Minhas mãos se remoíam no meu colo durante todo momento em que estive deitada olhando para o teto ou algum ponto específico no quarto na vaga esperança de pegar no sono.
'Você não deveria ter dito aquilo" Minha mente resmungou pela milésima vez.
Miguel havia me ajudado a pedir demissão no hotel, me abrigou por uma noite e eu só consegui lhe dizer minha opinião dispensável. Ele saiu do quarto correndo e isso bastou para que eu entendesse que não gostou nem um pouco da minha intromissão.
Ótimo, comecei bem meu primeiro dia de liberdade. Sendo inconveniente.
Entretanto, ainda assim, me vinha uma sensação muito boa no peito. Eu sentia uma certa liberdade dormindo em outro local que não seja um com mais de centenas de pessoas acima de mim. Estava me sentindo em uma tela em branco para começar a pintar como eu quiser.
Sentei na cama por um instante e mesmo descalça coloquei os pés no chão para me levantar. Me sentia eufórica, insegura, me sentia um pouco culpada, mas nem sabia o motivo. Observei uma cortina na parede a minha frente e caminhei para abri-la, mas me assustei quando no lugar de uma janela encontrei uma parede toda de vidro. A vista era para uma espécie de reserva que sabia que ficava atrás dessa região, mas não sabia que era tão perto daqui. Isso era um pouco estranho... e se tivessem ladrões ou pessoas má intencionadas no meio dessas arvores todas?
Fechei a cortina novamente e tentei não me lembrar da existência dessa parede. Saí do quarto por um momento. Talvez se eu fosse a cozinha beber água, meu sono voltaria. Muito provavelmente isso seria impossível, mas decidi pois minha curiosidade era maior. A casa de Miguel estava diferente e eu queria muito bisbilhotar pelos corredores.
Comecei a andar pelo corredor e tentei adivinhar o que cada porta seria. A de Maria eu conhecia, a de Miguel provavelmente seria a do seu lado. O escritório seria logo ao lado e as outras portas seriam quartos de hóspedes. Caminhei até uma delas e a abri mesmo sabendo que não deveria. Encontrei apenas um cômodo vazio e todo branco. Parecia querer logo algo pintado nele. Parecia implorar por isso.
Fechei a porta do quarto vazio e fui para a porta ao seu lado, entretanto, travei minha mão ao trinco quando percebi uma luz fraca vindo por debaixo dela. Minha confusão ficou entre entrar e pedir desculpas a Miguel que provavelmente estaria aí dentro ou voltar ao meu quarto de onde eu nem deveria ter saído. Obviamente escolhi a primeira.
Entrei no cômodo e minha visão foi para a luz que vinha de um abajur pequeno em cima de uma mesa onde Miguel estava debruçado e parecia dormir. Respirei forte com o susto que levei quando minha ficha caiu. O quarto estava repleto de pinturas, desenhos, quadros, fotografias e molduras. Havia prateleiras com bisnagas de tinta e pinceis espalhados em potes transparentes. Em uma parede ao lado havia pinturas amadoras e infantis, mas essas haviam sido penduradas e emolduradas com um carinho melhor que as outras telas por aqui expostas.
Observei Miguel mais de perto dando alguns passos para ver o que havia em sua tela. Minha mente travou quando descobri, minha boca secou e eu não sabia o que expressar quando encontrei um retrato meu quase inacabado. Eu estava no palco e usava meu vestido preto de sempre... ele pintara o dia em que me viu cantar no bar.
Isso me assustou. Isso me assustou mais do que temia. Minhas mãos começaram a tremer quando foram levadas a minha boca para esconder o espanto. Dei passos para trás apressada, mas isso só me fez esbarrar em uma tela que foi arremessada ao chão.
Expressei meu espanto em silêncio pois Miguel já havia despertado e me observava atordoado. Não disse uma palavra até que entendeu o que realmente acontecia. Ele se levantou e andou até mim com cautela. Ele parecia ter medo que eu fugisse. Se aproximou e parou a minha frente.
- Eu... não quero que se assuste com isso. - Ele sussurra.
Eu apenas nego com um aceno antes de levantar meus dedos até uma mancha de tinta em sua bochecha. A tinta acinzentada já estava seca e acabou não saindo com meu toque. Tentei afastar meus dedos, mas ele segurou meu pulso e o carregou lentamente até seu peito. Primeiro notei que sua camisa branca agora estava toda manchada com cores da minha tela e depois percebi as batidas rápidas do seu coração. Ele estava nervoso? Por que me mostraria isso?
Abri meu dedos e os desci um pouco, passei meu outro braço pelo seu pescoço e agarrei levemente seus cabelos para ficar na ponta dos pés e juntar nossas bocas em um beijo cuja proximidade não parecia o suficiente. Ele sabia me deixar bamba mesmo eu tendo a intenção do beijo primeiro. Eu segurava em uma manga de sua camisa e ele passou suas mãos mais para baixo e com um suspiro aproximou meu quadril ao seu. Ele deixou um rastro formigante até meu pescoço e continuou até a ponta da minha orelha.
- Vamos para meu quarto. - Ele sussurra e eu apenas solto um gemido em resposta. Ele sorriu ao me levantar pelo quadril e me carregar para fora do cômodo enquanto eu mordiscava seu queixo e seu sorriso.
Miguel só me soltou quando precisou tirar meu pijama e sua própria roupa. Seus olhos ardiam em um tom brilhante quando me observou ficar em cima de seu peito. Ele se deitou de costas em uma ansiedade evidente.
- Isso... - Ele me parou segurando meu rosto com as duas mãos quando tentei beija-lo novamente. - ... nós... você sabe que isso é sério? Sabe que eu mais que tudo quero que isso dê certo, não sabe?
- Eu acredito em você. - Digo somente antes que ele me apertasse contra si e me empurrasse para outro mundo que eu estava prestes a descobrir.
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O muito que Ella sente
ChickLitMiguel tem apenas dois problemas para resolver: O primeiro é encontrar um jeito de criar sozinho a filha que acabou de descobrir que existe. A segunda é esquecer a garota que em breve será sua "irmã". E Ariella, bom, ela tem duas versões dela mesma...