhe trazia tantas lembranças, continuava tão bondosa e simpática, talvez o tom usado mudasse após ela saber quem ele era, só queria matar a saudade antes dela querer o matar. Ele a conhecia o suficiente para prever um surto.

Além das portas de vidro, iniciou-se a tempestade, forte e densa, pela sua visão periférica, não havia ninguém ali além de Anne e isso até o preocupou, se fosse alguém de índole ruim? Ele duvidava que ela poderia ter algumas chance de escapar, mas quem assaltaria uma biblioteca e... Desmond e sua mania e deixar sua mente ocupada com qualquer coisa sem –– tanta –– importância quando estava nervoso. Nem procurar bandidos e assassinos haviam o deixado soando frio desse jeito.

“Senhor, posso lhe ajudar?” Anne tentou novamente, ele assentiu ciente do olhar curioso pesando sobre suas costas. “Certo. O que está procurando? Essa estante é estritamente poética.” deu uma risadinha como se dissesse que não faziam o gênero dele.

“Estou procurando...” seu tom de voz soando mais forte do que esperava, embora houvesse um pouco de incerteza. “você?”

Desmond fechou os olhos, seus ouvidos captaram a chuva lá fora, chuva que o impedia de ouvir a respiração descompensada de Anne.

“Desculpe senhor, não o entendi.”

Anne, na verdade, entendeu o que ele disse, só não entendeu a razão, ela não o conhecia. Quer dizer, ela não sabia, já que desde que chegara a única coisa que pôde ver foram as costas do senhor que deveria ser um cliente, apenas.

De repente, estava nervosa, um homem esquisito e desconhecido entrava em seu local de trabalho, dizia que estava procurando por ela, o mínimo que ela deveria estar era nervosa. E com medo.

“Sou eu, Anne.” Desmond disse, virando de frente para ela, ainda mantendo sua cabeça baixa. “Sou eu...”

Anne encarava o homem que fitava o chão com o maior dos interesses, seu coração batendo com força em sua caixa torácica, pelo fato de estar mais atenta, ela concentrou-se totalmente na voz.

Se ele me conhece, eu devo conhecê-lo também, pensou. E conhecia. Mas não podia ser, não tinha como ser...

Little sweetheart (l.s)Onde histórias criam vida. Descubra agora