Elisa
Mais um dia. Já faz três anos que digo essa frase todas ás manhãs ao acordar. Três anos que meus pais não estão mais comigo. Um motorista bêbado e uma estrada molhada foram o suficiente pra tirar tudo de mim. Eles não tinham irmãos e eu também sou filha única. Minha mãe estava grávida, era um menino. O irmão que nunca vou conhecer. Trocaria de lugar com eles, sem pensar duas vezes.
Minha avó materna, Júlia, morava no interior. Como eu já tinha dezoito anos quando tudo aconteceu, optei por morar sozinha e continuei no mesmo lugar. O que foi melhor, ela faleceu alguns meses depois. Vivo levando um dia de cada vez, sem pensar muito no amanhã. A casa continua exatamente igual, não tive coragem de mudar nada, é como se eles fossem chegar a qualquer momento. Ainda tenho as botas do papai na entrada e um lenço vermelho da mamãe no sofá.
Minha infância foi toda aqui, férias e feriados na fazenda da vovó. Não consigo imaginar a minha vida em outro lugar. Ao menos aqui estou perto de tudo que um dia eu tive e tenho Eduardo e Claudia comigo. Tive uma vida incrível. Pais amorosos e um irmão a caminho. Estava quase me decidindo que caminho tomar profissionalmente. É difícil acreditar que tudo mudou de uma hora para outra, a falta que sinto deles é gigantesca. É como se uma parte minha tivesse se perdido, como se essa parte tivesse sido enterrada junto com a minha incrível família, família que eu nunca mais vou voltar a ver. Sonhos que nunca vão se realizar. É difícil acreditar que não estou apenas vivendo um pesadelo, é real.
Sinto-me bem, mas ás vezes faz falta ter alguém me esperando voltar para casa. O cheiro dos biscoitos no forno. O som das risadas ecoando, os abraços. Alguns dias são bons, outros mais longos e tristes. Tento me concentrar nas coisas boas, nas alegrias que vivemos juntos, mas tem momentos em que a saudade fala mais alto e eu desabo em mim mesma. Por isso fui me afastando cada vez mais de todos os meus amigos. Meu padrinho Edu, foi de quem eu mais afastei. O melhor amigo do meu pai, que aos poucos tomaria o lugar dele se eu não colocasse um fim na aproximação. Edu me ligava uma vez por dia e era pra ele e Claudia que eu corria quando as noites ficavam muito ruins e assustadoras. A solidão não é algo repentino, ela vai chegando pouco a pouco, quando menos se espera ela já dominou todos os seus dias.
Hoje acordei um pouco mais cansada que o normal. Sempre estou cansada pela manhã, dormir não é algo que eu faça muito bem, mas mesmo assim me levantei e me preparei para mais um dia. Fiz minha corrida de toda manhã antes do trabalho e no final eu senti um extremo cansaço, o que é estranho. Eu corro todos os dias a dois anos, não era para me sentir assim. Talvez eu esteja ficando doente outra vez. Acontece com mais frequência do eu gostaria.
Na lanchonete do prédio em que trabalho sou recebida por Luíza, pelo sorriso eu sei que está aprontando. Quer alguma coisa ou me arrastar pra algum lugar.
- Bom dia Lis, vai querer bolo hoje?
- Você sempre acerta, Luíza.
Respondo sorrindo. Acho legal ela me chamar assim. Elisa é um nome muito formal, vem de Elizete, minha avó paterna que eu não cheguei a conhecer, pois faleceu pouco antes do meu nascimento.
Luíza é uma garota bonita. Morena. Alta. Olhos verdes e um cabelo incrível que eu luto para copiar, mas aquelas ondas naturais são para quem pode como ela gosta de dizer. Meus longos e lisos cabelos negros não seguram muito bem as ondas que tento fazer. Eu nem consigo imaginar como estaria se ela não tivesse voltado e me reencontrado. Fomos amigas na escola e ela se mudou com os pais. Contou-me que seu pai também faleceu, teve um ataque cardíaco sem sentido, por isso ela e mãe estão de volta à cidade.
Sentei-me para esperar e vi um homem entrando. Deve ser médico. Está sempre de branco. Faz quase dois meses que sempre o vejo indo para o décimo segundo andar.
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Seguindo em Frente (Concluído)
RomanceElisa é uma garota doce e amável, carrega uma grande tristeza pela morte da família. Durante muito tempo se fechou em seu próprio mundo de solidão e dor, afastando assim de todos que a amam. Com a ajuda e a amizade de Miguel ela começa a superar a p...